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A peleja de um auto na cidade dos reis

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Maria Betânia Monteiro – repórter

Um cenário vivo, formado por 120 figurantes será a grande novidade do Auto do Natal, tradicional espetáculo do ciclo natalino a ganhar o palco nos  dias 21 e 23 de dezembro. A concepção, definida como  “mais orgânica”, é  ideia de Diana Fontes, coreógrafa conhecida em Natal como a diretora de várias edições de Um Presente de Natal (espetáculo que ocorria em frente ao palácio Potengi). “Todo ele vai ser muito vivo e cheio de energia”, disse Diana em entrevista ao VIVER. A inclusão de multimídia também é uma novidade. Dividindo o espaço com os corpos dos bailarinos, atores e figurantes estarão imagens projetadas em 3D, tudo para que o texto do cineasta potiguar Edson Soares, “Maria, José e o Menino Deus” – o mesmo encenado em 2009 – se renove.

Com 13 anos no calendário festivo de final de ano, o Auto do Natal  ganha alguns recursos nesta edição, como imagens em 3D e cenário vivoUma renovação que não implica em sacrifícios, já que um novo leitor sempre traz novos elementos. Diana disse que a história central permanece, é ela quem estrutura o espetáculo. O que muda é o entorno, ou seja, estão sendo concebidos novos temas transversais, que perpassam a obra. “Minha estética nasce do fogo da vida”, disse ela. Transformando a afirmação em imagem, no centro está o fogo – o nascimento de Cristo –, que serve como propulsor, criador das esperanças humanas e ao redor homens e mulheres, os receptores.

O espetáculo tem uma mensagem: é preciso que as pessoas voltem a acreditar na própria vida. Um movimento que Diana prega, ao citar o roqueiro Cazuza: ‘ideologia, eu quero uma para viver”. Compartilhando deste mesmo objetivo está o autor do texto, Edson Soares, o compositor Danilo Guanais, os coreógrafos João Alexandre de Lima e Daniele Flor e outros profissionais envolvidos, a maioria que já trabalhava com Diana no antigo Presente de Natal.

 Para concretizar as ideias da diretora foram selecionados 70 artistas para o elenco, outros 35 atores coadjuvantes, 120 figurantes, 40 assistentes de produção, além de uma equipe envolvida diretamente com a produção. Ao todo são 400 contratados, dentro de um projeto que está orçado em R$ 1,3 milhão.

Este ano, diferente do ano passado, o auto ganha o amparo das empresas privadas através da Lei Rouanet de Incentivo à Cultura. O projeto inicial foi orçado em R$ 1,8 milhão, mas a comissão que analisa os projetos para a Lei Roaunet autorizou R$ 1,3 milhão. Deste valor, R$ 800 mil foram captados de três patrocinadores: Midway Mall, Cosern e Riachuelo. O restante dever vir dos cofres da prefeitura ou iniciativa privada.

Na manhã da última terça-feira foi divulgado o resultado da seleção dos 70 componentes do elenco principal. Muitos deles fizeram parte do elenco do ano passado. Dos 70, 20 são artistas desconhecidos (para Diana). Eles foram convocados a partir da audição “A desenvoltura prevaleceu”, disse. Os ensaios começaram na noite da terça, no teatro Sandoval Wanderley. Os papéis principais ainda não foram definidos, o que será feito em 10 dias.  “É muito confortável escolher antecipadamente. No ensaio de ontem pessoas desconhecidas me deixaram impressionadíssima”, disse.

Diana Fontes rebate as críticas que estão sendo feitas a realização do Auto de Natal e defende que esta linguagem artística é muito importante para a cidade, já que proporciona aos artistas em cena e ao público, momentos de comunhão com os valores atuantes e esquecidos da sociedade. “Os autos para mim significam muito. É um patrimônio da cidade, quem quiser que pense o contrário”.

Em defesa dos autos sai também Edson Soares. Ele diz que o fato de existir a necessidade de políticas públicas voltadas para a cultura no estado, não significa que é preciso invalidar propostas como a do Auto de Natal, que dentre outros benefícios, gera emprego temporário e renda para mais de 400 pessoas. “Tem artistas que passam o ano todo sem trabalhar e encontram espaço no final do ano. Mesmo sabendo disso, o Auto de Natal não pretenda ser o Bolsa Família dos artistas”, disse Edson Soares.

Sobrevivendo às gestões culturais

O Auto de Natal foi criado pela Fundação Capitania das Artes, em 1998, na gestão de Isaura Rosado. O formato e local do espetáculo eram diferentes. Um cortejo partia da Catedral pelas ruas. Em 2002, houve um espetáculo bastante inovador com o dramaturgo Marcos Bulhões na direção, contando com uma bela cenografia de Gringo Cardia, às margens do rio Potengi. Na gestão de Dácio Galvão à frente da Funcarte, o Auto ganhou dimensões de mega espetáculo, com as apresentações no anfiteatro do Campus da UFRN e, em seguida, no estádio Machadão. Vários diretores assinaram seus nomes na concepção do Auto: Marcos Bulhões, Amir Haddad, Lenilton Teixeira, Véscio Lisboa, Lenício Queiroga, Moacir de Góes, Henrique Fontes, Paulo Jorge Dumaresq e outros. Há textos escritos por Tarcísio Gurgel, Paulo de Tarso Correia de Melo, Marize Castro, Nei Leandro de Castro, Moacy Cirne, entre outros.

‘Altos e baixos’

De Amir Haddad, passando por Marcos Bulhões a Henrique Fontes, vários foram os artistas que assinaram a direção do Auto do Natal. Muitas também foram as linguagens utilizadas, os textos escritos, os locais de apresentação, os cenários, os figurinos e o elenco.

Não é difícil lembrar da primeira apresentação, dirigida por Haddad. Tratava-se de um cortejo natalino nas ruas da Cidade Alta. Inesquecível também foi a edição dirigida por Marcos Bulhões. Não só pelo local inusitado – dentro do Rio Potengi – sobretudo pelo gabarito dos profissionais como Gringo Cardia, um dos artistas visuais mais inovadores do país e a escritora Clotilde Tavares.

Treze anos se passaram. Ao logo dele, muitos foram aplaudidos e criticados. Ora pela grandiosidade, criatividade, brilhantismo. Ou pelo atraso no pagamento, exclusão de artistas, textos e encenação de má qualidade. Certamente o mais impressionante disso tudo é o fato de ter sido o único evento cultural que sobrevive à passagem de vários administradores municipais.

Este ano, seguindo a tradição o Auto de Natal está sendo vaiado por repetir o texto do ano passado, pelos recorrentes atrasos no pagamento dos artistas, por isso e por aquilo. Mas também está sendo bem visto por renovar,  gerar emprego, entreter o público.

Embarcando na realização polêmica do Auto, porém bastante esperada por parte do público e por parte dos artistas, um grupo formado por atores, jornalistas, cineastas estão propondo o “Baixo de Natal”. O Baixo de Natal, diferente do que sugere o nome, não meramente um protesto ao grande espetáculo. É uma alternativa a ele. Segundo o cineasta Buca Dantas, um dos idealizadores do evento, trata-se de uma leitura transversal do auto natalino.

Como o Baixo de Natal começou a ser articulado nesta quarta-feira, poucos nomes foram confirmados. Além dos idealizadores, a atriz Quitéria Kelly e o cineasta Buca está participando os escritores Patrício Junior e Carlos Fialho. Esses últimos assinarão o texto.

A única certeza é que o Baixo de Natal será uma composição teatral, que poderá ter várias linguagens. Alguns encaminhamentos serão dados durante uma reunião aberta, amanhã, às 15h na tenda da Tropa Trupe, armada na UFRN. “Quem quiser entrar com ações propositivas essa é a hora”, afirmou Buca.

O cineasta reintera a posição do grupo em criar uma alternativa neste final de ano, afirmando que é preciso preservar a tradição dos autos natalinos. “Somos trabalhadores da arte, estamos querendo ganhar dinheiro também”, conclui Buca.

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