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A falta de reconhecimento

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Ivan Maciel de Andrade                                                                                                           
Procurador de Justiça e professor da UFRN (inativo) 

Sabe-se que há muitos tipos e graus de inteligência. As aptidões humanas se diversificam numa escala tão ampla que, a rigor, não se pode sequer dimensioná-las. Vale lembrar o exemplo do genial cineasta Charles Chaplin: por mais que tenha se esforçado, não conseguiu superar, como pianista, a mais frustrante mediocridade – o que o irritava ao ponto de se ressentir com quem não o elogiava. 

Albert Einstein, o pai da teoria da relatividade, que revolucionou a ciência moderna, tinha paixão pela música. E era inseparável do violino em que tocava sonatas de Mozart, seu compositor preferido. Segundo seus contemporâneos, Einstein, símbolo de genialidade, não passava de limitado violinista. 

Marcel Proust (“Em busca do tempo perdido”) analisa algo que considera intrigante e que também a mim (antes mesmo de ler o genial escritor francês) sempre pareceu desafiador e enigmático: há excelentes profissionais, notórios e consagrados especialistas, que, apesar de sua reconhecida competência, não têm capacidade intelectual à altura de sua qualificação técnica. Revelam-se não só carentes de imaginação como também destituídos de sensibilidade para as manifestações artísticas.

Na verdade, o que se vê frequentemente é o bom profissional restringir-se ao campo de sua própria atividade. Da atividade em que sobressai e brilha. Quando evidencia maiores ambições intelectuais, incursiona em estudos e pesquisas dentro de sua área de trabalho. Quase sempre através de teses acadêmicas de pós-graduação. Ou baseadas na experiência de seu exercício profissional.

Por isso mesmo, gostaria de ressaltar, a respeito de Solon Galvão Filho, que ele foi, além de grande profissional, com credibilidade no país e exterior, um extraordinário lexicógrafo, que conseguiu transferir seus conhecimentos linguísticos para uma obra ímpar: o “Dicionário Odonto-médico” (inglês-português/glossário português-inglês), com 32.500 verbetes. O dicionário elaborado por Solon Galvão já chegou, até onde sei, à quinta edição (pela editora Saraiva), e se encontra atualmente esgotado.

Acredito que se trata do único dicionário em nossa língua com características tão abrangentes e, ao mesmo tempo, tão específicas: “o objetivo é concentrar numa única fonte o maior número possível de termos encontrados em trabalhos publicados nos campos da Odontologia e Medicina”.

Tornei-me, ainda jovem, cliente de Solon. E me converti, com o tempo, em seu amigo. Tive a honra, inclusive, de participar da redação do contrato que regulamentou a edição de seu dicionário.

Num Estado como o nosso, em que são cortejados e homenageados tantos beletristas, acho que não se concedeu a Solon Galvão o reconhecimento a que ele tinha direito por haver produzido sozinho uma obra que deveria resultar do trabalho de uma equipe multidisciplinar de pesquisadores.

O nosso Estado tem sido injusto com os que mais podem contribuir para que sua imagem se descole de escândalos e se dê continuidade à tradição erudita e criativa fundada por mestre Câmara Cascudo. Onde estão, nesta hora, as nossas instituições culturais, que deveriam assumir um papel de protagonismo na valorização da importante contribuição de Solon Galvão para a cultura nacional?

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