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Como uma onda

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João Maria de Lima 

Professor

A língua é uma atividade social. É parte integrante da vida em sociedade. Por isso, as mudanças que ocorrem nela são fruto da ação coletiva de seus falantes, uma ação impulsionada pelas necessidades que esses falantes sentem de se comunicar melhor, de dar mais precisão ou expressividade ao que querem dizer, de criar palavras para dar uma ideia mais exata de seus desejos de interação.
Na semana passada, destaquei o primoroso trabalho da Academia Brasileira de Letras, que tem registrado palavras de uso muito recente. Volto ao tema a fim de ampliar a divulgação desses termos, relembrando uns versos retirados da canção “Como uma onda”, de Lulu Santos e Nélson Motta, a qual bem se aplica a esse cenário de ebulição de vocábulos e comprova que  “Nada do que foi será/De novo do jeito que já foi um dia/Tudo passa, tudo sempre passará…”.
Começo por “micromachismo”. Esse termo foi cunhado por Luis Bonino Mendez, um psicoterapeuta espanhol, em 1991, mas tornou-se agora muito popular na América Latina, onde o problema prolifera. Trata-se de conjunto de atitudes e comentários preconceituosos em relação à mulher, geralmente dissimulados ou sutis, mas frequentes e muitas vezes despercebidos por estarem culturalmente enraizados. O sociólogo francês Pierre Bourdieu descreveu o mesmo fenômeno como “neomachismo”.
Uma palavra bastante interessante, que, talvez, muita gente se identifique é “misocinesia”, que significa, ao pé da letra, “ódio aos movimentos”. É um distúrbio caracterizado pela forte intolerância (raiva, fúria, irritabilidade, estresse, ansiedade, etc.) à visão (ou apenas percepção) de movimentos corporais repetitivos, rítmicos ou padronizados executados por outra pessoa (como balançar de modo inquieto os pés, as pernas ou passar continuamente a mão nos cabelos, por exemplo). O termo deriva do grego: “miso” (ódio, aversão) e “cinesia” (movimento).
Você já acordou à noite e correu para conferir as notificações do celular – e teve dificuldade para dormir depois? Já se queixou de cansaço físico e mental diante da enxurrada de informações consumida digitalmente ao longo do dia? Esqueceu o celular em casa e isso acabou sendo um gatilho para uma crise de ansiedade? É preciso ficar atento porque esses “sintomas” podem indicar que você tem mais que um vício. Você desenvolveu uma doença conhecida como “nomofobia”. A condição é tão atual que o nome nem vem do latim, como na maioria das outras fobias: o termo “nomo” é uma abreviação do inglês “no mobile” (sem telefone móvel).
Sabe aquele aroma que a chuva provoca ao cair em solo seco? O nome desse aroma, cuja intensidade varia conforme o tipo de solo e a velocidade dos pingos de chuva, é “petricor”. Bear e Thomas, dois pesquisadores australianos, empregaram esse termo pela primeira vez num artigo na revista Nature, em 1964.  Como se vê, o vocábulo não é tão novo, mas era desconhecido.
A locução substantiva “letramento racial” define o conjunto de práticas pedagógicas que têm por objetivo conscientizar o indivíduo da estrutura e do funcionamento do racismo na sociedade e torná-lo apto a reconhecer, criticar e combater atitudes racistas em seu cotidiano.
Quem apresenta poucos ou leves sintomas de determinada doença é chamado de “oligossintomático”. Do grego “olígos” (pouco, em pequena quantidade)  e “sintomático”.
Já “nato-digital” é  documento, contrato, diploma, publicação, material, conteúdo, etc. que foi criado originalmente em meio eletrônico. Também ocorrem as formas “natidigital” e “nado-digital”.
Nossa lista se encerra com “sororidade”, que é um sentimento de irmandade, empatia, solidariedade e união entre as mulheres, por compartilharem uma identidade de gênero; ou, ainda, conduta ou atitude que reflete este sentimento, especialmente em oposição a todas as formas de exclusão, opressão e violência contra as mulheres. Do latim “soror” (irmã) e “(i)dade”. 
Ao que tudo indica, não existia o termo “sororidade”, quando as mulheres que se separavam de seus cônjuges eram chamadas de “desquitadas”, palavra cujo emprego certamente seria muito questionado nos tempos hodiernos.

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