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Belle Époque de cordas e virtuoses

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Yuno Silva – repórter

Colaborou: Cinthia Lopes (editora)

A provinciana Natal, no início do século 20, não passava de um pequeno e irregular aglomerado urbano com pouco mais de 20 mil habitantes espalhados entre Rocas/Ribeira, Cidade Alta e Petrópolis. Os bondes estavam começando a circular pela cidade, e as rotas aéreas dominadas por dirigíveis e, posteriormente por hidroaviões, só viriam a se consolidar na década seguinte – nos idos anos 1920. E é dentro desse contexto que desembarca na capital potiguar, aos 22 anos, o italiano Thomaz Babini (1885-1949).
Nascido em Natal, Ítalo Babini foi, por 40 anos, primeiro violoncelista da Sinfônica de Detroit. Na foto, numa participação com a Filarmônica de Londres.
Compositor, regente e professor de música, violoncelista de renome internacional, Babini será lembrado nesta próxima semana, na Escola de Música da UFRN, durante o Festival “Thomaz Babini”. Realizado entre os dias 22 e 25, o evento montou uma programação especial para prestar justa homenagem ao responsável pela formação de toda uma geração de violoncelistas.

A pianista Ruth Smith e o violoncelista Italo BabiniO ponto alto do Festival, que abre terça-feira (22) com a palestra “Thomaz Babini e a Escola de Violoncelos de Natal” do professor Cláudio Galvão, acontece na quinta-feira (24), às 20h, quando sobem ao palco do auditório Onoffre Lopes na EMUFRN o filho de Thomaz, o natalense e também viloncelista Italo Babini, 83, e a pianista norte-americana Ruth Smith, acompanhados pela Orquestra Sinfônica da UFRN. Toda a programação é gratuita.

Italo Babini não se apresenta em Natal há mais de 50 anos, e na ocasião irá apresenta “Variações Rococó” de Tchaikovsky. O Festival abre as festividades de comemoração dos 50 anos da Escola de Música.

“Thomaz Babini conheceu e se encantou com Natal, onde morou por mais de 30 anos”, disse o professor e pesquisador Cláudio Galvão. “Constituiu família por aqui, e isso acabou segurando ele na cidade”, acredita Galvão. O pesquisador considera Babini um multiplicador de talentos: “Foi o único professor de violoncelo do RN durante todo o tempo que viveu em Natal, e formou muitos nomes que hoje estão entre os principais expoentes da música clássica deste instrumento.”

Thomaz Babini, violoncelista italiano radicado em Natal no início do século 20Thomaz Babini trabalhou como professor na Escola de Música do Teatro Carlos Gomes (Alberto Maranhão) e na Escola Doméstica. Também ensinava nas casas das famílias tradicionais da época, período que o piano era presença fácil entre a mobília das residências dos mais abastados.

“Pesquisei sobre Babini em jornais da época, era presença constante dos noticiários, mas não consegui encontrar o motivo dele ter se mudado para Recife em 1941. Pode ter se aborrecido com alguma coisa, da mesma forma como aconteceu com Waldemar de Almeida alguns anos depois, ou se foi embora por motivos profissionais. Não há nada escrito especificamente sobre ele, infelizmente há pouco interesse por essa memória”, contou Cláudio Galvão.

Vale ressaltar que Waldemar de Almeida, primeiro diretor da Escola de Música da Universidade e nome que identifica o principal instituto de formação musical vinculado ao Estado, era 20 anos mais novo que Thomaz Babini, assim como Hianto e Oriano de Almeida. “Não eram contemporâneos. Quando Babini estava indo para o Recife é que Waldemar, Hianto e Oriano estavam despontando”, explicou o pesquisador.

BATE-PAPO
ITALO BABINI, Violoncelista e compositor
“Meu pai nunca pensou em recompensas materiais”

Ítalo, apesar de estar estabelecido nos Estados Unidos, em algum momento cogitou voltar a morar em Natal ou no Brasil?

IB: Não pensei nisso, tenho minha vida fora do Brasil há muitos anos. Já visitei o Brasil duas vezes desde que vim morar nos EUA (há mais de 50 anos) e fiquei encantado com o progresso de Natal e Recife, cidades lindas.

Seu pai, Thomaz Babini, foi uma grande personalidade da música brasileira e internacional, mas mesmo assim é pouco lembrado e até desconhecido na cidade onde viveu. Saberia dizer se ele guardou alguma mágoa por essa falta de consideração?

Meu pai nunca pensou em recompensas materiais quando dedicou-se ao ensino do  violoncelo e da música em Natal; e muito menos em ser reconhecido pelo que fez. Ser lembrado pertence a essa categoria: o que é novidade hoje pode ser esquecido amanhã.

Sobre sua apresentação aqui na UFRN, qual será o programa do concerto?

O repertório irá relembrar meu pai, que gostava muito dessas partituras (as “Variações Rococó” de Tchaikovsky).

Qual o conselho que o senhor daria para quem está estudando música erudita?

O meu conselho aos estudantes é manter o entusiasmo nos estudos. Isso é totalmente imperativo para se destacar.

O senhor mantém parceria com a pianista que irá acompanhá-lo aqui em Natal há bastante tempo?

Ruth Smith, a pianista que irá tocar o recital junto comigo, e seu esposo, estarão indo pela primeira vez a Natal. Durante o tempo que morei em Detroit compomos e tocamos música de Câmara em muitos concertos.

“O milagre dos violoncelistas do Rio Grande do Norte” *

Thomaz Babini (1885-1949) nasceu em Faenza na Itália, e estudou com Francisco Serato no Conservatório de Bologna, um dos mais importantes violoncelistas italianos da época. Antes de desembarcar em Natal, no início do século 19, Thomaz passou por Belém e pelo Rio de Janeiro, onde foi o primeiro violoncelo da Orquestra do Teatro Municipal.

Entre os alunos de Babini em Natal, e posteriormente em Recife, podemos citar seu enteado Aldo Parisot, seu filho Italo Babini, Mário Tavares, Nany Devos, Juarez Johnson e Waldemar de Almeida Júnior. É impressionante imaginar que em uma cidade afastada dos grandes centros, com população na época de aproximadamente vinte mil pessoas, Babini tenha conseguido formar alguns dos mais relevantes violoncelistas da atualidade.

A produção de Thomaz Babini no RN foi um verdadeiro milagre, inigualável, e até hoje nos causa forte impressão a qualidade dos alunos que ele conseguiu produzir, reconhecidos internacionalmente como referências no violoncelo do século 20.

* Trecho (editado) do artigo de Fábio Presgrave publicado na revista Concerto (maio 2012), especializada em música clássica.

A TRAJETÓRIA

DOS BABINI

1885

Nasce em Faenza/Itália Thomaz (Tommaso) Babini

1907/1908

Violoncelista, regente, compositor e professor, já com o nome artístico de Thomaz Babini. Chega ao Brasil para apresentações em Belém-PA e Rio de Janeiro-RJ. Vem a passeio para Natal, onde se estabelece e constitui família. Babini começa a ensinar música nas casas das famílias tradicionais. Na época, Natal tinha em torno de 20 mil habitantes.

Escola Doméstica, Ribeira1910/1920

Como professor de violoncelo da escola do Theatro Carlos Gomes (Teatro Alberto Maranhão) e da Escola Doméstica de Natal, foi mestre de Aldo Parisot (enteado de Thomaz/ que depois veio a se tornar músico da Filarmônica de Berlim e de Nova York);  Mário Tavares, Nany Devos, Juarez Johnson e Waldemar de Almeida Jr.

1928

Nasce em Natal, em novembro deste ano, o maestro Ítalo Babini

1941

Thomaz Babini se muda para Recife com a família, onde continua a trabalhar com música

1943

Ítalo Babini muda-se para o Rio de Janeiro, onde estuda música. Vence concurso do Ministério da Educação e ganha uma bolsa de estudos para um país europeu de sua escolha.

1947

Babini vai estudar em Munique (Alemanha).

1949

Morre o violoncelista e regente Thomaz Babini, em Recife

1950

Ítalo ganha bolsa de estudos nos Estados Unidos e se estabelece profissionalmente por lá. Nos 40 anos seguintes ficou como músico titular da Orquestra Sinfônica de Detroit-EUA

1991

Ítalo Babini se aposenta da Detroit Symphony Orchestra;

2012

Assembleia Legislativa do RN vai conceder título de Cidadão Norte-Riograndense “In Memoriam” ao mastro Thomaz Babini

*As datas não são precisas devido a falta de registro impresso

Fontes: Entrevista de Ítalo Babini concedida à TN, por e-mail; e artigo de Fábio Presgrave para a revista Concerto;

Tese de doutorado “Alguns Compassos – Câmara Cascudo e a Música (1920/1960) de Cláudio Galvão (USP-2010)

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