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As cicatrizes de 2017

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Ivan Maciel de Andrade                                                                                                           
Procurador de Justiça e professor da UFRN (inativo)                      

São muitas as cicatrizes deixadas pelas crises política e econômica de 2017. Algumas dessas cicatrizes são acentuadas, o que revela a gravidade de suas causas, tudo indicando que irão durar por muitos anos ainda. Outras, são leves, superficiais, talvez até transitórias. Todas elas sinalizadoras de momentos importantes da história de nosso país. Por isso mesmo, merecem e devem ser valorizadas. Se não há razões para nos orgulharmos das que decorrem dos impactos das delações premiadas, também não há por que nos envergonharmos, pois assinalam um processo de profundas mudanças.

As delações foram o mapa da mina para se chegar às grandes empreiteiras e aos agentes públicos das mais diferentes hierarquias envolvidos no oceânico propinoduto da Petrobras, que quase levou à falência nossa maior, mais próspera e promissora empresa estatal. Ninguém imaginou nem poderia o tamanho do rombo e o número de comparsas beneficiados com a monumental roubalheira.

Tudo isso representando, em última análise, um atentado aos cidadãos brasileiros que pagam impostos escorchantes e recebem (quando recebem!) em troca serviços insatisfatórios ou de péssima qualidade. Nunca se tinha visto antes escândalo tão grande praticado por tão qualificados meliantes.

Não constitui motivo de regozijo saber que a classe política brasileira está quase toda comprometida com esquemas de corrupção. Mas é forçoso render-se às evidências trazidas a conhecimento público pela Lava Jato. O trabalho desenvolvido pelos órgãos federais integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato é não só de muita competência, com eficácia comprovada pelo enorme volume de resultados, como de abnegação e, sobretudo, de grande amor ao país. A Lava Jato é um divisor de águas: há um país com características políticas e éticas anteriores às investigações realizadas pela Lava Jato e outro que está emergindo pouco a pouco dessa fase de imensa catarse.

Mas nem todas as cicatrizes contam boas histórias. Sobreveio, de repente, uma temporada de caça às bruxas, visando, por meio das delações premiadas, queimar nas fogueiras da Santa Inquisição (leia-se no cenário de linchamento moral e execração coletiva armado por parte da mídia e das redes sociais) políticos e administradores tidos como corruptos. Surgiram então graves impasses jurídicos.

Formou-se uma dupla tendência, que se tornou evidente, de forma sintomática, no Supremo Tribunal Federal. Há ministros que entendem que a Constituição Federal está acima dos interesses de combate à corrupção, por mais relevantes que sejam (e o são, sim!). Enquanto outros acham que as garantias individuais asseguradas pela Carta Magna não podem servir de obstáculo à limpeza ética (expressão com fortes conotações pejorativas) da vida pública nacional promovida pela Lava Jato.

A incerteza criada pelo conflito que ganha corpo no STF põe em xeque a vitalidade e integridade do Estado democrático de Direito. É possível chegar às últimas consequências no combate à corrupção, apurando fatos delituosos sem violar os princípios básicos da presunção de inocência e do devido processo legal? E garantir um julgamento isento, baseado em provas idôneas e criteriosas?

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