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Claudinei Quirino: “A base do Brasil é o atletismo”

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FRASE -

Por Anna Ruth Dantas

O atletismo é o esporte mais democrático. A análise é do recordista e atleta olímpico Claudinei Quirino. Aos 35 anos, o corredor abandonou as pistas onde fez sucesso e ganhou fama, mas não abandonou o atletismo. Hoje Claudinei se dedica às ações sociais. Ele percorre todo o Brasil dando uma lição de vida sobre "correr em busca dos sonhos". "Eu sou um exemplo vivo. Morei em orfanato, passei por muitas situações difíceis, mas cheguei", comenta o atleta. Nesta entrevista a TRIBUNA DO NORTE, Claudinei Quirino revela seus projetos a partir de agora, quando já não está mirando competições. Até mesmo a olimpíada de inverno, que competiu com uma equipe brasileira, valeu como experiência, mas ele descarta uma nova disputa. Sobre sua carreira de atleta, os novos projetos e as ações sociais, Claudinei Quirino foi o convidado de 3 por 4.

Você encerrou sua carreira depois de 14 anos de iniciada, qual foi o seu ponto alto nesta trajetória?
O ponto alto para um atleta é a olimpíada. Cheguei a três olimpíadas, quando você conquista a medalha olímpica é melhor ainda, claro que a gente queria a de ouro, mas eu consegui a de prata. Acho que ali consegui o melhor da minha carreira.

Como foi a sua experiência na olimpíada de inverno, onde você disputou no bosled. Repetiria a dose?
Eu fui mais para colaborar, foi uma experiência boa. É uma nova modalidade que está começando no Brasil, eu era reserva da equipe. Foi uma experiência. Foi a segunda olimpíada da equipe. Eu era reserva, por uma fatalidade, o menino (da equipe brasileira) foi pego no exame anti-dopping, e eu entrei. Se não fosse isso eu não iria nem entrar. Fui lá, foi experiência boa, principalmente para o Brasil, que já tem uma equipe boa, em agosto eles voltam para Salter Lake City. Eu paro aqui, não volto. Bati a cabeça, machuquei o nervo. É um esporte muito radical.

Mas o torcedor poderia apostar no potencial da equipe brasileira para a olimpíada de inverno?
Acho que o pessoal pode apostar. A equipe do Brasil é séria. A base do Brasil é o atletismo. Eles vão para Salter Lake City para treinar.

Depois de chegar ao ponto alto da sua carreira de corredor, qual o seu objetivo hoje?
Hoje eu quero passar tudo que aprendi para o pessoal novo que está começando, principalmente a parte social. Eu viajo o Brasil inteiro com a Caixa. Não é para formar atletas, claro que isso também. Mas nosso objetivo maior é a inclusão social. É mostrar para as crianças que elas também podem. Está ali um exemplo vivo. A nossa intenção é formar cidadãos de bem. O esporte é um meio para chegar na criança.

Você acredita que as ações sociais pecam no momento que priorizam a formação do atleta ao invés da base da inclusão social?
Eu acho que sim. O pessoal tem que puxar primeiro a criança e tem que puxar a educação primeiro. Em vários lugares que eu trabalho, inclusive em Presidente Prudente, a criança para praticar esporte tem que estar estudando. Assim incentiva mais a educação. O esporte é o caminho.

Você disse que é um exemplo vivo para as crianças. O que lhe faz ser esse exemplo vivo?
Eu falo que sou exemplo vivo porque eu saí de uma situação totalmente adversa para o sucesso no esporte. Hoje em dia todo lugar que eu passo a criança reclama que não tem tênis, não tem chuteira, que o esporte é para rico. E eu mostro para a criança que passei boa parte da minha vida em um orfanato e não tinha a mesma coisa que eles e consegui. Sou exemplo vivo por isso.

O que você lembra do seu passado, dessa fase no orfanato?
Nem sei quanto tempo passei no orfanato. Eu só tinha pai. Minha história é meio complicada, só sei que quando dei para mim estava lá (em Presidente Prudente). Tem coisas na vida que a gente não quer lembrar, como diz meu psicólogo.

Você não quer lembrar do seu passado?
Não é isso. Não sinto orgulhoso, são fases ruins que a gente tem que esquecer, a gente tira o aprendizado. A minha primeira lembrança no atletismo foi uma olimpíada que passou na televisão e lembro que vi Joaquim Cruz e Zequinha Barbosa. Foi ali que me despertou o esporte. Fiquei em Lençóis Paulista, trabalhei de pedreiro, padaria, de empacotador no mercado. Ingressei no esporte no último trabalho. Trabalhava no balcão do posto de estrada aí o menino que conheci lá, o Tião, fazia atletismo. Através dele perguntei o que ele fazia para ficar tão forte. Foi aí que eu tomei o esporte.

Você concorda com a afirmação de analistas sociais que o esporte é o único meio que iguala pobres e ricos numa mesma condição?
O esporte tem esse poder de igualar as pessoas de todas as origens, nível social. Você pode ter idéia na Copa. Vendo pela televisão você não sabia quem ganhava mais ou quem ganhava menos, se um é branco ou um negro. As pessoas, e falo como telespectador, vêem todos iguais. O esporte tem esse poder de nivelar.

O atletismo também tem problemas com o ego dos atletas, como o futebol?
O atletismo é um dos melhores do mundo, no sentido que só depende de você. Não tem jeito de enganar. No futebol tem o artilheiro, mas no atletismo é só você. Essa parte você se preocupa. Quando tem o revezamento surge a questão do ego. Mas cada um tem que fazer um pedacinho, e  nenhum pedaço é melhor do que o outro. Se você vai atrás e boicotar o time inteiro perde. Se fizer sua parte boa lá na frente vence todo mundo.

No país do futebol e do vôlei, o atletismo é discriminado pela falta de incentivos?
Incentivo é fundamental para todo esporte. Claro que hoje temos um grande patrocinador que é a Caixa, que tem vários programas. No atletismo antigamente, você tinha Robson Caetano, Zequinha Barbosa, Joaquim Cruz, e de repente esses atletas pararam e nunca mais apareceu ninguém. Demorou um pouco para vir a geração da Mauren (Mauren Higa Magi), André Domingos, Vicente Lenilson, que é de Currais Novos, eu, o Jádel Gregório. O atletismo não tinha essa formação de base. O atleta surgia porque o atleta não servia para jogar bola aí ia para o atletismo. De um tempo para cá está tendo uma formação de base, o que garante uma renovação sempre.

O atletismo não é mais o “primo pobre” do esporte principal?
Hoje não por causa da escolinha de base. Antes o pessoal que ia para o atletismo era sempre de outro esporte. O atletismo era o primo pobre do esporte.

Mas ainda há diferenças de tratamento entre o atleta de corrida ou o de futebol, por exemplo?
Eu acho. Quem pratica atletismo sempre é o pessoal mais carente. Porque o atletismo é um esporte que não requer muita coisa. Se você tem short e camiseta já pode treinar. Não precisa ter tênis. O atletismo é um esporte barato.

Seria o esporte mais democrático?
Se você tem tênis você corre, se você está descalço você corre. Pode correr sem camisa. É um esporte a cara do povo brasileiro mesmo.

Esporte democrático, mas não tem tanta remuneração?
O patrocínio da Caixa está ajudando muito, tem esporte que está até pior do que o nosso, mas hoje o Atletismo está superagradecido pela parceria.

Muitos atletas têm problemas com o dopping. A legislação é muito severa ou o atleta está dando mau exemplo?
Nessa parte aí eu prefiro não responder, mas na outra parte como o exame antidopping eu  acho que é importante. No esporte o atleta diz que não fuma, não bebe, geração saúde. Não tem porque usar uma droga, se fizer isso está se contradizendo. O pessoal do antidopping está muito certo de fazer isso.

Os gastos para eventos esportivos são criticados, principalmente quando surgem de países deficitários. Isso está ocorrendo nos preparativos do  Pan-Americano de 2007.  É correto locar milhões de recursos para eventos esportivos, quando setores básicos como educação e saúde continuam carentes de investimentos?
É muito importante eventos esportivos. A gente tem que começar a fazer alguma coisa. Eu respondo essa pergunta dizendo que compensa sim. O país tem que investir tudo. Ele tem que investir na educação, no esporte, na saúde. Se o pessoal for competente para atrair investimentos do esporte, quem é da área de saúde, educação também tem que buscar esses investimentos. Pegar o recurso para saúde, para educação, segurança.

Perfil

O menino órfão de Lençóis Paulista chegou longe demais. Claudinei Quirino coleciona participações em três olimpíadas. O ponto alto foi a medalha de prata conseguida em Sidney, em 2000, no revezamento 4 X 100.  Entre os títulos ele também estampa o bronze no Mundial de Atenas em 1997 e a prata no Mundial de Sevilha em 1999.  O velocista é recordista sul-americano dos 200 metros. Hoje Claudinei se dedica ao projeto social, onde faz parceria com a Caixa, e também comanda uma equipe de atletismo na cidade de Presidente Prudente. Antes de alcançar a fama no esporte, Claudinei trabalhou em padaria, posto de gasolina e como pedreiro. E na sua infância guarda lembranças da vida no orfanato.

Detalhes

Qualidade: humildade
Sonho concretizado: minha família
Defeito: falar demais
Plano: ter filhos
Em que você acredita: em Deus
Lugar: Presidente Prudente, foi onde eu tive oportunidade e me vi gente. Sou de Lençóis, mas foi em Presidente Prudente que a vida aconteceu para mim.
Lição de vida: respeitar e ser respeitado

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