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Ariano e o riso

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Sanderson Negreiros  [ escritor ]

Flávio Azevedo está aí para não me deixar mentir. Numa viagem, certa vez, de duas horas e meia de avião, Rio-Recife, Ariano Suassuna nos fez rir, sem parar um minuto sequer, com “boutades” e historias que o definem no mínimo como um talento de humor genial.
Fazendo figa e segurando a medalha de Padre Cícero, guardado contra a possível queda do avião, Ariano começou a chatear-se quando o “locutor” começou a dar as informações óbvias em inglês.
– Péssimo, péssimo. Falar inglês dá azar. Veja Kennedy, que foi falar inglês, e terminou sendo assassinado.
O avião levantou vôo num tempo absolutamente escuro e chuvoso. Saudei a aeromoça, quando ela nos acenou com doses de uísque escocês. Ariano disse logo que não beberia.
– Tenho de estar inteiramente lúcido para tomar providências em caso de desastre. E explicou: “Um amigo meu era um dos passageiros do famoso desastre de um Boeing 707, que se precipitou nas águas da baia da Guanabara, há uns trinta anos. O avião ficou flutuando sobre as águas, quando o aeromoço gritou: – Os passageiros têm dez minutos para se salvar. Depois, o avião submergirá.
Todo mundo correu para a porta de emergência. Uma senhora gordíssima, aparada em ancas calipígias, foi quem primeiro tomou lugar diante da porta salvadora. Acontece que não podia passar. Tinha um latifúndio dorsal sobremaneira transamazônico. A turma, aflita, gritou: “Empurra ela”. A senhora abriu os cotovelos e falou: “Agora nem eu nem ninguém sai”.
O aeromoço avisa: – “Faltam cinco minutos para o avião submergir”. Na emergência, alguém lembrou: “Vamos cortar a parte mais avantajada da mulher, com peixeira, para ver se a gente se salva”. O piloto interveio: “Quem tocar na mulher, leva bala”. Os passageiros, ululantes, fizeram cerrada pressão e a mulher despencou para fora. Contudo, deixou uma das nádegas dentro do avião, que levada, depois, pelo piloto, foi recolocada no devido lugar”.
Nessa altura, nosso avião voava tranquilo. Ao nosso lado, uma mãe de família elegantemente aguentava as chateações do filho de uns quatro anos de idade. De instante a instante, o menino conseguia ir além da paciência dos passageiros. Chegou inclusive a bater na porta de emergência.
Ariano não aguentou mais e estirou o dedo para o menino que, só com isso, parou de perturbar. O poeta filosofou: “Graças a Deus sou pai de sete filhos. Mas todos, felizmente, eram burros. Nada mais intragável do que menino metido a gênio. Os meus eram burros e felizes”.
A mãe, contrariada, olhou para trás e disse apenas: “Virgem…”.

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Comparado pela critica francesa a um autor da mesma estatura de Guimarães Rosa, com seu romance “A Pedra do Reino”, Ariano tem peças sendo encenadas da Polônia a Israel. Pegou todo dinheiro dos direitos recebidos, e comprou duas mil cabeças de bode, de uma vez. Quando lhe disse que criar bode hoje é negocio rentável, segundo os economistas, Ariano justificou-se: “Eu sabia que fazia um negocio certo, um dia”.
Logo que se formou, paraibano de Taperoá, com a fala e o feijão sertanejos, foi trabalhar no escritório do maior advogado do Recife, prof. Murilo Guimarães. Um dia, Ariano sozinho no escritório, chega em prantos, com um cachorro pequenez nos braços, a consulesa da Inglaterra. O vizinho havia batido no cachorro. “Quero que o senhor faça urgente uma petição cobrando ao delegado a prisão do agressor de meu filho, aqui”. Ariano respondeu: “Minha senhora, além de não entender de Direito, tenho horror a cachorro”.
Ariano conheceu um sertanejo conhecido como “doidão”, que foi morar em Cajazeiras. Não aguentou quinze dias, foi embora e antes explicou o motivo: “Doutor, para a gente ser doido em Cajazeiras tem que ter até juízo”.
Estávamos perto do Recife e veio a última história. Em Taperoá morava um sujeito que foi, por muitos anos, marinheiro do Loide. Um dia, o navio em que trabalhava, naufraga. O marítimo viu que só podia salvar-se através da vigia. Procurou passar. Não deu. Tirou a roupa. Não deu ainda. Pegou brilhantina e passou no corpo inteiro. Deu demais.
Quando mergulhava – conta ele –, viu um tubarão imenso vir em seu rumo. O marítimo puxou de uma faca peixeira e zás… Nessa altura, um sujeito que ouvia a conversa, comentou, rápido: “Rapaz, como você conseguiu puxar a peixeira, se estava nu?” A resposta chegou fabulosa: “Você quer ouvir minha história ou quer discutir comigo?”

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