São Paulo – O presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, encerrou ontem a visita de menos de 24 horas ao Brasil levando na bagagem avanços na área energética e impasses no que se refere à influência do presidente da Venezuela, Hugo Chávez – as principais frentes da parada no Brasil, no giro por cinco países latino-americanos. Bush acertou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cooperação para produção de etanol, mas eles não se entenderam quando o assunto – ainda que sem menção explícita – foi Chávez.
Diante dos jornalistas, Bush disse que buscar alternativa ao petróleo é “questão de segurança nacional” e não se cansou de dar o parabéns a Lula por ter sido eleito democraticamente. Lula disse ao visitante que todos os governos da região foram eleitos democraticamente. Houve avanços em outras frentes.
Os dois países comprometeram-se a insistir nas negociações da Rodada Doha e firmaram as bases para assinatura em breve de acordo para estimular a democracia em países africanos. Para Rubens Ricupero, ex-embaixador em Washington, a visita fez o Brasil ser reconhecido mundialmente como detentor de uma tecnologia de ponta, na área dos combustíveis renováveis. Mas ele recomenda comedimento na comemoração: nem o etanol será substituto total do petróleo nem significará a salvação das exportações brasileiras. Quase 90 quilômetros de ruas foram bloqueados para a comitiva de Bush, o que fez o paulistano mudar o comportamento para fugir da confusão causada no trânsito. Os protestos não tiveram a violência registrada na véspera. Num deles, estudantes comeram bananas em um Mc Donald’s.
George W. Bush, deixou claro que o mercado americano de etanol não será aberto aos produtores brasileiros até 2009, pelo menos. A posição de Bush foi expressa diante da imprensa e do próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na véspera do encontro oficial entre Lula e Bush e da assinatura do acordo de cooperação sobre biocombustíveis, a redução das barreiras tarifárias ao etanol tornara-se a principal reivindicação do governo brasileiro. Ao final do evento, Bush decidiu não alimentar ilusões do lado do Brasil. Lula preferiu indicar que a posição da Casa Branca é equivocada e a sua mudança demandará um “processo de convencimento”. “Isso não vai acontecer. A lei sobre as tarifas (de etanol) vai vigorar até 2009.
Quando chegar essa época, o Congresso vai decidir”, declarou Bush, que evitou tocar novamente no assunto. “Tem momento que você encontra uma pessoa, olha na cara dela e diz: não gostei. Depois de alguns meses, aquela pessoa virou tua melhor amiga. Ou seja, você estava equivocado quando disse que não gostava.
Vai chegar um dia em que essa conversa (sobre as tarifas) vai amadurecer e a gente vai chegar ao denominador comum”, rebateu Lula. Apesar do desapontamento, o presidente brasileiro não dispensou a oportunidade de mostrar-se espirituoso ao responder se não teria sido capaz de convencer Bush a reduzir as tarifas de importação sobre o etanol – hoje de US$ 0,54 por galão, considerada proibitiva.
Presidente não escapa de vaias e protestos
São Paulo – Ontem, último dia de sua visita ao Brasil, o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, foi alvo de mais manifestações em São Paulo. Apesar do esquema de segurança montado pela Polícia e pelo Exército, ele não escapou de vaias e protestos. A União Nacional dos Estudantes (UNE) cumpriu a promessa de tentar se aproximar da comitiva de Bush, mas teve pouco sucesso. Enviou quatro ônibus à sede da Transpetro, pela manhã, mas apenas dois chegaram antes da formação de um bloqueio no entorno da subsidiária da Petrobrás e a manifestação fracassou.
O que era para ser o primeiro protesto do dia virou uma tímida manifestação de nove sindicalistas que portavam cartazes de “fora Bush”. O local era o de mais fácil acesso em toda a agenda. Jornalistas e os sindicalistas não foram revistados nem sequer abordados pelo batalhão de policiais e soldados. Moradores do bairro assistiram à passagem do comboio a menos de dois metros. Outro grupo de estudantes, com cerca de 100 integrantes, ficou na frente do Hotel Hilton, onde Bush se hospedou. Junto com militantes do PSTU, queimaram um boneco do presidente e gritaram “fora Bush”. Impedidos pela PM de se aproximar de alguns carros da comitiva que utilizaram o acesso da Avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini, gritaram “abaixo a repressão”. Os estudantes fizeram também piquenique em uma lanchonete McDonald’s, onde comeram bananas.
Os movimentos sociais não apareceram na visita de Bush à ONG Meninos do Morumbi, último compromisso na cidade. A UNE disse que a manifestação no local ficaria a cargo do Movimento dos Sem-Terra (MST) que, por sua vez, afirmou que estudantes tinham se comprometido a organizar o ato. As manifestações ficaram por conta de moradores indignados com o bloqueio de mais de 10 quarteirões. Quatro adolescentes usaram narizes de palhaço e mostraram à comitiva um cartaz com a pergunta “por que você está aqui?”. Duas moradoras improvisaram uma faixa pedindo a assinatura do Protocolo de Kyoto. Moradores da região ficaram cerca de duas horas sem poder atravessar barreiras montadas em cruzamentos. Bush foi embora sob vaias, principalmente depois de ter acenado da limusine.
Em Colônia, no Uruguai, onde Bush e o presidente Tabaré Vázquez se encontram amanhã (10), houve uma marcha “antiimperialista” com 200 integrantes de grupos de extrema esquerda – barrados a cinco quilômetros da residência de Anchorena. Vásquez, que já se intitulou antiimperialista, foi chamado de “traidor”. Em Montevidéu, manifestantes encapuzados destruíram, com pedras e paus, as vidraças de duas lanchonetes da rede americana McDonald’s. Os restaurantes estavam vazios. Em meio aos protestos na capital uruguaia contra a visita do presidente dos Estados Unidos, dois jornalistas ficaram feridos. Na Guatemala, líderes maias avisaram que vão ‘purificar’ o sítio arqueológico de Iximche, para espantar ‘maus espíritos’ atraídos pela comitiva de Bush, que chega segunda-feira. Sindicatos e camponeses repudiaram um eventual acordo para produzir etanol. A Cidade do México será a última escala de Bush no seu giro pela América Latina. Um dos agricultores que se reuniram ontem na frente da embaixada dos EUA exibia máscara de diabo: “Meu nome é George Bush, matador de mexicanos.”
Primeira-dama ouve canção do exílio
São Paulo – A sala de aula virou “classroom” e o banheiro “restroom”, sinais da visita internacional. Quando a primeira-dama dos Estados Unidos, Laura Bush, entrou na classe, dez alunos aplicados, de todo o Brasil, liam o poema “Canção do Exílio”, do poeta Gonçalves Dias. Num terninho cinza básico, brincos, colar e batom vermelhos, Laura não interrompeu.
Sentou-se numa cadeira deixada vazia para ela, entre os estudantes do Alfabetização Solidária (Alfasol). Foi o primeiro compromisso na agenda social de Laura ontem, que incluiu brincar com crianças e ouvir música brasileira no Projeto Cidade-Escola Aprendiz. À tarde, acompanhou o presidente George W. Bush à Organização Não-Governamental (ONG) Meninos do Morumbi. Bush quebrou todos os protocolos. Não ficou sentado assistindo às crianças cantarem e dançarem na frente dele. Levantou-se, pegou o ganzá (tipo de chocalho) de um dos meninos, tocou e dançou o “Brasileirinho” com os alunos. A apresentação durou cerca de 20 minutos. Foi acompanhado pela primeira-dama dos EUA, que ensaiou passos de forró ao lado das crianças. Sempre muito formal, mas sem querer ficar para trás, a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, arriscou uns passos.