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Acusado de cárcere privado é preso

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Andrey Ricardo – Jornal de Fato

Assu – Um professor aposentado, de 60 anos, foi preso na noite de quarta-feira passada, acusado de manter presos quatro filhos e a esposa há vários anos. Eles viviam em uma pequena casa na zona rural desta cidade, a cerca de 40 quilômetros do centro, em péssimas condições. As crianças foram atendidas pela equipe médica da cidade e apresentavam problemas psicológicos, assim como a mãe, que tinha ainda marcas de violência física. O aposentado, que aparentemente não tem problemas psicológicos, nega a acusação.

Crianças resgatadas na casa do professor Francisco Basílio passam por exames médicos preliminares no Hospital Regional de AssuA denúncia foi feita pelos familiares de Maria Aparecida Filgueira Basílio, que tem 44 anos e é casada com Francisco Basílio Neto. A relação dos dois gerou seis filhos. O mais novo tem nove e o mais velho tem 25. Segundo Diógenes Galdino Figueiredo, irmão de Maria Aparecida, a família não sabe ao certo quanto tempo ela e os filhos eram mantidos em cárcere privado. Ele conta que morava fora da cidade e não tinha conhecimento dessa situação, mas é todos na família sabiam que ela e os filhos sofriam maus tratos. A denúncia partiu justamente dele, logo após saber do caso.

A mãe de Maria Aparecida, dona Francisca Galdino Nogueira, disse que foi procurada pelos outros filhos, que pediram para ela tomar uma providência. Dona Francisca também morava no sítio Boa Vista, onde Francisco residia com os filhos e a esposa. As casas ficam a poucos metros, mas ela diz que só soube a real situação recentemente, quando resolveu visitar a filha e ver como eles estavam vivendo. “Essa situação acontece desde quando eles casaram. Ela era ciumenta e ele batia nela. Assim ela me dizia. Já essa noite (terça-feira passada, dia da prisão) ela disse que ele bateu nela de novo”.

Francisco Basílio Neto foi preso no fim da tarde de terça-feira passada, em casa. Familiares de Maria Aparecida foram à casa com policiais militares, que constataram os maus tratos. Segundo o delegado Cláudio Ferreira da Silva, que responde pela Polícia Civil em Assu, o suspeito foi autuado em flagrante pelo crime de cárcere privado, cuja pena pode variar entre dois e oito anos. De acordo com ele, as cenas encontradas pelos policiais militares eram extremamente chocantes. Os meninos estavam sujos, sem roupas, apresentando inúmeros problemas físicos e psicológicos, assim com a mãe.

Na pequena casa, que tem apenas um quarto, viviam Maria Aparecida e Francisco Basílio, junto com os filhos Silmara de Figueiredo Basílio, de 18 anos, Evanildo Figueiredo Basílio, 24, e mais dois ainda menores de idade, uma menina com nove e outra com 13 anos. “As meninas não conseguem nem falar. Foram criadas feito um bicho. É uma situação horrível. Quando os policiais chegaram lá, a situação era deplorável. A mãe tinha até bicho na cabeça”, relembra o delegado, que diz ter tentado conversar com Maria, “mas ela não tinha condições de falar. Também tinha problemas psicológicos”.

Os quatro filhos e a mãe foram levados para o Hospital Regional de Assu, onde foram submetidos a uma série de exames físicos e psicológicos. Até ontem à tarde, todos continuavam no hospital, até que haja uma decisão judicial sobre qual será o futuro dos filhos e da mãe. O delegado Cláudio Ferreira dará continuidade as investigações e diz acreditar que a família era mesmo mantida em cárcere privado pelo que havia sido colhido até ontem à tarde, apesar do suspeito negar que mantivesse presa a família ou mal tratasse alguém.

Filho vivia no guarda-roupas

A família vivia em situação de extrema pobreza e pelo menos um dos filhos teve uma criação diferente dos demais. Iranildo de Figueiredo Basílio, que tem 25 anos e é um dos que foram retirados da casa à força pela mãe de Maria Aparecida, dona Francisca Galdino, foi criado dentro de um pequeno guarda-roupas. Ele passou boa parte da sua vida dentro do móvel, onde passava praticamente o dia inteiro.

Após a prisão do pai e o resgate da mãe e dos filhos, os dois filhos que tinham fugido de casa, Lauro e Iranildo de Figueiredo Basílio, com 22 e 25 anos, voltaram à sua antiga casa para cuidar do que restou.

O segundo, que apresenta visíveis problemas mentais, contou à reportagem, meio envergonhado, que realmente morou em um guarda-roupas, que ainda hoje está na casa.

Ao ser questionado o motivo de ter crescido dentro do guarda-roupas, não soube dizer. Ele mostrou-se desconfortável com o assunto e não lembrava nem quanto tempo passou vivendo no guarda-roupa.

O mais novo, aparentemente melhor psicologicamente, saiu mais cedo de casa. Ele morava com a avó materna há cerca de seis anos. O outro saiu de casa há cerca de seis meses.

Da porta de casa, os dois conversaram com a reportagem. O mais novo confirmou que o irmão foi criado no móvel e ao serem questionados sobre a prisão do pai, os dois mostraram-se desconfortáveis.

Os dois não falam abertamente sobre os supostos maus-tratos sofridos pelos irmãos e pela mãe, mas reconhecem que o pai era mesmo violento. “Ele foi criado na violência, né? Apanhava muito dos pais e por isso ficou violento também”, minimizou Lauro Basílio.

Lauro até disse que ficou espantado ao saber que o pai havia sido preso, acusado de manter a família em cárcere.

Ele conta que fugiu de casa muito cedo, com a ajuda da avó materna, e que não tinha conhecimento do que acontecia em sua casa, por isso se espantou com a prisão do pai.

Destino dos filhos e da mãe ainda é incerto

Os quatro filhos que ainda viviam no Sítio Boa Vista e a mãe continuam no Hospital Regional de Assu. Até ontem ainda não havia uma definição sobre o seu destino. Representantes do Conselho Tutelar e demais entidades de defesa das crianças e dos adolescentes em Assu estiveram reunidas ontem para definir o futuro da família. Segundo o diretor do Hospital Regional de Assu, Flávio Cruz, toda a estrutura do hospital, bem como da Secretaria Municipal de Saúde de Assu foi mobilizada para prestar assistência à família, que chegou à unidade bastante debilitada.

“Nós resolvemos isolar a mãe e as crianças, retirando do local onde estavam os outros pacientes porque o assédio tem sido muito grande. Estamos tentando retirá-los da presença dos curiosos para tentar dar o mínimo de conforto”, disse. “Quando chegaram aqui estavam em uma situação extremamente precária. A mãe tinha lesões na cabeça e foi esse o motivo da família ter denunciado”, explicou Flávio Cruz.

Ontem mesmo Maria Aparecida e uma parte dos filhos foi trazida para Mossoró, onde foram submetidos a exames médicos. A intenção, segundo Flávio Cruz, é identificar o nível do problema psicológico. Todos, visivelmente, aparentam ter algum tipo de problema, seja físico ou psicológico, segundo a assistente social do hospital, Iolanda Maria da Cunha Souza. “As crianças ficaram muito traumatizadas com a vida que tiveram. Elas não olham nem nos nossos olhos, com medo, eu acho”, diz.

De acordo com a assistente social do hospital, uma das primeiras a ter contato com a família, todos estão estranhando muito a convivência com outras pessoas, já que foram criados praticamente isolados do restante do mundo, sem ter contato com outras pessoas.

Alguns dos filhos apresentaram problemas até de locomoção, já que não costumavam andar dentro da pequena casa.

“A gente fica até emocionada em saber que existe isso ainda. Elas não têm problemas de ordem física, tipo de agressão que tenham sofrido, mas têm muitos problemas de ordem psicológica. Essa é a consequência mais grave”, frisa.

Os membros das entidades representativas que defendem os direitos da criança e do adolescente deverão tomar um posicionamento sobre a situação hoje, encaminhando documento ao Ministério Público Estadual de Assu, que por sua vez, irá acionar a Justiça. A partir de uma decisão judicial, o futuro daquela família será definido.

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