Rio (AE) – O movimento que prega o boicote da cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) no Rio já ganhou a adesão de 14 associações de moradores e deve gerar uma manifestação no domingo (20). Líderes comunitários estão se associando em torno da proposta de depósito em juízo ou do pagamento das cotas do IPTU somente no fim do ano, para prejudicar os planos eleitorais do prefeito Cesar Maia (DEM). Eles marcaram um encontro na praia do Leblon, o qual poderá terminar em passeata. Faixas e cartazes estão sendo feitos.
Hoje (16), o prefeito disse que, em vez de criar dificuldades, o movimento pode aumentar a arrecadação da Prefeitura, que foi de R$ 1,2 bilhão em 2007. Maia diz não correr risco de ficar sem dinheiro para serviços e investimentos no ano eleitoral. “Tenho R$ 3,2 bilhões em caixa”, informou à reportagem. Para o prefeito, há motivação política no movimento, mas o principal motivo é a sensação de insegurança provocada pela violência na cidade. “Mas segurança é com o Estado”, desvia o prefeito. A campanha pelo boicote foi iniciada pela Associação de Moradores da Fonte da Saudade (Amofonte), área nobre da Lagoa, na zona sul da capital fluminense. Insatisfeitos com a incapacidade da prefeitura de coibir a favelização das áreas verdes da região, os moradores resolveram contratar advogados para fazer o depósito em juízo do IPTU 2008 – uma forma de sensibilizar o prefeito no bolso.
Cerca de dois mil moradores de uma das regiões mais valorizadas da cidade estariam dispostos a não entregar a Maia o imposto este ano. A divulgação da decisão provocou a adesão em cascata de várias outras entidades, motivadas pela desordem e abandono visível nas ruas da cidade. “Essa manifestação tem raízes em diversos tipos de insatisfação. A favelização é resultado da irresponsabilidade total da política habitacional do município, mas as pessoas também estão insatisfeitas com a sujeira, o abandono, o loteamento das calçadas por ambulantes, que têm a conivência da Prefeitura. A população se irritou diante de tanta insensatez, desmando e arrogância”, avalia a vereadora Aspásia Camargo (PV), relatora da CPI da Desordem Urbana, que listou no ano passado centenas de queixas de moradores e entidades. Para a vereadora, se boa parte dos cariocas apenas deixar de fazer o pagamento em cota única – cujo desconto Maia reduziu este ano de 10% para 7%, aumentando a crise -, o prefeito já terá inviabilizados ganhos no mercado financeiro. O presidente da Associação de Moradores do Leblon, João Fontes, acredita que se 20% dos cariocas aderirem de alguma forma, Maia terá problemas para fazer o que ele chama de “maquiagem pré-eleitoral” na cidade. Ele defende o pagamento de todas as cotas do IPTU somente em novembro, mesmo que isso acarrete em juros de até 25%. “Vou colocar o dinheiro na poupança e, mesmo sem rendimento igual aos juros, vale a pena pagar um pouco mais pela causa”, disse. Para Maia, essa opção trará “um ganho expressivo” para a Prefeitura. Em seu boletim eletrônico de hoje (16), o prefeito disse que o contribuinte pagará 21,8% a mais de imposto, superando os rendimentos que a Prefeitura teria aplicando os recursos recebidos no início do ano com a cota única. Irônico, ele citou no boletim uma frase atribuída ao rei macedônio Pirro, que venceu romanos antes de Cristo: “Mais uma vitória como esta e estou perdido”. “O prefeito me lembra Nero, que tocava cítara enquanto Roma pegava fogo. A cítara de Maia é o ex-blog”, devolveu Aspásia, referindo-se ao criticado hábito do prefeito de passar horas na internet. Ana Simas, presidente da Amofonte, diz que os moradores da Lagoa insistirão no depósito em juízo, mas que as formas de boicote se complementam. “Queremos abrir um canal no Judiciário para discutir o mau uso do IPTU. O Rio é uma cidade turística, um patrimônio do Brasil. Não merece esse descaso. Essa maneira desdenhosa do prefeito de dizer que não vai dar em nada mostra como ele trata o cidadão carioca, como se fosse nada. Podemos não causar grandes problemas para ele, mas ficará um prejuízo político que é incalculável”, afirmou Ana, que tem recebido cerca de 100 e-mails de apoio de cariocas por dia. O presidente da seção fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), Wadih Damous, concorda com as críticas à administração de Maia e sua política fiscal, mas vê com restrições o boicote. “Tenho dúvidas se desguarnecer o caixa da cidade é o melhor caminho para cobrar serviços melhores. A segurança, por exemplo, não é de responsabilidade exclusiva do município”, ponderou.