Michelle Ferret
Luísa Geisler é escritora e nasceu em Canoas no Rio Grande do Sul e foi premiada aos 19 anos
Luísa ganhou o prêmio Sesc Literatura de 2010 com apenas 19 anos com seu livro de estreia “Contos de Mentira” e foi finalista no Prêmio Jabuti. Em 2012 ela foi incluída na antologia “Os melhores jovens brasileiros” da revista britânia Granta. Uma de suas referências é o escritor Guimarães Rosa, que disse em sua última entrevista, que quando escrevia, não pensava na literatura: pensava em capturar coisas vivas. Capturar coisas vivas talvez seja o trabalho mais árduo da escrita. Tanto Luísa quanto Tércia trabalham a palavra como os arqueólogas que escavam, como queria o poeta Manoel de Barros “escavar até escutar o esgar de cada palavra”. E elas conseguem.
Tércia é professora da Universidade Federal do Ceará e tem vários prêmios como “Prêmio literário Banco do Nordeste” (2006), Bolsa de inventivo as artes da Petrobras (2013), publicou o seu primeiro romance “Turismo para Cegos” (2015), depois de lapidar com cuidado cada narrativa e ter publicado os livros de contos: “ O Vendedor de Judas”, “Linha Férrea”, “O Resto de teu Corpo no Aquário”, “O Tempo em Estado Sólido”, “Os Espantos” e “Meu Destino Exótico” e prepara seu mais novo romance “Em Plena Luz” pela Companhia das Letras.
Tércia Montenegro é escritora de romances e contos e nasceu em Fortaleza no Ceará
De acordo com diretor regional do Sesc RN, Fernando Virgilio “a importância desse projeto é ímpar por proporcionar o intercâmbio literário de autores, ao mesmo tempo em que democratiza e valoriza a diversidade cultural”.
Para falar sobre o bate papo e suas referências literárias e escritas futuras, as autoras Tércia Montenegro e Luísa Geisler conversaram com o VIVER:
Como começou sua relação de vocês com a escrita?
Tércia Montenegro: Minha relação com a escrita começou na infância e na adolescência, sempre li preferencialmente contos. A prática de escrita começou por este gênero textual pela estrutura, ritmo, familiaridade com a escritura. Mas depois de publicar os primeiros livros de contos, fui experimentando outras estruturas narrativas e queria fazer coisas novas, e comecei o exercício para o romance e cheguei a escrever dois romances que nunca foram publicados. E o “Turismo para Cegos”, primeiro romance publicado foi o terceiro exercício e acabou sendo selecionado para o Petrobras Cultural e tive a obrigação de concluir e pela circunstância do prêmio eu me senti fortalecida e admitir para mim que tinha chegado na maturidade que eu queria.
Luísa Geisler: Sempre escrevi, desde criança mesmo, fazendo umas histórias ilustradas que grampeava e chamava de “livros”. Quando adolescente, tive uma fase ligada a fanfics, um pouco ligada ao universo de fantasia e magia. Não separo muito as paixões literárias que tive por gênero: nem poesia, nem conto, nem romance. Literatura me encantava como um todo. É claro que depois de cinco livros escritos, sendo quatro deles romances, acho que já tenho uma tendência para um lado de narrativa longa. Mas o conto é uma arte bastante preciosa para mim, que sigo escrevendo.
Qual o livro mais marcante da história de vocês? Um seu e um de outro autor. E por quê?
Tércia: O livro marcante da minha vida é “Antes do Baile Verde” da Lygia Fagundes Telles, que é um livro que me fez desenvolver uma paixão sólida pelo gênero do conto. E na minha literatura o livro marcante é difícil dizer, pois todos são filhos. Eu sempre acho o mais recente, é difícil escolher entre os filhos, mas o livro mais recente é aquele que está mais próximo aquilo que estamos vivendo. Então é aquele xodó, por dizer muito de mim agora que é o “Turismo para Cegos” (2015), é um livro que tenho muito carinho. É o meu primeiro romance publicado e mais ainda o próximo livro que é um romance também, deve ser lançado em setembro e chama “Em Plena Luz” pela Cia das Letras, esse é o mais novo e acredito que o carinho converge pra ele.
Luísa: É difícil dizer. “Grande Sertão: Veredas” foi essencial em diversos momentos da minha vida, e é um livro que releio com frequência. Por outro lado, “Nada a Dizer”, de Elvira Vigna, me fez repensar minha escrita diversas vezes. Entre os meus livros, talvez “De Espaços Abandonados” tenha sido o mais marcante em termos de um livro cujo resultado me agrada até hoje. Repenso muito dos meus outros livros até hoje, mas o “De Espaços Abandonados” me parece bem executado, tendo em vista meu plano original. Mas um livro não existiria sem o outro. Os processos se retroalimentam.
Como vocês observam o cenário da literatura no Brasil hoje?
Tércia: Sobre o cenário literário do Nordeste vejo que é um dos mais promissores, quando leio não leio pensando que é nordestino, mas olhando além, leio porque são bons escritores e quando me deparo são do Nordeste. Ana Miranda que é uma autora de Fortaleza maravilhosa. Do Rio Grande do Norte admiro muito o João Almino. Quando a gente começa a enumerar existe o risco do esquecimento e o risco de tornar exaustivo. De maneira que eu só posso resumir dizendo que é um cenário muito fértil e muito talentoso e leio meus conterrâneos com muito prazer.
Luísa: Com apreensão. Digo isso pelo cenário político em que aqueles que criam se encontram. A cada nova manchete sobre o cenário do Brasil, somos obrigados a repetir obviedades sobre o papel da cultura na formação de cidadãos críticos. O cenário da literatura nunca foi exatamente democrático, por uma série de motivos, mas ultimamente, o mínimo de liberdade de expressão que tínhamos é cerceado. Temos autores, como o caso de Miriam Leitão e Sérgio Abranches, que ao serem confirmados para eventos, são ameaçados de morte a ponto de a organização não poder garantir sua segurança. Eventos que falem de diversidades sofrem boicotes e protestos. Figuras de autoridade chamam artistas de vagabundos. O Ministério da Cultura virou uma Secretaria. Como podemos pensar num país com produção cultural nesse estado? A arte tem que questionar o padrão. A arte tem que ser libertadora. Mas como fazer arte sob censura?