A homenagem que o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte prestou esta semana ao advogado Danilo Bessa, dando o seu nome à Sala de Apoio ao Advogado daquela corte, aflorou emoções em todas as pessoas que lá compareceram, num reencontro de gerações unidas pelos mesmos sentimentos de amizade e solidariedade. Estavam lá os companheiros das lutas estudantis. Do velho Atheneu à Faculdade de Direito da velha Ribeira, do tempo em que a Ribeira tinha a sua faculdade aberta para a Praça Augusto Severo, patamar de lutas cívicas, e que acaba de ser destruída. Lá estavam os amigos boêmios, poetas e companheiros cúmplices dos mesmos bares acolhedores. Estavam lá os últimos comunistas, velhos companheiros que peregrinaram pelas sombras do partidão. Estavam lá antigos militantes do MDB e do PMDB de antigamente, raçudos, corretos, leais. Estavam os colegas advogados de tantas causas, de tantas lutas, de tantas vitórias e de derrotas, também, mas lutadores éticos e leais. Sempre. Estavam os amigos e companheiros de outros combates, pelejadores de outros sonhos e simpatizantes de outros credos e outras ideologias, mas amigos que se queriam e se respeitavam. Lá estavam os familiares, os parentes: Dona Joaninha, a mãe, noventa anos de amor, a irmã Vera, companheira Renira, dedicadas, saudosas, orgulhosas do filho, do irmão, e do marido.
Em solenidades dessa natureza, mais ainda envolvendo advogados, magistrados e políticos, há sempre fartura de oradores. Faz parte do espírito e da eloqüência dos tribunais Sim, houve discursos. Em nome dos amigos de Danilo Bessa, por exemplo, falou o advogado Roberto Furtado que, no regime militar, defendeu presos políticos, foi deputado estadual, presidiu a OAB e fez dobradinha com o homenageado no ofício da advocacia na Justiça Eleitoral.
Paulo de Tarso Fernandes não falou, porque não estava presente, mas mandou uma mensagem que foi lida pelo cerimonial. Dois importantes discursos de dois grandes advogados. Dois importantes depoimentos para a crônica política e os anais do Judiciário do Rio Grande do Norte.
Roberto Furtado, começa:
“Ética e Moralidade. Queria eu que estas duas palavras, as primeiras aqui pronunciadas, ecoassem permanentemente nesta Sala. A Sala dos Advogados Danilo Bessa. Significaria esse eco, a luta dos advogados do Rio Grande do Norte em favor do retorno das instituições aos preceitos éticos e morais que devem nortear o desempenho das funções públicas e, ao mesmo tempo, uma homenagem ao patrono desta Sala, que tanto militou na defesa das causas democráticas.
Foram os advogados que, através de seus órgãos de classe, comandaram a sociedade civil no esforço pela Redemocratização do País, pela Anistia, pelas Diretas Já, pela Constituinte.
Danilo foi parte de todas essas lutas.”
O advogado político
O advogado Paulo de Tarso Fernandes, que também foi deputado estadual, diz no seu discurso, dirigindo-se ao presidente do TRE, desembargador Cláudio Santos:
– Se Vossa Excelência me permitir, Danilo Bessa, que já vinha de anterior militância política corajosa, foi, junto ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte, Delegado do antigo MDB e depois do PMDB por mais de dez anos. Quando do fim da ditadura, Danilo prestou inestimáveis serviços à democracia como Delegado de Partido perante a Justiça Eleitoral, pois, com sua clarividência, colaborou com o Tribunal Regional e com muitos Juízes Eleitorais, para que as novas concepções democráticas tivessem rápida e segura aplicação.
– Posso testemunhar, já que fui também dirigente partidário no período, e igualmente testemunhar antigos servidores da Corte, que Danilo participou de importantes deliberações do Tribunal, como na implementação da propaganda gratuita no rádio e na televisão, depois da queda da Lei Falcão, sendo convidado pela Presidência do TRE para colaborar com a Secretaria na definição dos atributos e cálculos, então complexos e de feição desconhecida, de distribuição dos tempos dos Partidos.
– Lembro também que foi ele que, perante o Plenário da Corte, obteve a justa decisão sobre horários e liberdade de comícios e uso de amplificadores de som, um dos mais importantes avanços da legislação eleitoral depois da ditadura, avanço no qual, penso, tenha sido pioneiro o Tribunal do Rio Grande do Norte. Foi Danilo que praticamente sistematizou o processo de registro e depois anotação de diretórios dos Partidos Políticos no Rio Grande do Norte, levando o TRE a afastar sutilezas burocráticas, e antecipando o regime de liberdade partidária da Constituição de 1988.
O porte de arma
No seu discurso, Roberto Furtado conta uma história incrível, síntese do espírito irreverente e boêmio de Danilo Bessa:
– Recordo que, sendo eu Secretário de Segurança do Estado, fui procurado por Danilo que pretendia um Porte de Arma, ao saber que havia sido regulamentada a sua concessão. É que naquele tempo a Segurança Pública tinha uma política diferente da de hoje. Então, preferíamos armar os cidadãos de bem e desarmar os marginais, ao contrário de hoje que se desarmam os cidadãos de bem e são incapazes de desarmar os marginais.
– Cumpridas as exigências regulamentares, foi Danilo comunicado do deferimento do seu pleito. Minutos depois telefona-me dizendo precisar urgentemente do Porte, pois logo da manhã seguinte estaria viajando ao Alto Sertão e como não tinha condições de ir à Secretaria, e alegando ainda ter assunto importante a tratar diretamente comigo, pedia-me, com a liberdade que nossa amizade lhe permitia, para procurá-lo no endereço que naquele momento me passava.
– Terminado o expediente da Secretaria, dirigi-me ao endereço citado e qual não foi a minha surpresa ao ver que se tratava de um bar de esquina, onde ele se encontrava com mais dois amigos, que serviriam de testemunhas de que o Secretário entregava Porte de Arma em mesa de bar. Conhecendo a irreverência de Danilo, fiz a primeira e talvez única no Brasil, entrega de um Porte de Arma regada à cerveja.
