segunda-feira, 6 de maio, 2024
26.1 C
Natal
segunda-feira, 6 de maio, 2024

“A Copa tem capacidade de desamarrar os investimentos”

- Publicidade -

Andrielle Mendes – Repórter

Entrevista: Caio Megale – Economista do Itaú Unibanco

A Copa do Mundo é o empurrãozinho que o Brasil precisa para voltar a crescer. A declaração é do economista Caio Megale, do Itaú Unibanco, que apresentará as oportunidades do Mundial de 2014 nesta segunda-feira (10), em Natal, durante o Seminário Itaú Empresas. Segundo Caio, a Copa já está impactando a economia brasileira. O crescimento de 2,7% no PIB 2011 só não foi menor em razão das obras do Mundial de futebol, analisa. O evento, que colocará o país no centro do globo, fomentará novos negócios antes, durante e depois do mundial. Só na capital potiguar, uma das 12 cidades-sede, o Mundial vai render R$ 500 milhões em renda adicional – fora o R$ 1 bilhão que será investido em obras de infraestrutura e mobilidade. Para potencializar os ganhos, poder público e iniciativa privada precisam arregaçar as mangas e colocar a mão na massa. “Digo que a Copa do Mundo é como um cavalo selado. Ou você observa ele passar ou monta e cavalga por muitos anos”. Confira a entrevista, concedida por telefone à TRIBUNA DO NORTE:
Seminário Itaú-Empresas acontece amanhã, no Olimpo Recepções
O Itaú Unibanco promove nesta segunda-feira um seminário sobre as oportunidades da Copa do Mundo de 2014 para os pequenos e médios negócios. O que o Mundial, em resumo, reserva para Natal e para o Rio Grande do Norte?
Um evento como a Copa do Mundo tende a beneficiar a cidade que está sediando o evento de duas formas. A Copa pede uma série de reformas e obras  que o país precisava, mas não conseguia fazer e dá um empurrão para que esses projetos deslanchem. Ela também atrai turistas e negócios.

Segundo o banco, o evento vai gerar R$ 500 milhões em negócios adicionais em Natal. Quais os setores que serão mais beneficiados?
Acredito que o Turismo será um dos setores mais beneficiados, dada a vocação do estado. Os turistas internacionais foram embora. Essa é a grande chance de trazê-los de volta e desenvolver não só o Turismo, mas o setor industrial também. Neste momento, muitas empresas estão buscando o Nordeste, que possui poucas empresas internacionalizadas.

Além dessa renda adicional, o que mais a Copa reserva para Natal?
Dependendo da forma como a cidade trata o turista e do que oferece, ele vai sair daqui falando: “olha, estive em Natal, vale a pena visitar”. Ele começará a fazer a propaganda para família, para os colegas de trabalho, para os vizinhos. A repercussão é grande, desde que se trate bem os turistas. A Copa do Mundo é uma grande vitrine.

Você comentou que o evento vai gerar R$ 500 milhões em renda adicional.  O que se pode fazer para que essa renda extra seja ainda maior?
O seminário vai justamente nessa direção. A Copa do Mundo não necessariamente fará uma determinada região do país crescer mais por muito tempo. O evento vai gerar uma oportunidade. Os empresários precisam conhecer as oportunidades que a Copa traz e se preparar. O que eu digo, nos seminários, é que a Copa do mundo é como um cavalo selado. Você tem duas alternativas: ou observa ele passar ou monta e cavalga por muitos anos. 

O que fazer para aproveitar este momento?
Executar as obras no tempo determinado. Mas não só isso. Treinar as pessoas para que recebam bem os turistas. E abrir o maior número de contatos. Os estrangeiros vão estar aqui no Brasil. Precisamos aproveitar isso. Não podemos ficar numa posição apenas contemplativa. Temos que ir atrás deles e fechar parcerias comerciais que gerem negócios a longo prazo.

Você se refere ao poder público?
Não me refiro só ao poder público. Me refiro ao empresário potiguar também, que não pode só ficar esperando pelo governo. O seminário é uma tentativa de chacoalhar os empresários neste sentido. No Brasil, só 4% da população fala um inglês razoável. Na África do Sul, país que sediou a última Copa, o idioma não foi um problema. O país tem o inglês como língua oficial. É preciso falar não só o idioma, mas a língua dos negócios.

A Copa deve gerar entre R$ 5,3 bilhões a R$ 10,6 bilhões em consumo no país. Como os pequenos e médios empresários podem aproveitar?
O empresário precisará ser muito criativo. No seminário que realizamos em Fortaleza, encontrei um empresário que importa máquinas que separam penas de ganso para travesseiros. Ele descobriu que na cidade dele vários hotéis seriam inaugurados antes da Copa, entrou em contato com a construtora, depois com os donos e pegou uma encomenda gigante. O empresário tem que ir atrás. O negócio não vai cair  no colo.

Há algum levantamento do Itaú Unibanco que mostre quantas oportunidades poderão ser geradas em Natal?
Não. É muito difícil quantificar.

A economia brasileira avançou 0,4% no segundo trimestre do ano em relação ao primeiro trimestre de 2011, de acordo com levantamento recente do IBGE. O cenário, no entanto, ainda é de desaceleração. A indústria de transformação, por exemplo, recuou 2,5% no período. A Copa pode melhorar este cenário?
Eu acho que pode. Se a gente olhar os números do PIB do segundo trimestre, vai ver que o volume de investimento está sendo tímido desde o segundo semestre de 2010. Não adianta só consumir. É preciso investir para aumentar sua capacidade. Os números divulgados mostram que os investimentos no Brasil estão amarrados. Acho que a Copa tem capacidade de desamarrar os investimentos. 

Por falar em investimentos, a execução de grandes obras de infraestrutura com vistas a Copa está indo bem? Estamos executando as obras no tempo certo ou fazendo corpo mole e adiando o que não pode ser adiado?
Acredito que estamos cumprindo razoavelmente bem o cronograma das obras da Copa. Com a aceleração da inflação no ano passado, o governo pisou no freio. Subiu os impostos, aumentou a taxa de juros e gastou menos. Esse momento de desaceleração também afetou os gastos da Copa do Mundo. Agora a inflação está um pouco mais baixa e o governo voltou a acelerar os gastos.

Você comentou que os investimentos estão amarrados. O que tem amarrado os investimentos no Brasil?
Há uma série de questões internacionais e nacionais amarrando os investimentos. Primeiro, a crise internacional e a possibilidade concreta da ruptura da zona do euro, que afetará o mundo inteiro. Depois, um investimento exagerado em 2009 e 2010. Com o governo voltando a incentivar  o crescimento – cortando taxas de juros e voltando a gastar com infraestrutura – abre-se um espaço para a retomada do crescimento da economia.

O  Itaú Unibanco prevê inclusive que a Copa eleve em 1,5 pontos percentuais o PIB brasileiro. A previsão está mantida?
Ela se mantém. Isso porque muitos dos investimentos da Copa não tem muito haver com a crise na Europa. São projetos que tem que ser executados para o próprio evento acontecer. A Copa já está impactando na economia brasileira. A economia já está crescendo mais do que cresceria sem a Copa. As obras dos estádios, por exemplo, já são uma realidade. Pelo menos, 50% das obras estão prontas. Isso já foi computado neste novo PIB. Sem a Copa, isso não teria acontecido.

Ou seja, o cenário poderia ser ainda pior não fosse o evento?
O crescimento poderia ser bem menor se a Copa do Mundo não estivesse acontecendo.

A previsão de crescimento de 1,5 pontos percentuais de PIB é então uma previsão realista…
Diria que sim. É um crescimento espalhado por três anos.

Como você avalia o momento econômico vivido pelo país? Assistimos agora a nova redução da SELIC (taxa básica de juros), que chegou a 7,5%, a menor taxa da história.
Eu vejo o governo e o Banco Central reagindo nos últimos trimestres. Em 2011, prevíamos um crescimento econômico de 4,5%. O crescimento foi de 2,7%. Em 2012, as previsões começaram em 3,5% e agora estão perto de 1,5%. Isso por um lado puxou a inflação para baixo. Mas por outro gerou uma necessidade de estímulos. Agora recentemente a taxa de juros caiu. O governo cortou a taxa SELIC e por enquanto a economia continua andando devagar. Corte de taxas, desoneração dos setores produtivos, redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI)  vão fazendo com que a economia vá gradativamente recuperando. Porque ainda não se recuperou? Devido a  crise externa e  ao exagero dos investimentos em 2009 e 2010. Esses estímulos mantidos por tempo suficiente vão fazer com que a demanda suba, os investimentos voltem e a economia reacelere gradativamente.

Vem mais queda na SELIC por aí…
O Banco Central sinalizou que está perto do fim. O último comunicado indicou que uma nova redução poderia ser feita, mas com ‘máxima parcimônia’. Isso nos sugere uma queda pequena. Talvez 0,25 pontos percentuais. A previsão é que caia mais uma vez e fique por volta de 7,25% durante um bom tempo.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, pressionou os bancos privados para que reduzam novamente suas taxas de juros. O Itaú Unibanco foi o primeiro a anunciar um novo corte. Os bancos privados tem agido à base de pressão do governo?
O que os números do Banco Central nos mostram é que as taxas de juros, tanto para pessoa física quanto para jurídica, acompanham a taxa SELIC, com alguma defasagem. Quando os bancos anunciam queda nas taxas de juros, é porque a SELIC também caiu. Trata-se de um processo de normalização. Se a gente olhar para as taxas de países como os Estados Unidos, vai ver que elas estão perto de 0 há muito tempo. Isso também puxa a taxa SELIC para baixo.

Queria saber se você faz parte do grupo dos economistas otimistas, pessimistas ou realistas. Pergunto isso porque gostaria de saber se o Brasil voltará a crescer a taxas de 4,5% ou 5% ao ano e em quanto tempo.
Ótima pergunta. Sabe, eu sou um economista bastante realista. Não sou exageradamente otimista e também não me deixo levar por ondas de pessimismo exagerado. Acho que o Brasil, em 2010, passou por uma onda de otimismo exagerado e agora está passando por uma onda de pessimismo exagerado. Entre 2004 e 2010, o PIB brasileiro cresceu, em média, 4,5%. Acho que não vamos voltar a apresentar uma performance como essa. Em  2004, nossa taxa de desemprego era de 14%. Os salários eram baixos e havia muita mão de obra. Depois de um ciclo forte de crescimento, subiram os custos de produção e ficou mais difícil contratar. Também tem a questão do crédito. Em 2004, o crédito representava 24% do PIB. Havia espaço para crescer de forma acelerada sem provocar um endividamento exagerado. Hoje,  o crédito representa 55% do PIB. Não dá mais para crescer com as mesmas taxas. Estamos muito perto do limite. Além disso, enquanto nós crescíamos 4,5% ao ano, o mundo crescia a 5% – a China crescia a dois dígitos, os Estados Unidos a 2% e a Europa a 3%. Agora, Estados Unidos vão crescer a 1%, a Europa está negativa, e a China vai crescer abaixo de 8%. A economia mundial está um pouco mais moderada.

Quando você diz que não acredita que o Brasil voltará a crescer a 4,5%, isso é por quanto tempo?
Na média dos próximos dez anos. Eu diria que a média dos próximos dez anos será menor que a média dos últimos dez anos. Não muito menor. Não sou um economista pessimista que acha que estamos perdidos, mas acho que os ventos não serão tão favoráveis. Daqui para frente, a média de crescimento ficará em torno de 3% ou 3,5%.

Como isso mexe com a vida da população? Vai dá para o brasileiro continuar fazendo tudo o que ele faz com o país crescendo menos do que vinha crescendo?
Quando você cresce muito forte por muito tempo, fica mais difícil crescer as mesmas taxas na média. Veja o caso da China. Eu acho que o Brasil vai continuar incorporando classe média, mantendo a taxa de desemprego baixa e os ganhos de renda das famílias, mesmo com crescimento mais baixo. O bem estar social da população vai continuar evoluindo. Porém, num ritmo menor.

A Copa por si só é capaz de mudar todo este cenário ou sozinha não será a redenção do país?
A copa não resolve todos os problemas nem se o Brasil ganhar a copa.

Se bem que o brasileiro vai deixar de reclamar da economia durante uma semana..
Durante uma semana, no máximo. (risos).

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas