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“Chegar onde cheguei é difícil, continuar é muito mais difícil”

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Por Anna Ruth Dantas

Depois de conquistar vitórias, medalhas e sucesso, o nadador potiguar Clodoaldo Silva está agora num novo desafio: vencer o próprio Clodoaldo. O atleta assume que o seu treino hoje é voltado para a superação dos números. “Chegar ao lugar  onde cheguei é difícil, mas continuar é muito mais difícil”, comenta o atleta assumindo que, pelas vitórias e recordes, tornou-se vitrine para os desportistas. “No Brasil, na China, nos Estados Unidos todo mundo quer bater Clodoaldo”. Longe de assustar, o nadador diz que está empenhado nos treinos e atribui ao esporte todas as vitórias conquistadas na sua vida. Diferente do menino carente do bairro de Mãe Luiza, Clodoaldo Silva conheceu com o sucesso e o dinheiro trazido pelo esporte um mundo novo, mas não abandonou suas origens.  Um atleta vitorioso, mas simples e humilde, esse é o nosso entrevistado de 3 por 4.

Você chegou recentemente de uma competição na Inglaterra onde superou o próprio recorde. O desafio de Clodoaldo hoje é superar Clodoaldo?
O desafio de Clodoaldo hoje é treinar muito mais, se dedicar muito mais. Chegar no lugar onde cheguei é difícil, mas continuar é muito mais difícil. Hoje sou referência no Brasil e no mundo. Japão, China, Estados Unidos e Espanha estão pensando no Clodoaldo para bater. Com certeza é treinar muito mais, tudo através de um planejamento, do meu técnico Carlos Paixão. De uma estrutura por trás que eu tenho. Apesar da natação ser um esporte solitário, individual, tem que ter uma estrutura para que eu esteja apenas pensando em nadar, me concentrado na minha profissão para ter um bom rendimento. Cheguei de Manchester com um surpreendente resultado até para mim porque meu treinamento está todo planejado para o final do ano, no campeonato  mundial da África do Sul. A melhora dos tempos tenho certeza que foi a motivação e incentivo de nadar com atletas de outras categorias mais fortes, sabia que para ganhar uma medalha tinha que fazer um tempo bem melhor.

Então sua motivação hoje é se superar para não permitir outros lhe ultrapassarem, já que hoje você é a grande vidraça da natação na sua categoria?
Com certeza. O esporte foi criado para isso. A gente superar a gente mesmo. Esse é meu pensamento. Nunca entro numa competição para querer vencer as outras pessoas. Eu entro em uma competição para  vencer o próprio Clodoaldo. Meu objetivo é me superar, isso que coloco na minha cabeça e traço metas. Preciso estar sempre melhorando caso contrário não teria alegria, felicidade de estar treinando. Na natação você não depende dos outros e sim de você mesmo.

E essa superação começou ainda quando aquele menino nasceu deficiente no bairro carente de Mãe Luiza?
Com certeza. A superação vem desde o meu nascimento, há 27 anos. Nasci com paralisia, falta de oxigenação durante o parto da minha mãe, aos 2 anos de idade fui morar no interior em Caiçara do Norte, lá fiquei três anos, voltei aos 5 anos. Tenho mais três irmãs e um irmão. Minha mãe é uma batalhadora, meu pai se separou muito cedo dela. Minha mãe trabalhava de manhã, tarde e noite. Muitas vezes ficamos sozinho em casa e sem algo para comer. Apesar de todo esforço, não era o bastante. E mesmo sem coisas materiais, nunca faltaram a união e a fraternidade dos meus irmãos. Até os 7 anos não andava. Para fazer coisas mais simples, eu tinha que me arrastar ou meu irmão me carregava nas costas. Eu tinha duas opções: ficava em casa, que naquela época não tinha televisão, aparelho de som, mas eu escolhi a segunda opção ir para a rua e brincar com os meninos da mesma idade.

Na natação para deficientes, você como atleta sente essa diferença: a discriminação entre o atleta deficiente e o que não possui esse problema?
Esse preconceito e essa discriminação existiram muito na minha infância e adolescência antes de eu começar a praticar esporte. No movimento paraolímpico nunca houve essa discriminação, no movimento olímpico, pelo contrário, havia e há muita admiração e respeito, muita alegria quando as pessoas me vêem. Pessoas que hoje eu admiro Fernando Scherer, Thiago Pereira, Gustavo Borges chegam para mim e dizem: puxa você é muito ambicioso, enquanto a gente passou a vida inteira treinando para conseguir uma medalha, você vai lá e arrasta seis. Eles não nos tratam como pessoas incapazes e sim como pessoas capazes e que representam bem o Brasil. Eles têm o pensamento que se a gente treina, participa de competição não há porque haver diferença.

Mas você há de concordar que a situação do portador de necessidades especiais hoje no Brasil é delicada no mercado de trabalho. Se você não fosse nadador buscaria seu espaço aonde?
Sempre fui uma pessoa, desde a infância, que gostei de estudar e tinha o pensamento de querer me formar em Educação Física, Psicologia. Se hoje não fosse atleta estaria cursando ou já teria terminado uma faculdade. Esse é o pensamento de qualquer pessoa que tem um tipo de deficiência, ser profissional e se capacitar. Hoje nosso governo abre brechas para que as empresas possam estar pegando pessoas com necessidades especiais, falta muita capacitação. Espero que possam oferecer essa capacitação porque não precisamos de piedade e sim de oportunidade.

Depois de que você entrou no esporte e se tornou um atleta famoso, acredito que você conheceu um novo mundo, de viagens, dinheiro, novas pessoas. De tudo isso que se aproximou de você, o que mais lhe deixou admirado?
A humildade de muitos atletas que antes eu tinha oportunidade de ver pela televisão e ficava imaginando como era aquele atleta. Quando passei a conhecer vi um mundo totalmente diferente, que são pessoas iguais a você, tem sensibilidade, humildade, choram. Uma pessoa que passei a admirar muito mais, porque hoje sou amigo dele, foi o Gustavo Borges. Tive várias oportunidades de encontrar com ele, tenho admiração muito grande, o próprio Vanderlei Cordeio. São pessoas que hoje tenho oportunidade de estar com elas e o legal do esporte é isso. Tudo que tenho hoje é através do esporte. Se tenho patrocínio foi o esporte que me deu. Hoje tenho uma casa para morar com minha mãe, meu padrasto.

Mesmo conhecendo esse “novo mundo”, você continua morando em Mãe Luiza.
Isso é para preservar as origens; é fundamental você continuar em um lugar que dá tão certo. Em time que se ganha não se mexe. Em agosto vou me mudar para o Rio de Janeiro, mas serão dois anos, não significa que vou deixar Natal. Vou continuar apoiando os projetos em Mãe Luiza. Uma exigência que fiz de ir para o Rio foi continuar integrando a equipe do Rio Grande do Norte. Estou com um pensamento de instalar o Instituto Clodoaldo Silva em Natal, que visa atender às crianças e adolescentes com ou sem deficiência para praticar esportes. Eu não tive essas oportunidades e cheguei onde estou. Fico imaginando, se não tive tantas oportunidades e cheguei onde cheguei, as pessoas com algum tipo de oportunidade vão chegar muito mais longe.

Você disse há pouco que tudo que tem deve ao esporte. O esporte lhe trouxe riquezas?
Espiritualmente sim. Alegria, auto-estima, qualidade de vida, minha independência. Antes tinha independência e depois do esporte aumentou muito mais. Riqueza para o esporte parolímpico ainda está muito distante. Acredito até que no esporte olímpico, tirando o futebol, ninguém consegue ficar rico da noite para o dia. Mas acho que essa alegria de estar treinando, competindo, conhecendo novos países, conhecendo amigos proporcionam um conhecimento muito grande. Essa é a maior riqueza que eu posso ter.

Você também ingressou no mercado das palestras motivacionais. Você usa o próprio exemplo nestes eventos?
É o meu sim. Fico muito feliz por isso. E estou sendo essa pessoa que passa uma mensagem de otimismo, superação, vontade para outras pessoas, empresários, funcionários de empresas e conto da minha infância, adolescência. Fico feliz de estar passando cada palavra, cada frase que eu passo e ver o mundo de forma diferente. O mundo você tem que buscar oportunidade para ela chegar, se qualificar, para se superar.

Perfil

A vida de Clodoaldo Francisco da Silva é marcada pela superação. Hoje, ele se preocupa em quebrar recordes, marcas mundiais na natação. Mas antes de entrar no mundo do esporte, o jovem teve que transpor barreiras sociais, físicas. Diferente de muitos que se acomodaram no meio do caminho, o atleta potiguar foi além.  Aos 27 anos, Clodoaldo é um dos grandes medalhistas da paraolimpíada brasileira.  Agora o atleta segue para um novo plano. Treinará no Rio de Janeiro pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro.

Permanecerá por dois anos. “Mas não vou deixar o Rio Grande do Norte. Continuarei competindo pelo meu Estado e também virei fazer alguns treinamentos aqui”, pondera o nadador.  A ida para o Estado carioca tem também outro significado: Clodoaldo Silva será o embaixador da Federação das Indústrias no Pan-Americano e no Parapan-Americano. São projetos empresariais e desportistas, mas que não tiram Clodoaldo também do foco social: ele destaca que pretende continuar atuando nas causas sociais. O atleta concluiu o segundo grau e alimenta o sonho de cursar uma universidade. Seu plano é o curso de Psicologia. Para quem imagina que todo grande atleta começa logo cedinho a prática do esporte, Clodoaldo desmistifica. Ele ingressou na natação aos 16 anos por recomendação médica.

Detalhes

Lição de vida: minha mãe
Ídolo: Ayrton Senna
Qualidade: é difícil falar de você. As pessoas que falem de mim.
Defeito: perfeccionista
Em que você acredita: Deus
Sonho concretizado:asa da minha mãe
Plano: ser feliz
Alegria: o Brasil ser hexa
Sentimento: amor pela vida.
Quem é Clodolado Silva: alegre, extrovertido

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