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Santa Cruz

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Rubens Lemos Filho
Santa Cruz foi a prova visível e indiscutível de que o pensamento é superior à banalidade do suor jogado fora. Adilson Ribeiro da Silva desfilava lentidão aparente, em que destruía defesas na parceria com o supercraque Hélcio Jacaré, seu companheiro no futebol carioca e baiano antes da chegada a Natal, no eldorado do novíssimo Estádio Castelão. Um ano de idade.

Quem via Santa Cruz fora de campo, fleuma de gentileza, falando baixo e o necessário , entendia sua postura em campo, mobilidade cerebral abrindo espaços para os companheiros que partiam do meio-campo e letalidade gélida nas cabeçadas fulminantes que o fizeram tirar o sono de treinadores experientes na década de 1970.

Quem falar na reviravolta do América – de saco de pancadas a dono do futebol potiguar -, da segunda metade de 1973 até 1975, se justo for, encontrará muito mais de um minuto para recordar Santa Cruz, homem de confiança do lendário treinador Maurílio José Velha, que, esquecido, foi o cara a iniciar a montagem do time rubro fortíssimo a desbancar o ABC da trinca Maranhão, Danilo Menezes e Alberi, três palavras sagradas.

O técnico Velha chegou ao fim de 1972 e foi desarticulando as peças perdedoras remanescentes do Estádio Juvenal Lamartine. Velha foi fazendo um time competitivo, mas perdeu – com dignidade – o campeonato que valeu o tetra alvinegro. O ABC ganhou os três turnos do América, o último, com olé de 4×2. Pois Santa Cruz saiu do banco para fazer os dois gols vermelhos e terminar artilheiro do estadual.

Santa Cruz e Hélcio Jacaré se reencontraram para formar, no tempero baiano ou na cerveja gelada carioca, uma dupla fundamental para a conquista do Norte/Nordeste do Brasileiro, ou a Taça Almir, em homenagem ao atacante controverso assassinado no ano em que o Brasil conhecia o Mais Simpático, epíteto da imprensa do Sudeste para definir o América.

Com Santa Cruz, sua paciência sinônimo de frieza, o América venceu com sobras o campeonato de 1974, primeiro no campo macio de Lagoa Nova. Derrotando novamente o ABC, que já havia apanhado no Seletivo que definiu o representante local no Brasileiro. Santa Cruz, sem alarde e gols para sacudir a torcida, foi fundamental nos  dois episódios.

Com Hélcio Jacaré triturando rivais e ele, bem nas finalizações, Santa Cruz posou para a fotografia do bicampeonato de 1975. Perdeu em 1976, quando chutou na pequena área do ABC para defesa monstruosa do goleiro Hélio Show, a bola que poderia decretar o até então inédito tricampeonato do América.

Estava na reserva de Aluísio Guerreiro quando o América venceu em 1977, ano conturbado por uma briga tribal que fez o Rio Grande do Norte aparecer pela primeira vez no programa Fantástico, da Rede Globo.

Quando muitos entendidos da crônica esportiva decretavam sua condenação, Santa Cruz vestiu a camisa do ABC trocado pelo meia Zé Carlos Henrique, tão magro que era apelidado de Lagartixa de Coqueiro, armador de inegável talento.

Na estreia de ambos, com 36.401 pagantes no Castelão, Santa Cruz fez o segundo gol da vitória-revanche do ABC por 3×0. Danilo Menezes e Noé Macunaíma marcaram os outros. Gentleman, Santa Cruz virou funcionário público graças ao gesto (sempre infalível), do ex-presidente americano Jussier Santos.

Ser atendido por Santa Cruz, atencioso e eficiente, duas adjetivações que uniam o futebol à sua vida, era uma glória para os torcedores de todos os clubes.

A índole de Santa Cruz nunca o flagrou em agressões ou deslealdades contra adversários. Sua morte sexta-feira, doeu como cutilada. Escrevo melancólico , olhando para a foto dele. Arriscasse um epitáfio, cometeria: Artilheiro Suave.

Voto de Neymar

Neymar votou no atual Presidente da República  e anunciou em suas redes sociais. Neymar é cidadão, seu direito é individual, está previsto na Constituição do país e ele decidiu sem violentar quem quer que seja.

Que Neymar é chato e pernóstico, ninguém duvida, mas é bom de bola. Ou deixou de saber jogar por causa de Jair Bolsonaro? O patrulhamento ideológico é nocivo. Dividido em extremos, o Brasil está um saco.

Sócrates foi petista, sem represálias, com ele Casagrande e Vladimir. Juninho Pernambucano é eleitor de Lula e merece respeito. Tite, também.

A militância em resenhas esportivas, transformando jornalistas antes respeitados em tietes é outro consentimento a esbarrar na ética. Falar em política, todo mundo pode, desde que em horário específico. Usar o futebol é dar uma canelada na inteligência alheia.

O voto de Neymar é um só, não deve influenciar ninguém. Neymar, falando sério, tira mais voto do que acrescenta pela sua graça sem fazer sorrir, mas irritar de sobra. Mas o voto é dele.

O episódio lembra a patética história de gente torcendo contra a seleção de 1970 para se vingar da horrenda ditadura.

Preferindo a Tchecoslováquia e a Romênia ganhando do Brasil. Esqueceram de combinar com Pelé, Rivelino, Gerson, Tostão e Jairzinho. Democracia não tem time. Eleição e cueca são parecidas. Cada qual veste seu modelo.

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