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A ronda da morte

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Públio José  – Jornalista  ([email protected])

Mais uma vez, lamentavelmente, a história se repete no semi-árido do Rio Grande do Norte. A seca começa a mostrar a sua face cruel. Já se sente de perto o efeito que a sua manifestação acarreta na vida dos desprotegidos, dos que, não por iniciativa própria, estão situados onde acontece o raio de influência desse inclemente fenômeno climático. Os jornais, as emissoras de rádio e de tv já começam a explorar o tema: a seca chegou ao sertão. Pelas estradas, visível até aos mais alheios e desavisados dos passantes, já acontece o impacto doloroso da morte. Não resistindo à desidratação e à fome, os animais sucumbem, caem para não mais se levantar. A partir de agora, no interior das casas do interior, principalmente naquelas mais humildes, tem início a dramática luta diária pelo consumo de proteína. O que é farto na cidade, e importantíssimo na manutenção da vida dos seres humanos, começa a ser raro nas regiões assoladas pela seca.

Pois a morte dos animais, detentores em suas carnes de altas taxas de proteína, além dos monstruosos prejuízos econômicos, significa também, para o homem do campo, a ampliação da dificuldade para dotar a si próprio, e aos membros de sua família, da proteína necessária à continuidade da vida. A esse flagelo diário também se soma a luta pela água, uma das piores carências que acomete o ser humano. Se analisarmos esse cenário, acontecendo em pleno século XXI, chegaremos facilmente à conclusão de que algo está errado na condução do governo dos homens. E o pior é que essa carência de proteína e de água, na vida das populações menos abonadas, está acontecendo nas mais diversas regiões, em vários continentes – e numa progressividade extremamente preocupante. Atualmente, mais de 600 milhões de pessoas em várias partes do globo estão passando sede. E quando têm água para beber esta é de péssima qualidade.

Estudiosos de vários países já prognosticaram que a grande luta do homem neste século será em torno da água e do lixo. Ao que parece, um destino doloroso aguarda as populações mais humildes no que concerne ao consumo de água de boa qualidade. Já aos mais abastados, de forma até irônica, parece está reservado uma batalha inglória, contra um inimigo aparentemente indefeso, o lixo – dono, porém, de um poder enorme de destruição.

Com a sua finesse, com seus hábitos refinados de consumo, apesar de sua cultura, de seus conhecimentos, o homem moderno, mesmo que bem posicionado na vida, não pára de produzir lixo. E o lixo não é um inimigo que se destrua com armas tradicionais. Mas deixemos o homem moderno com suas mazelas e voltemos à questão da seca e suas conseqüentes repercussões na rotina diária do homem do campo, por sinal, ainda tão indefeso em relação à seca como seus antepassados de séculos atrás.

É claro que vozes se levantarão para discutir o tema. É certo também que novos planos serão apresentados, novas idéias surgirão. Homens do governo tratarão, durante algum tempo, em suas rotinas, de como providenciar assistência aos atingidos pela seca. Alguns até cometerão a heresia de propor soluções de combate à seca – como se a ausência de chuva pudesse ser combatida. É bem provável que nos bares, entre uma cervejinha e outra, o assunto seja dissecado, comentado, enquanto os aficcionados aguardam o início de uma partida qualquer de futebol. Tudo isso deverá acontecer da forma mais repetitiva, mais previsível possível. Ou não já vimos este filme antes? Enquanto isso, para os lados dos habitantes das áreas atingidas, até já meio sem esperança de providência, de resposta, a pergunta continuará a ser formulada, repetida, batendo feito martelo na consciência dos responsáveis pela questão: até quando?

Meus 100 dias…

Mons. Lucas Batista NetoCoordenador do Ensino Religioso do Estado do RN e Guardião do Eremitério Santo Lenho

Faz cem dias do meu Ano Sabático. Nem sou monge e nem eremita, continuo sacerdote diocesano a serviço da Igreja de Natal. Conforme entendimento com o nosso Arcebispo, Dom Matias, solicitei a licença de passar um ano em oração, estudo e trabalho. Escolhi, a convite do Côn. José  Mário, o Eremitério do Santo Lenho de sua propriedade.

É um ambiente muito bem estruturado e de muito silêncio e Paz. Nesses cem dias já recebi mais de quatrocentos pessoas que se fizeram presentes às missas, aos batismos e ao matrimônio de minha sobrinha, Caroline e William. Procurando, encontrando, seguindo, conhecendo e amando Jesus, estou vivendo uma das formas do semi-eremitismo de que fala Thomas Merton no seu livro, “a vida silenciosa”. Os resultados já começam a ser apresentados.

Percebo uma vida mais saudável. Experiência do silêncio exterior ajuda bastante à interiorização do estudo, da meditação e reflexão. Depois que estou aqui, tenho vontade de dizer ao bispo que oriente todo o clero a fazer pelo menos uma vez por semana o seu deserto, num lugar retirado e para isso é necessário e indispensável um mínimo de silêncio material. O Pe. João Medeiros já me dizia no início do meu sacerdócio: “O padre tem que estudar e ler pelo menos quatro horas por dia.

É claro que não podemos avaliar tudo o que foi provado na busca da reflexão, do crescimento espiritual, do contacto humano, da adoração a Deus, da vida de oração, das provações e incompreensões. Hoje em dia há uma literatura abundante na linha da auto-ajuda. É muito procurada nas livrarias. As pessoas sentem a necessidade de serem orientadas e buscam a todo custo o que estiver mais favorável e ao alcance. Uma senhora me dizia: “Padre, eu cheguei ao desespero tal que saí procurando uma igreja pra rezar, mas não encontrei nem padre e nem igreja católica aberta. Terminei entrando na Casa do Terço, onde me acolheram muito bem, rezaram sobre mim, ouviram a minha angústia e indicaram-me o caminho da paz interior”. Aliás, o professor Itamar de Souza já havia proposto para a Pastoral Urbana, abrir muitas casas do terço.

É justamente isso que todos nós estamos passando de acordo com a nossa atividade e ou opção de vida. Não somos compreendidos. Consideramo-nos donos da situação. Achamos que temos sempre a última palavra, não levamos em consideração a opinião ou crítica do outro. Aqui no silêncio do coração o que mais me falou alto foi a Kenose de Cristo. A entrega de sua glória divina a fim de viver a vida humana e conseqüentemente sofrer. Foi exatamente nestas palavras de São Paulo que encontrei a luz para julgar todos os conflitos existenciais pelos quais estava passando:”Tende em vós o mesmo sentimento de Cristo Jesus. Ele, estando na forma de Deus não usou de seu direito de ser tratado como um deus, mas se despojou, tomando a forma de escravo. Tornando-se semelhante aos homens e reconhecido em seu aspecto como um homem baixou-se, tornando-se obediente até a morte, à morte sobre uma cruz” (cf. Fl. 2,5-8).

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