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Blues

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Dácio Galvão
A boa notícia da semana sem dúvida foi a premiação do vídeo clipe de Diogo Moncorvo, em Cannes, o Grand Prix na categoria Entertainment for Music do Cannes Lions 2019. Barato total. O cara bem que merece. Vem fazendo um trabalho transgressivo, comendo pelas beiradas como se diz por aí. Navegando nas margens de um mercado complexo oligopolizado por nichos sem comprometimento algum com processos evolutivos da estética artística.

O lixo por aí espalhado vale sobretudo na manipulação de massas pelas mídias que se conhece e o velho menosprezo pela alienação do povão. Diogo, ou Baco Exu do Blues, seu nome de batalhas e guerras pensa e faz diferente. Acreditando no engajamento literário produz letras que permeiam os discursos cotidianos que afligem aos que habitam as periferias. Com eles passa a inserir num novo lugar de poesia o contexto atual marginal. Reivindica a inclusão social e a quebra de paradigmas hipócritas e preconceituosos. Do comportamental ao repertorial pode chegar ao coito, ao êxtase ao delírio.

Novo movimento do homem não cordial. Na contramão de um Brasil do faz-de-conta-que-não-existe. Não mais embaixo do tapete questões raciais, sexuais, religiosas. Capitães de Areia, Macunaíma e o Minotauro de Jorge Luis Borges são entidades presentes nos seus escritos e atmosferas intertextuais.

Tudo posto cru e embalado nas mixagens que dialogam com o samba-rap-salsa-rock somados a obsessão visceral pelo blues. Sim o blues entendido no sentido lato. Estilo de vida e consciência sócio-política do bluesman. O estilo norte-americano que deu sentido e voz ao negro trepida no âmago do militante rapper. Acima de Deus, BB King e Muddy Waters. E no mesmo patamar Jesus, o Nazareno, o carpinteiro que ele acredita ter habitado a pele negra.

É bacana o audiovisual brasileiro atingir performance desse nível. Disputa acirrada, competitiva com vozes, códigos, signos, formas e conteúdos transitando contra a convenção e pulsando um mundo libertário quase abafado por uma estrutura que se quer permanente. Há então holofotes no fim do túnel. É tentar e tentar virar o jogo. Sempre. A Coala.lab  que é uma plataforma de música do Coala Festival fez parceria com a AKQA somada a produtora Stink e resultou nesse ganho importante que amplia a projeção necessária de um trabalho que até agora não fez concessão ao mercado. Dividiu a premiação com “This is America”, do rapper Childish Gambino. Havia sido lançado em novembro de 2018 e agora pinta a legitimação do produto. A direção assinada por Douglas Bernardt que depois de uma temporada em Nova York em 2014, onde estudou direção de fotografia na School of Visual Arts, apurou seu estilo documental. Com três músicas do disco do rapper, BLUESMAN ao durante o tempo de mais de 8 minutos redimensiona o audiovisual nacional.

Não é novidade alguma que o futebol ou melhor a habilidade para o futebol-arte e o talento para a música nacional faz nossa diferença no planeta. Vencendo todas as mazelas, obstáculos e sacanagens de toda ordem. Tudo à essas linguagens se opõem. E a tudo elas se sobrepõem. Com a força intrínseca de uma mistura de plasmas que só se detecta e vislumbra nos limites do nosso território criativo. As feras como Darcy Ribeiro, José Miguel Wisnik e Antonio Risério estão canônicos em nos dizer. Não lê, não ouve quem não quer. Ou quem não está nem aí para porra nenhuma. Ainda assim a gente vai remando, a gente vai levando. Salve e salve Diogo e Douglas que acreditam na sociedade plural, aberta, democrática e no utópico engajamento estético. Este antagonismo tem muito em que colaborar decisivamente para mudanças necessárias em tempos presentes. Desistir nunca!

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