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Agente provocador

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Merval Pereira

Que Jair Bolsonaro é um provocador, não há dúvida. Ele mesmo já admitiu em entrevista a Jô Soares que, se não dissesse barbaridades como que o então presidente Fernando Henrique deveria ser fuzilado, ou que o golpe de 64 deveria ter matado mais gente, ele não estaria sendo entrevistado.

Foi como agente provocador que foi preso quando ainda estava no Exército, por ter planejado ataques com bombas em locais estratégicos, para protestar contra o soldo militar. Foi absolvido por falta de provas, mas teve que sair do Exército como capitão, e começar uma carreira política exitosa, que o levou à Presidência da República, sempre na base da provocação política.
Agiu como provocador quando, ao votar a favor do impeachment da então presidente Dilma, exaltou o torturador Brilhante Ustra, a quem chamou de “herói”. A questão agora é saber aonde o presidente quer chegar com as provocações quase diárias.

O “agente provocador” é um player político tradicional, que radicaliza posições para levar um grupo, ou uma pessoa, a atitudes extremas que lhe serão prejudiciais, ou provocarão reações desestabilizadoras.

Os black blocks são exemplo de grupo de ação política radical que, pelas manifestações de vandalismo, são, ou favorecem, a atuação dos “agentes provocadores”. Em nossa história política recente, temos o exemplo do Cabo Anselmo, que atuou a favor da Revolta dos Marinheiros, um dos estopins do golpe de 1964. Anselmo era um “agente provocador” a serviço dos golpistas.

Quererá o presidente Bolsonaro criar um clima de instabilidade, ou será apenas um irresponsável que usa uma metralhadora giratória (loose cannon, na expressão militar)?

Quando se referiu ao pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz (foto, acima), como um terrorista que foi justiçado pelos companheiros guerrilheiros, estava provocando um debate que já estava enterrado, sobre a ação da esquerda armada contra a ditadura militar.

O Estado brasileiro já admitiu sua culpa na morte e desaparecimento de prisioneiros políticos, e assumiu a obrigação de indenizá-los, ou suas famílias. Também se criou um mecanismo de compensação financeira para os que conseguem provar que foram prejudicados em suas carreiras pela perseguição política que sofreram no período da ditadura militar.

Mesmo um presidente da República de extrema direita, como Bolsonaro, não tem o direito de querer trazer de volta o país a uma confrontação que já está superada pela História. Mas o presidente parece ter prazer em confrontações, não sabe viver em uma sociedade pacificada.

Ontem, recebeu Maria Joseíta, viúva de coronel Brilhante Ustra, e voltou a chamá-lo de “herói nacional que evitou que o Brasil caísse naquilo que a esquerda hoje em dia quer”. Poderia ter recebido a viúva do seu “herói” em sua casa, no Palácio da Alvorada, mas a recebeu no Planalto, dando ares oficiais ao encontro.

Deu, no dizer do advogado Miguel Reale Jr., “um tapa na cara da civilização”, ao elogiar alguém acusado pelo Estado brasileiro de torturador.

Mas nem só de provocações políticas vive o presidente. Para justificar a indicação de seu filho Eduardo para embaixador em Washington, disse que um filho de alguém será indicado, “e por que não o meu?”.

Ao anunciar a medida provisória que acaba com a obrigatoriedade de empresas publicarem seus balanços em órgãos de imprensa de veiculação nacional, ele não escondeu a intenção de afrontar os jornais que considera seus inimigos, “essa imprensa que eu tanto amo”.

Referiu-se a uma reportagem do GLOBO sobre 102 parentes entre si, ligados à sua família, que foram contratados ao longo dos anos pelos gabinetes dele próprio e de seus filhos, e ao jornal “Valor Econômico,” editado pela Editora Globo, especificamente, para, aos risos, dizer irônico que estava tomando aquela decisão “para ajudar a imprensa de papel”.

Enfraquecer as instituições democráticas é um objetivo de todo governo autoritário.

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