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“Atual gestão é menos ideológica”

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A visita do presidente dos Estados Unidos Barack Obama, neste final de semana, ao Brasil apontam o interesse do Governo norte-americano em ampliar os negócios com o país e ainda tentar reduzir as tensões bilaterais criadas pelo então Governo Lula. A análise é da professora Denilde Oliveira Holzhacker, integrante das Faculdades Integradas Rio Branco e docente do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da instituição.Com a autoridade de quem é especialista em Política Internacional, Denilde Oliveira aponta que o fato do Brasil ser o primeiroDenilde Oliveira Holzhacker é mestre e doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo país da América Latina a ser visitado pelo presidente norte-americano nessa visita ao continente também aponta para a prioridade que os Estados Unidos dão ao Brasil perante os demais países do continente. Avaliando a política externa desenvolvida pelo ex-presidente Lula e as ações já implantadas pelo Governo Dilma Rousseff, a professora observa que há grandes diferenças, inclusive com a atual gestão demonstrando ser “menos ideológica”. “A princípio a política externa indica um perfil menos ideológico, mesmo na relação com os vizinhos da América do Sul. Este fator pode estar simplesmente associado à diferença de personalidades entre Dilma e Lula, ou mesmo uma mudança substancial do processo de decisão e implementação da política externa”, avalia. Mas ela pondera: “ainda é cedo para fazer um balanço exaustivo sobre o novo perfil de política externa do país”. No cenário mundial, a professora avalia que o Brasil tem uma importante missão, inclusive dentro do perfil das suas atividades externas. “A defesa do diálogo e das ações multilaterais são decisivos para buscar a solução de diversos problemas da agenda internacional, como, por exemplo, as questões ambientais. A crescente agenda de instabilidades e conflitos tornam os princípios da diplomacia brasileira mais importantes”, completa.A convidada de hoje do 3 por 4 é uma especialista em Políticas Externas que traz uma verdadeira aula sobre o assunto. Com simplicidade, a professora Denilde Oliveira traz uma visão ponderada e analítica sobre as relações internacionais.

Qual a leitura que a senhora faz dessa visita de Barack Obama já no início de gestão Dilma Rousseff?

Podemos apontar diversos aspectos relacionados à viagem do Obama para a América Latina, que vão desde o interesse norte-americano em ampliar seus negócios no Brasil, até a tentativa de diminuir as tensões bilaterais, geradas durante o Governo Lula. O presidente Obama não tinha ainda feito o giro tradicional dos presidentes norte-americanos aos países latinos, uma vez que a visita ao Brasil, Chile e San Salvador pode significar o lançamento de novas bases da política externa para a América Latina. O Governo Obama foi criticado por não ter uma política externa voltada para a América Latina, que, com a participação crescente chinesa nos negócios desses países, poderia trazer prejuízos para os investimentos norte-americanos na região. Então, a viagem sinaliza que os Estados Unidos pretendem transformar a região em uma área estratégica internacionalmente. O relacionamento entre Estados Unidos e os países da região sempre foi historicamente marcado, de um lado, pelo desinteresse norte-americano e, de outro lado, por expectativas dos países latinos. A falta de uma estratégia norte-americana ficou mais evidente após o 11 de setembro de 2001, no qual os interesses do país foram direcionados para a área de segurança. Viajar (Barack Obama) para o Brasil, no início do Governo Dilma, sinaliza que os norte-americanos tentarão retomar a posição tradicional de aliança entre os países. Questiona-se, porém, quais serão as bases desse relacionamento. O fato de a viagem começar pelo Brasil tem um aspecto simbólico relevante, que é o reconhecimento da importância do Brasil dentro do contexto latino. O que o Brasil quer é que este reconhecimento se estenda para uma posição enquanto ator global, ou seja, o reconhecimento de que o Brasil consolide o seu papel internacional. Este reconhecimento seria dado por uma declaração de apoio ao pleito brasileiro para o assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Sob o ponto de vista concreto, os acordos que estão sendo negociados não sinalizam para uma declaração de Obama favorável ao pleito brasileiro, mesmo os temas de comércio também não integraram apresentam grande avanços para os interesses brasileiros.

Já é possível diferenciar a política externa do presidente Lula da de Dilma Rousseff?

Há alguns sinais de mudanças nos temas de direitos humanos no contexto internacional, com a votação brasileira no Conselho de Direitos Humanos e também a atuação do país nos casos das revoltas nos países do Norte da África e Oriente Médio. No entanto, as prioridades e a agenda permanecem inalteradas, ou seja, foi mantida a ênfase nas negociações comerciais no âmbito multilateral e também nas relações nos países da América do Sul. A grande alteração está mais relacionada ao modelo de implementação da política externa, diferentemente do Governo Lula, que o assessor da presidência Marco Aurélio tinha maior exposição na mídia. Na atual gestão, o ministro Patriota (Antonio Patriota, ministro das Relações Exteriores) tem direcionado o debate público sobre a política externa. A princípio a política externa indica um perfil menos ideológico, mesmo na relação com os vizinhos da América do Sul. Este fator pode estar simplesmente associado à diferença de personalidades entre Dilma e Lula, ou mesmo uma mudança substancial do processo de decisão e implementação da política externa. A viagem do presidente Obama será um momento para avaliar as possíveis mudanças, bem como a viagem que a presidente Dilma fará à China em abril. No entanto, ainda é cedo para fazer um balanço exaustivo sobre o novo perfil de política externa do país.

Há quem diga que as relações do ex-presidente Lula com os governantes do Irã e da Venezuela foram entrave para uma carreira internacional do ex-governante brasileiro na ONU. A senhora concorda?

O apoio do presidente Lula ao regime iraniano pode ter sim afetado suas pretensões internacionais. Apesar de contar, provavelmente, com o apoio de grande parte dos países pobres e contar de forte carisma, o ex-presidente Lula teria a oposição de grupos de defesa dos direitos humanos, que se declararam decepcionadas com as ações brasileiras nos casos de Honduras e Irã. Esses grupos, junto com grupos conservadores anti-castristas, tem grande papel na mobilização da opinião pública norte-americana e também dos congressistas norte-americanos. Os Estados Unidos tem forte peso no processo de escolha do secretário geral. Outro fator é que a própria burocracia das Nações Unidas prefere alguém que tenha um histórico de atuação na organização, dada a complexidade do processo decisório e a convergência de interesses. Nesse caso, especula-se que a atuação do ex-presidente Lula seria importante em uma organização como a  FAO ou outra que apresente uma agenda de combate a pobreza e as desigualdades econômicas e sociais. A sua experiência e rede construída ao longo de sua carreira pública terá um papel relevante e ele possa seguir o caminho de ex-presidentes como Bill Clinton, Michelle Bachelet e Fernando Henrique Cardoso que passaram a atuar em temas específicos, mobilizando recursos e a atenção para essas agendas no cenário internacional.

Qual o papel do Brasil diante do cenário mundial? Refiro-me a que tipo de “missão” tem o Brasil nesse cenário?

Qualquer política externa é atuar em defesa dos interesses nacionais. O que envolve o atendimento aos cidadãos no exterior e a abertura de oportunidades de negócios para as empresas nacionais, dessa forma, podem ser definidas como “criar condições favoráveis externas para o desenvolvimento do país”. A diplomacia brasileira é reconhecida por seu pluralismo e defesa dos princípios da negociação pacífica dos conflitos. A defesa do diálogo e das ações multilaterais são decisivos para buscar a solução de diversos problemas da agenda internacional, como, por exemplo, as questões ambientais. A crescente agenda de instabilidades e conflitos tornam os princípios da diplomacia brasileira mais importantes. No entanto, a atuação brasileira deve conciliar esses princípios com os interesses nacionais. Este desafio não é apenas brasileiro, mas de todos os países. As mudanças têm sido em uma velocidade tão grande que o modus operandi tradicional nas diplomacia, algumas vezes, encontram-se obsoletos.

Falando da política internacional: quem é o grande vilão do momento?

As as mudanças são tão rápidas que até os vilões também mudam. A onde de protestos nos países árabes mostram que regimes autoritários e seus líderes estão cada vez mais deslocadas em um ordem de grande fluxo de informação e participação de diferentes atores sociais. A crise econômica e a recessão também trazem para o sistema maiores instabilidades e vulnerabilidades que até o momento ainda não foram exaustivamente estudadas.

Como explicar que a América do Sul seja reduto de governantes como Hugo Chavez e Evo Morales? Isso é indica que a população é mais suscetível a esse tipo de gestor?

O primeiro aspecto que devemos considerar que os processos políticos na América do Sul não são da mesma natureza daqueles que vemos nas regiões africanas e oriente médio. A América Latina passou por transições democráticas ao longo dos anos 90, em que instituições e defesa de direitos foram incorporados em grande parte aos países. O Brasil e Chile são exemplos de países que consolidaram suas democracias ao longo destes anos. No entanto, alguns países ainda possuem ordens domésticas instáveis e convivem com ações anti-democráticas, entre elas censura, perseguição de grupos opositores e violência política. As debilidades dos sistemas políticos latino americano têm várias causas, entre elas a presença de líderes populistas que buscam ampliar seu poder explorando as camadas mais populares. Assim, a pobreza e a extrema desigualdade são fatores que contribuem para a manutenção desses governos.

O que entrava a entrada do Brasil como membro titular do Conselho de Segurança da ONU?

A entrada do Brasil no Conselho de Segurança, em primeiro lugar, significa maior prestígio para o país no sistema internacional e relevância nas decisões estratégicas na área de segurança. Em segundo lugar, ser membro do Conselho também traz custos para o país, porque este terá que integrar operações de paz e também envolver-se em temas e agendas não diretamente relacionados com os interesses brasileiros, como no caso do Irã. Para o Governo Brasileiro ser membro titular significa que o Brasil passa a compor um restrito grupo de países com capacidade de influência e decisão no sistema internacional.

Perfil

Denilde Oliveira Holzhacker é mestre e doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Atualmente é Assistente de Pesquisa do Núcleo de Pesquisa Em Relações Internacionais, Professora da Faculdades Integradas Rio Branco, professora Associada do Fundação Armando Álvares Penteado e professora mestre da Universidade São Marcos. Tem experiência na área de Ciência Política , com ênfase em Política Internacional.

Detalhes

Conselho em política externa para presidente Dilma: A política externa deve estar alinhada aos interesses e estratégias de desenvolvimento nacional, assim, as prioridades da agenda externa brasileira é essencial para garantir resultados positivos para o país nas suas relações externas. O reconhecimento da nossa posição de liderança no sistema internacional está diretamente associado à nossa capacidade de resolver problemas crônicos internos, especialmente relacionados ao acesso a educação de qualidade.

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