Merval Pereira
Um hábito chinês, mais pessoas a cada dia usam máscaras nas ruas, assim como em “Chuva negra”, os habitantes de Tóquio andam permanentemente de guarda-chuvas. As queimadas da Amazônia vêm alimentando protestos pelo mundo, e ontem a situação chegou a um ponto crítico quando o presidente francês Emannuel Macron pediu uma reunião dos países mais desenvolvidos do mundo, o G7, para tratar do que chamou uma “calamidade para Humanidade”.
A reação imediata do governo brasileiro foi afirmar que a reunião do G7, “sem a participação dos países da região, evoca mentalidade colonialista descabida no século 21”. Está certo, mas, ao sacar a carta do patriotismo, Bolsonaro está estimulando uma teoria da conspiração que alimenta a paranoia de muitos. A de que os “estrangeiros” estão querendo nossas riquezas amazônicas.
Na Ordem do Dia pelo 25 de agosto, Dia do Soldado, o comandante do Exército, Edson Leal Pujol, afirmou, nessa linha, que incautos insistem em tutelar a Amazônia: “Não se enganem. Os Soldados do Exército de Caxias estarão sempre atentos e vigilantes, prontos para defender e repelir qualquer tipo de ameaça.”
Seria mais produtivo que a reação brasileira fosse menos emocional, e mais científica. Poderiam informar que, para a Nasa, a atividade total de incêndios na Bacia Amazônica neste ano “esteve próxima da média em comparação com os últimos 15 anos”. Os técnicos salientam que, embora nos estados do Amazonas e Rondônia os incêndios tenham aumentado, estão abaixo da média em Mato Grosso e Pará, segundo estimativas do Global Fire Emissions Database.
Se o governo brasileiro não se mostrasse oficialmente tão avesso à proteção ambiental, na retórica muito mais do que na prática até o momento, e tão adversário das ONGs que atuam na Amazônia, a ponto de o presidente Bolsonaro acusá-las de estarem colocando fogo nas florestas de propósito, para prejudicar a imagem do Brasil no exterior e continuar ganhando verbas que foram cortadas, seria mais fácil lidar com esse problema.
A situação ambiental é tão delicada e grave que, quando Bolsonaro tentou juntar os ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente, todos consideraram um escândalo, sinal de que o meio ambiente seria relegado a segundo plano. Hoje, se ele voltar ao tema, anunciando que a ministra Teresa Cristina acumulará as pastas, todos vão achar ótimo. Só tirar o elefante da sala já desanuviaria o ambiente.
A ministra da Agricultura tem se mostrado sensata e cuidadosa no trato da questão ambiental, que passou a ser uma preocupação dos agricultores que dependem da imagem do país no exterior a fim de conquistar mercados para a exportação, ou no mínimo mantê-los.
A crise ambiental em que o país está metido pode ser letal para o agronegócio, que já entendeu isso. Bolsonaro disse que, se nossas exportações para a Europa forem prejudicadas pela crise ambiental, a culpa terá sido da imprensa, que fez sensacionalismo sobre suas acusações de participação das ONGs nos incêndios.
Diz-se que elogio em boca própria é vitupério. No caso, vitupério de Bolsonaro é elogio.