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Campanha sem o núncio

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A renúncia do Papa Bento XVI ocorre na mesma semana em que a Igreja Católica lança oficialmente a Campanha da Fraternidade 2013 — há programação entre amanhã e a sexta-feira —, que este ano será endereçada, principalmente, aos jovens com o tema Fraternidade e Juventude. “A juventude está um pouco perdida nesse caldeirão de tendências, de realidades diversas, fatos inéditos, desrespeito à dignidade humana e violência desenfreada”, afirmou o arcebispo de Natal, dom Jaime Vieira Rocha. A renúncia do Papa cancelou a visita do núncio apostólico a Natal, dom Giovanni D’Aniello, programada para sexta-feira. Na entrevista que segue, Dom Jaime Vieira Rocha destaca a importância da Jornada Mundial da Juventude, este ano no Brasil, e que o investimento na juventude é uma janela que a Igreja precisa investir para tornar-se audível ao mundo.
Lançamento da campanha da Fraternidade teria presença do núncio, cardeal Giovanni D”Aniello
O tema da Campanha da Fraternidade (CF) desse ano é a juventude. E, também nesse ano, teremos a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) no Brasil. Qual a importância desses eventos?

As jornadas foram incrementadas pelo saudoso papa João Paulo II reunindo milhões de jovens em todo mundo. De dois em dois anos, a Jornada ocorre e o Brasil foi contemplado. Por isso que a CF, que completa 50 anos de criação, se volta para a questão da juventude. Isto, para nós, é muito importante, tendo em vista que o lançamento vai ocorrer aqui em Natal, uma vez que a iniciativa partiu daqui, na época que Dom Eugênio era bispo auxiliar da Arquidiocese de Natal. O lançamento ocorre na Quarta-feira de Cinzas e, nacionalmente, ocorre nos dias 14 e 15 de fevereiro.

Como será a programação?
Teremos a visita dos bispos do Regional Nordeste 2 [Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte]. Teremos uma programação em Nísia Floresta e seminário no Centro de Convenções. Será um evento muito importante e peço que o povo de Deus participe.

O tema “juventude” é recorrente na Igreja Católica. O papa João Paulo II tinha um carisma maior pelos jovens. A igreja, de fato, se preocupa mais com essa parcela da sociedade?

Eu tenho impressão de que nós deveríamos dar sempre mais atenção ao jovem. O próprio papa Bento XVI já nos fala isso: “a juventude é o presente e o futuro da humanidade e da igreja”. Se quisermos uma sociedade melhor, temos de investir nos jovens que serão a geração reinante daqui a algumas décadas. Olhar para a juventude é um desafio muito grande, pois o jovem está sendo formado por esse mundo globalizado, pela mídia, pela internet e por esses meios de comunicação muito eficientes e também dentro de uma mudança de época muito profunda na qual as pessoas querem viver o momento presente. O jovem de hoje é muito objetivo. A juventude passa por essa fase em que é preciso certo equilíbrio. O jovem se preocupa e se volta para o corpo. A sua adolescência e processo de amadurecimento humano e afetivo é muito precoce. Cresce fisicamente, mas a cabeça, mente e o espírito estão atrofiados. Vemos gente adulta e corpulenta, mas a cabeça sem referência, consistência e sem equilíbrio. Há uma queima de etapas.

Como transformar a Igreja, com tantas regras fixadas há séculos, em algo atrativo para essa juventude que é tão ligada às mudanças?

Há um perigo diante dessas mudanças e estabilidade do tempo presente. Dentro dessa globalização, avalanche de informações e liberdade irrestrita, há também uma busca de mais segurança e certezas. E, às vezes, tem havido, por parte da juventude, uma manifestação tradicionalista. Até mesmo na Igreja ocorre isso. O Conselho Vaticano II é visto como algo sem valor, pois trouxe mudanças. É preciso equilíbrio entre o que é fundamental e imutável, mas deve-se ficar atento para saber e ter a felicidade de dialogar com o mundo plural e mais aberto. Como seremos mensagem audível se nos fecharmos ao mundo? É preciso investir na juventude, respeitar as manifestações de credo, mas sabermos e apontarmos um caminho de esperança num mundo melhor.

O que o senhor poderia apontar qual o maior problema da juventude no mundo de hoje?

A própria mudança de época. Lembro que a década de 60 foi marcada como a década em que tudo mudou. Hoje, não se fala em época de mudança, mas em mudança de época. Tudo está imprevisível. Não sabemos como será a sociedade daqui a 10 anos, por exemplo. Antes, as instituições básicas como escola, família e igreja tinham autoridade e influência sobre os jovens. Hoje, já não tem mais. O jovem não tem mais preconceito, é muito aberto e vive seu momento. Precisamos ter cuidado para saber, primeiro, com que linguagem podemos atingir o jovem. Sinto-me desafio em falar para o jovem.

E qual seria o principal objetivo da CF?

Tenho impressão que o objetivo é oferecer à juventude um referencial de valores, pistas e caminhos. A juventude está um pouco perdida nesse caldeirão de tendências, de realidades diversas, fatos inéditos, desrespeito à dignidade humana e violência desenfreada. Vivemos num mundo onde há um cenário conturbado precisando de um caminho que leve tranquilidade. A CF vai oferecer à juventude uma oportunidade para ela se encontrar no tempo e espaço descobrindo seu valor e ideais para serem jovens pé no chão para construir um mundo melhor.

O senhor foi reitor no Seminário de São Pedro, não é isso? Como está a realidade hoje? Há uma escassez de seminaristas? O jovem ainda se interessa por ser padre?

Fui reitor entre os anos de 1987 a 1995. À época, recebi o seminário com 14 alunos. Ao sair, tínhamos 52 seminaristas. Depois da vinda do papa ao Brasil, em 1980, onde ele demonstrou preocupação com a escassez de padres, pediu aos bispos que fosse feito um trabalho vocacional. A partir dali, começou um trabalho que rendeu frutos e hoje, graças a Deus, vemos que há vocações. Em locais onde já houve muitas vocações, está se escasseando, como ocorre no Sul. No Nordeste, há certo crescimento. Hoje, não podemos lamentar o número de vocações. Mas é preciso o cuidado e competência na formação porque não se trata de números, mas de qualidade. É preciso estar atento à legitimidade da vocação. Não posso querer ser padre para ter uma vida fácil. Lembro que, certa vez, um rapaz que trabalhava num supermercado foi levar a feira ao seminário. E tinha muita coisa nessa feira porque era muita gente. O rapaz viu aquilo, perguntou o que era aquele local e quis ser padre. A coisa não pode ser assim. Não podemos transformar o sacerdócio em um meio de vida. Seria um desastre muito grande.

É preciso perceber que a vocação não está no caminho certo ainda na formação do padre?

Sempre insisto na seleção dos candidatos. Há um processo de acompanhamento, ouvir o jovem, entender seus motivos e fazer a seleção. Hoje, a entrada no seminário é mais madura. Eu entrei com 14 anos. Hoje, o índice de perseverança é maior. Quando entrei no seminário, em 1961, havia 82 seminaristas. Desses, apenas quatro se ordenaram. É possível entender o que levou o jovem a escolher esse caminho na formação.

Artigo

Papas também renunciam

Frei Betto – Escritor e assessor de movimentos sociais

Adital – “O papa não adoece, até que morra”, diz um provérbio romano. João Paulo II, homem midiático, não temeu expor–se enfermo aos olhos do mundo. Agora, Bento XVI dá um testemunho de humildade e, admitindo as limitações de seu precário estado de saúde, anuncia que renunciará no último dia de fevereiro. Na história da Igreja quatro papas renunciaram ao ministério petrino: Bento IX (1º de maio de 1045), Gregório VI (20 de dezembro de 1046), Celestino V (13 de dezembro de 1294) e Gregório XII (4 de Julho de 1415). Bento XVI será o quinto, a partir de 28 de fevereiro.

Sagrado papa aos 20 anos, em 1032, Bento IX não primava pela ética e muito menos pela moral. Sua vida era um escândalo para a Igreja. O povo romano expulsou-o da cidade em 1044. No ano seguinte, voltou a ocupar o trono de Pedro e, meses depois, renunciou. Retornou ao papado em 1047, do qual foi deposto definitivamente no mesmo ano.

João Graciano, padrinho de Bento IX, pagou considerável quantia de dinheiro para que o afilhado lhe cedesse o lugar. Eleito papa em maio de 1045, adotou o nome de Gregório VI e governou a Igreja até dezembro de 1046, quando o afilhado o derrubou sob acusação de simonia.

Morto Nicolau IV, em 1292, cardeais italianos e franceses fizeram do consistório arena de disputas pelo poder, movidos mais por interesses políticos que pelas luzes do Espírito Santo. Após dois anos e três meses de impasse na eleição do novo papa, Pedro Morrone, eremita italiano, de sua caverna nas montanhas enviou carta ao consistório, instigando-o a não abusar da paciência divina.

Os cardeais viram na carta um sinal de Deus e decidiram fazer do monge o novo chefe da Igreja. Pedro Morrone relutou, não queria abandonar sua vida de pobreza e silêncio, mas os prelados o convenceram de que o consenso em torno de seu nome tiraria a Igreja do impasse.

Com o nome de Celestino V, tornou-se papa em agosto de 1294. Menos de quatro meses depois, a politicagem vaticana o levou ao limite de sua resistência. Em consulta a seus eleitores, levantou a pergunta-tabu: pode o papa renunciar?

O colégio cardinalício não se opôs e, numa bula histórica, Morrone justificou-se, alegando deixar o trono de Pedro para salvar sua saúde física e espiritual. A 13 de dezembro do mesmo ano retornou à solidão contemplativa nas montanhas. Vinte anos depois foi canonizado, exaltado como exemplo de santidade. A 19 de maio a Igreja celebra a festa de São Pedro Celestino. Também o papa Gregório XII renunciou, no início do século XV – período em que três papas reivindicavam legitimidade – para evitar que o cisma na Igreja se aprofundasse.

Joseph Ratzinger, atual Bento XVI, é sobretudo um teólogo. Enquanto papa, não deixou de escrever, tanto que lançou uma trilogia sobre Jesus. São raros os papas-autores, sem considerarmos os documentos pontifícios, como encíclicas, bulas e alocuções, quase sempre redigidos por assessores.

Em geral, intelectuais não se dão bem com funções de poder. As questões administrativas parecem enfadonhas diante de tantos livros por ler e escrever. O político quer administrar; o intelectual, criar. Ratzinger talvez tenha decidido reservar o que lhe resta de tempo de vida para recolher-se à oração e à produção teológica.

Inicia-se agora a mais sutil campanha eleitoral: a da eleição do sucessor de Bento XVI. Entre os atuais 209 cardeais da Igreja Católica, 118 têm direito a voto, pois ainda não completaram 80 anos. Entre os eleitores figuram cinco brasileiros: Geraldo Magella, arcebispo emérito de Salvador (79); Cláudio Hummes, arcebispo emérito de São Paulo (78); Raymundo Damasceno, cardeal-arcebispo de Aparecida (76); João Braz Avis, ex-arcebispo de Brasília, atualmente em Roma como Prefeito da Congregação para a Vida Consagrada (64); e Odilo Scherer, cardeal-arcebispo de São Paulo (63).

Com certeza o novo papa fará sua primeira viagem pontifícia ao Rio de Janeiro, em julho, para a Jornada Mundial da Juventude.

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