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Venda de bebida alcóolica em Pituaçu aumenta violência e preocupa autoridades

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MP quer suspender liminar. Caso de Salvador é usado como exemplo para proibição de álcool nos estádios durante a Copa de 2014

Um decreto da CBF proíbe a venda de bebidas alcóolicas nos estádios em eventos organizados pela entidade desde 2008. O Estatuto do Torcedor veta, desde 27 de julho do ano passado, a comercialização dos produtos em competições esportivas. Todas medidas que visam à diminuição da violência e aumento da segurança de quem frequenta arenas e prestigia o esporte brasileiro.

Mas para toda regra existem exceções. A exemplo do estado de Goiás, onde a venda de bebidas alcóolicas é liberada por liminar da Justiça, a Bahia entrou em processo semelhante. Ou melhor, o estádio de Pituaçu é que se juntou à lista de exceções. Desde o dia 12 de outubro, quando o Bahia enfrentou o Cruzeiro pela 29ª rodada da Série A, a venda de cerveja com álcool está liberada no estádio. A medida é fruto de uma liminar obtida pelos donos de bares da arena esportiva soteropolitana.

– A liminar é dos donos das cantinas. Eles se sentiram lesados, e o juiz deu a liminar para eles venderem as bebidas alcóolicas. Como ordem judicial tem que ser cumprida, as bebidas estão sendo vendidas – explica o Major Henrique Melo, comandante do Batalhão Especializado de Policiamento em Eventos (BEPE) da Polícia Militar da Bahia, que está em fase de implantação. Por enquanto, o Batalhão atua apenas em partidas nos estádios do Barradão e de Pituaçu, mas deve abranger outros grandes eventos da capital baiana em breve.

A comercialização de cerveja com álcool não seria problema, se não estivesse diretamente ligada ao aumento do número de ocorrências registradas nos eventos de Pituaçu. É o que revela o Major Henrique Melo.

– De lá para cá, o número de ocorrências aumentou em mais de 35%. Já tivemos 133 jogos em Pituaçu e, nos 130 anteriores, nunca houve vítimas dentro do estádio. Depois dessa liminar, nós tivemos a primeira lesão corporal registrada: na partida entre Bahia e São Paulo, quando um rapaz deu um soco no outro e rompeu o supercílio. Uma briga entre torcedores do Bahia. Neste mesmo jogo, houve outra troca de socos. Antes não havia briga dentro do estádio – relata o oficial da PM.

Os bares de Pituaçu ficam lotados, após a liberação da venda de bebidas alcóolicasFim da tranquilidade

Na partida contra o Vasco, no dia 23 de outubro, já era possível ver confusões em alguns pontos do estádio de Pituaçu. De acordo com o relatório da partida feito pela Polícia Militar, foram identificados pontos de tumulto e brigas nas arquibancadas.

Doze dias depois, o BEPE tornou a registrar ocorrências que indicam que a liberação do álcool dentro do estádio pode ser um gol contra a paz do futebol. Na partida contra o São Paulo, na 33ª rodada, o Bahia venceu por 4 a 3, mas, durante o tempo em que o time ficou atrás no placar, novas confusões foram registradas nas arquibancadas, envolvendo torcedores que consumiam bebida alcóolica.

Na região dos bares próximos às cadeiras do estádio, perto do setor reservado para a imprensa de veículos online e impressos, pelo menos duas brigas precisaram da intervenção da Polícia Militar. Um dos torcedores deixou o local conduzido por policiais, com bastante sangue no rosto. O agressor também foi conduzido pela PM para a delegacia do estádio, mas ambos foram liberados após o registro da ocorrência.

No relatório do BEPE, um dos registros cita o envolvimento de quatro homens em um caso de agressão física: “Quatro homens foram apresentados no posto policial pela equipe da PM em virtude de um ter desferido um soco em outro, e o terceiro ter criado tumulto. O quarto homem por ter desacatado a guarnição, sendo registrada a ocorrência”.

– Os casos mais graves foram mesmo em Bahia x São Paulo. Foram duas lesões corporais. Duas que tiveram lesão, porque aconteceram outras, que não tiveram lesões, mas nos deram trabalho – disse o Major Henrique Melo.

Contrário à venda das bebidas alcóolicas, o comandante do BEPE faz uma comparação entre os jogos de grande apelo nos estádios do Barradão e de Pituaçu para exemplificar os problemas causados a partir da liminar da Justiça.

– Com isso aumenta tudo. Números de brigas, confusões na cantina. Antes não tinha isso, mas agora acontece. O cara quer pegar a bebida e quer sair mais rápido, aí discute com o outro. Então o que temos muito agora são brigas. Antes era quase zero, agora está acontecendo muito. Vocês podem até ir ao Barradão em um jogo de casa cheia, sem liberação de bebida alcóolica, e ir a Pituaçu com casa cheia. Vocês vão ver a diferença. Infelizmente, o ânimo muda e os torcedores ficam exaltados. Até o trato normal que temos com os torcedores está bem confuso. Muitos dos torcedores com quem tratamos têm sinal de alcoolismo, principalmente de torcidas. Brigou por quê? Brigou por nada, porque estava junto do outro e deu um murro. E os que brigaram estavam bêbados – conta o Major.

Torcedores aprovam e aproveitam…

Apesar da reclamação da polícia, os torcedores têm aproveitado a decisão da Justiça. Em dias de jogo em Pituaçu, a procura pela cerveja com álcool tem sido grande. Nas partidas contra Vasco e São Paulo, os bares ficaram lotados. A maior dificuldade é encontrar torcedores contrários à venda das bebidas.

– Eu acho perfeito! A venda é um divertimento. Não acho que isso prejudica em nada ao Bahia. Sou a favor da venda – disse o torcedor do time baiano, Thiego Souza.

Outro que concorda com a liberação é o torcedor Manuel Marques. No entanto, para ele, a proibição deveria valer em dias de clássicos.

– Acho muito boa a venda. Vejo como algo muito positivo. Eu só acho que em dia de Ba-Vi não deveriam vender. Em jogos do Bahia contra um time de fora, acho que tem que vender mesmo – disse Marques.

O administrador do estádio, Hélio Ferraro, comentou a situação. Ele alega que a única coisa a ser feita é cumprir a determinação da Justiça.

– Existe uma liminar que permite essa venda. Então não há nada a fazer, mas há uma movimentação para derrubar a liminar – limitou-se a dizer.

Entre um copo de cerveja e outro, um torcedor mais alegre entra no meio da entrevista e palpita:

– É matéria de quê? De bebida? Estou adorando. Não prejudica nada. O que prejudica o Bahia é o Jones – reclamou o torcedor, irritado com o atacante do Tricolor, e que, pela aparência, já havia consumido um pouco de álcool além da conta, ainda no intervalo da partida contra o Vasco.

Ministério Público Estadual espera derrubar a medida

A decisão, que tem agradado os torcedores, tem causado preocupação ao Ministério Público Estadual. De acordo com o promotor Antônio Ferreira Leal, o MP estuda meios para derrubar a liminar que, segundo ele, coloca em risco o clima de tranquilidade nos estádios baianos.

– Infelizmente a decisão de um magistrado causou essa liberação. Também acreditamos que houve pouca resistência, mas estamos estudando meios de derrubar essa ação. Isso nos deixa preocupados, porque ultimamente estamos vivendo um clima de paz nos nossos estádios. Fizemos pactos com as torcidas organizadas. Todas elas só têm acesso aos estádios com suas carteiras, todos devidamente registrados. Isso antes que entrasse em vigor a lei federal que obriga as organizadas a ter esse controle. Então essa liberação de bebidas, para nós, coloca em risco esse clima pacífico – disse o promotor do MP.

Ameaça à Copa do Mundo

A polêmica sobre a liberação da venda de bebidas alcóolicas em arenas esportivas toma proporções ainda maiores quando se pensa nos grandes eventos do esporte mundial que o Brasil vai sediar nos próximos anos. De imediato, a primeira referência que surge na mente de quem frequenta estádios é a Copa do Mundo de 2014.

O assunto tem tomado bastante espaço nas discussões sobre o Mundial, já que a Lei Geral da Copa está na pauta do Congresso Nacional. O conjunto de medidas definidas pelo Governo engloba desde a meia-entrada para idosos e estudantes à comercialização de produtos licenciados e direitos de imagem do Mundial e da Copa das Confederações.

A venda de bebidas alcóolicas é um dos tópicos sensíveis da discussão sobre a Lei Geral. Os parlamentares se dividem sobre a liberação durante a Copa, enquanto a Fifa pressiona para que as normas do Mundial sejam aprovadas o quanto antes, com a comercialização permitida durante o evento.

Na audiência pública que discutiu a Lei Geral da Copa realizada no último dia 8, o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, defendeu a liberação da venda de bebidas alcóolicas durante a Copa, já que um dos patrocinadores do evento é uma empresa fabricante de cerveja. Segundo Valcke, a comercialização seria realizada de forma controlada.

– A intenção não é que as pessoas fiquem bêbadas. A venda será bem controlada e feita de modo adequado – afirmou o secretário-geral da Fifa.

Entre as autoridades brasileiras, no entanto, as opiniões ainda divergem. Em Salvador, o caso do estádio de Pituaçu é usado como exemplo contrário à venda de bebidas nos jogos da Copa do Mundo. A capital baiana vai receber seis partidas do Mundial de 2014.

– Em minha opinião, a liberação teria um impacto negativo. Existe um trabalho do IML de São Paulo que mostra que, durante um ano, em mais de 70% dos casos de mortes violentas, os envolvidos estavam com teor alcóolico acima do normal. Então o álcool não está ligado apenas a acidentes de trânsito. Homicídios, quedas, afogamentos… Tudo isso tem influência do álcool. É uma droga lícita, que tem suas ações se as pessoas não sabem utilizar. Quem trabalha com segurança sabe que álcool sempre dá problema – afirma o Major Henrique Melo.

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