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A história da Vila Olímpica Vicente Farache

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José Nilson de Sá – Engenheiro e ex-presidente do ABC

É difícil, no meu entender, neste grande universo de esportistas do Rio Grande do Norte, sem atingir aqueles que foram e os que ainda são, uma pessoa de espírito forte, determinado, apaixonado pelo seu clube, o ABC F.C., como o senhor Judas Tadeu Gurgel.

Ao concordar com  o pagamento mensal de uma cadeira no Estádio de Futebol FRASQUEIRÃO, inaugurado em janeiro do corrente ano,”fi-lo porque qui-lo,” (português do ex-Presidente Jânio Quadros), na duvida de que jamais usaria tão gostoso assento. Pois bem. Já recebi o certificado de que a minha cadeira tem o nuúmero Q-52, com validade até 22-01-2026. Vai servir para os meus netos e bisnetos. Não fui recebê-la pessoalmente por motivos superiores.

A historia da Vila Olímpica é grande e complicada. A rigor foi iniciada em gestões passadas, quando o senhor Fernando Pedrosa, segundo informações que recebi quando assumi a presidência do ABC em 1977, teria doado ao clube uma grande área de dunas às margens da precária estrada que ligava Natal à praia de Pirangi (RN-1) limitada também, por um dos lados, com terrenos da Barreira do Inferno.

Assim raciocinando, há mais de um terço dos 90 anos de glória do “Mais Querido” começou a história da Vila Olímpica.

Na primeira visita que fiz ao terreno, como presidente do clube, cheguei à conclusão de que seria impossível conseguir recursos para executar a terraplenagem daquela área de dunas de nossa propriedade.

 Em gestões passadas, foi loteado o último terreno que o ABC possuía em Morro Branco, o qual foi dividido em três quadras. A primeira compreendida entre o cruzamento das avenidas Xavier da Silveira e Bernardo Vieira e uma rua projetada, que hoje tem o nome de Pio Cavalcanti; a segunda quadra, limitada pela Pio Cavalcanti e outra rua projetada, que hoje tem o nome de José Ovídio Vale; finalmente a terceira, com 66,00 metros de frente para a avenida Xavier da Silveira, ficou reservada para a sede do clube.

Instalações precárias, onde passei o biênio 1977/1978, cercado por companheiros da melhor estirpe, sem ordem no mérito, como os saudosos Aluízio Bezerra, José Gobart Alves, José Petronilo Fernandes, Assis Amorim, José Carlos Passos, Euclides Ferreira de Melo e outros que porventura tenha esquecido. Entre os vivos:  – Bira Rocha, Raimundo Nonato Fernandes, Efrem Lima, Severo Câmara, Cromwell Tinoco, Renato Gomes Soares, Firmino Moura, Iberê Ferreira de Souza, Clenilson Lima, Jarbas Bezerra, Agnelo Alves, Jacio Fiúza e o abnegado Ernani Silveira.

Os problemas:

O permanente desequilíbrio entre uma despesa maior do que a receita;

Ser campeão, contra as feras do América, Alecrim. Baraúnas e Potiguar, mesmo contando com a técnica e fidelidade de expressões como Danilo Menezes, Pradera, Cláudio Oliveira, Noé Silva, Fidélis e outros mais jovens que passaram pela formação da equipe principal, como Tinho, Gelson, Berg, Noronha, Zezinho Não tive a sorte de contar com ídolos como Alberi e Jorginho. Em compensação, houve um técnico como Waldemar Carabina, com o qual o ABC foi campeão em 1978, perdendo no “tapetão” para o América o de 1977.

Como inexistia vestígios de construção nas duas quadras do loteamento citado, a gestão anterior fechou uma parte da nova rua José Ovídio Vale, ampliando assim a largura do campo de treinamento para 76,00 metros e impedindo, conseqüentemente, que alguns proprietários de lotes ali adquiridos pudessem executar obras pela falta de acesso ao local.

Corria tudo bem, quando fui procurado por um engenheiro que desejava construir sua casa, mas estava com a entrada obstruída pelo campo de futebol. De forma delicada, informou-me que iria entrar na Justiça com um pedido de acesso ao seu lote. Pedi tempo ao colega, na esperança de anular, com Abreu Jr., a transação de um terreno em Capim Macio que o velho amigo havia comprado ao ABC. Faria um esforço para devolver a quantia paga, a fim de preparar o local para um campo de treinamento do clube. Não foi possível, pois o mesmo já estava sendo utilizado.

A salvação!

O INOCOOP ia construir o grande conjunto residencial de Ponta Negra e necessitava fazer a terraplenagem do terreno, cuja obra contratou com a EIT, empresa da qual, como então diretor presidente, tinha liberdade de ação para pedir ao Departamento Técnico que colocasse na obra uma patrulha superdimensionada com a qual, aos sábados e domingos poderia começar a trabalhar nas dunas da futura Vila Olímpica, sem despesas para o ABC. Preparamos logo um campo de treinamento e instalações  modestas que pudessem abrigar a concentração dos jogadores e a Diretoria do clube. Entreguei a parte de construção civil, também sem remuneração, ao arquiteto Heleno Sá, meu filho, que fez o possível com o pequeno recurso financeiro disponível. Usava o seu próprio carro para o transporte de qualquer material de construção doado, como cimento, vigas premoldadas, elementos vazados de cimento ou cerâmicos, material elétrico, etc. Ernani Silveira foi seu companheiro permanente de sofrimento.

Oscar Niemeyer era e ainda é, amigo íntimo do Diretor da EIT no Rio de Janeiro. Juntos fizeram a revista Modulo, que deixou de existir, mas ficou a amizade.

Ousada ou vaidosamente, munido da planta topográfica do terreno, consegui, sob influência do nosso diretor, ser recebido por Oscar Niemeyer e pedir a sua ajuda num antiprojeto para aquilo que denominamos de Vila Olímpica. Resposta do grande arquiteto:- você vai pagar apenas as horas de trabalho dos desenhistas e terá, na próxima semana, uma maquete daquilo que seria feito em várias etapas, cujas plantas de arquitetura ficariam disponíveis com o andamento da obra.

Na conversa, a parte que Judas Tadeu negociou com a Ecocil e que motivou a renúncia de Leonardo Arruda, Oscar Niemeyer sugeriu exatamente aquilo que foi feito, isto é, vender, no outro extremo do terreno, lotes para construções residenciais, comerciais, etc. Não estou, com o comentário, condenando Leonardo, mas mostrando apenas a coincidência dos fatos.

Com interferência de companheiros, tinha sido conseguida do governo do Estado (Tarcísio Maia) a perfuração de um poço profundo, cuja ficha técnica ainda guardo (profundidade de 97 metros, nível estático de 29,60 metros, vazão de 35,35 m3 por hora). Não lembro da capacidade do reservatório também construído

Animado com os serviços de terraplenagem da área, que fora  parcialmente concluído com a patrulha de maquinas da EIT, ficando uma depressão onde o projeto de Niemeyer previa a construção de campo de tênis, vôlei e basquete, propus ao Conselho Deliberativo do ABC lotear a terceira quadra de Morro Branco, onde estava funcionando o clube. Dividi a mesma em 26 lotes, abrindo no centro a atual rua Dr. João Dutra. A aprovação do Conselho foi registrada no Segundo Ofício de Notas, no Livro B-160 do Registro de Títulos e Documentos sob o número de ordem 33.971, em 04-08-1978.

Com Bira Rocha, compramos os lotes 1, 2 e 3 (onde hoje existe o Edifício Michelli); sozinho, fiquei com os lotes 4, 5 e 6 (onde hoje existe o Edifício Maria Clara); Roberto Varela e Odilon Ribeiro Coutinho compraram os lotes 14,15 e 16 (onde hoje existe o condomínio Rafael Negreiros); José Bezerra Jr, Cromwell Tinoco e Euclides Ferreira de Melo adquiriram , respectivamente, os lotes 17, 18 e 21; Abreu Jr. ficou com o lote 26; os lotes 9, 10, 11, 12, 13, 22, 23, 24 e 25 foram negociados com o IPE. Deixei com o meu sucessor, o amigo Severo Câmara, para venda, os lotes 7, 8, 19 ,20 e o saldo a receber dos parcelamentos feitos aos adquirentes. Alguns foram quitados ainda na minha gestão.

Em meados da década de 1970 a Receita Federal autorizava aos clubes do Brasil a  fazer uma espécie de loteria mediante a emissão de “carnês” que proporcionavam prêmios aos seus adquirentes, dentro de um enorme sistema de promoção, feito evidentemente por firmas já especializadas no assunto. Segundo comentários diversos, o sucesso do “carnê” do América de Natal tinha excedido as expectativas.

Atendendo sugestões, fiz consulta verbal à Receita Federal sobre o assunto, quando tive a informação de que o diretor Francisco Dornelles (atual deputado federal) havia cancelado a concessão de tais licenças por irregularidades apuradas em vários clubes.

Como já tinha autorização do Conselho Deliberativo para lotear a quadra onde funcionava o ABC, a maquete de Niemeyer e terreno quase todo nivelado, fui a Brasília tentar uma audiência com o referido diretor da Receita Federal.

 Por intermédio do senador Dinarte Mariz consegui ser recebido, depois de um chá de cadeira de duas horas, mas saí com a licença para lançar os “carnês” com o nome de Gigantão Alvinegro. Guardo a fotografia quando, em companhia de Aluízio Bezerra, fizemos a entrega a Dona América Mallen Machado, residente na  rua Almeida de Castro, 1260, adquirente do “carnê” 52.857, de um Corcel Ford zero km.

Com a renda parcelada dos lotes e com recursos oriundos do “carnê”, demolimos as velhas instalações do ABC, transferindo a sede do clube para a Vila Olímpica  e fiquei na expectativa de que os futuros dirigentes como Severo Câmara, Edson Teixeira, Rui Barbosa da Costa, José de Paiva Torres, Eudo Laranjeiras, José Wilson G. Neto, Leonardo Arruda Câmara e Judas Tadeu solidificassem o projeto, que hoje é uma realidade, mesmo com características diferentes.

Nada da imponente e difícil  idéia de Oscar Niemeyer foi recebida com entusiasmo pelos meus sucessores. O projeto era arrojado, dispendioso e impossível de ser executado por qualquer um de nós.

 De minha parte, ficou apenas a vaidade de ter anunciado precipitadamente quem seria o autor do grande projeto, lamentando apenas que a maquete tenha levado um ignorado desaparecimento.

Acredito que  todos os meus sucessores lutaram com entusiasmo, honestidade e desejo de encontrar alternativas, mas com a legítima intenção de colocar, em termos de instalações, o ABC F.C. como um dos clubes mais progressistas do nosso Nordeste.

Judas Tadeu Gurgel, contudo, extrapolou. Como foi escrito na revista publicada ao comemorar os 90 anos de glória do clube:- “Sua administração, com certeza, ficará para a história do clube como o presidente que construiu o Frasqueirão”.

Parabéns, presidente. Você é o máximo!  Esqueça a derrota numa partida de futebol. Lembre da riqueza que você construiu para o nosso ABC

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