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Contaminação por nitrato é crescente

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Durante os últimos dez anos 38 poços tiveram de ser desativados em Natal, por conta da alta concentração de nitrato registrada nas águas retiradas dessas fontes. Uma das saídas encontradas pela Caern para impedir que o fechamento atingisse os demais 119, resultando na escassez de água potável para a população da capital, foi a construção de duas adutoras: do Jiqui e do Rio Doce. A primeira opera em fase de testes e a segunda deve ficar pronta no segundo semestre. Suas águas serão utilizadas para diluir a dos poços e reduzir a concentração de nitrato.

San Vale ainda é a única área de manancial que não foi poluída e por isso o Ministério Público busca sua preservação com urgênciaPorém, a promotora de Defesa do Meio Ambiente, Gilka da Mata, entende que a situação ainda é grave. “A evolução da contaminação por nitrato na água de Natal continua crescente e prejudica o abastecimento humano”, disse. Ela lembra que, em 2005, a Caern possuía 134 poços em atividade e, desses, 69 apresentavam contaminação por nitrato. “A cidade está perdendo grande  parte da água que servia para o abastecimento humano e que se contaminou”, lembra Gilka da Mata, considerando que hoje são apenas 119 postos ativos.

Ela revela que números de 2010, levantados pela Agência Reguladora de Saneamento Básico de Natal (Arsban), registraram 15 poços com índice de nitrato acima do permitido para o consumo humano na zona Norte, de 22 analisados, e outros 26 na zona Sul, de 50 pesquisados. A posição da Caern é menos incisiva. Através da Assessoria de Imprensa, a companhia garantiu que a “situação atual está controlada, a partir da diluição da água, com teor de nitrato acima de 10 mg/l, na água da nova adutora, que vem operando gradativamente”.

A adutora do Jiqui entrou em fase de teste no final de 2009 e dependeria, para funcionar em sua plenitude, da construção de duas subadutoras, sob a responsabilidade da Prefeitura do Natal. Ainda assim, a Caern garante que o uso da água da lagoa do Jiqui na diluição dos poços já traz “resultados significativos”. A companhia admite “problemas pontuais em alguns bairros, enquanto a adutora não opera totalmente”, e cita Felipe Camarão, Morro Branco, Pirangi e adjacências.

A lista do Ministério Público é bem mais extensa: Lagoa Seca, Dix-Sept Rosado, Quintas, Bairro Nordeste, parte do Alecrim, Potilândia, Nova Descoberta Morro Branco, Lagoa Nova, Nazaré, Bom Pastor, Felipe Camarão, Cidade Nova, Nova Cidade, Pirangi, Jiqui, Gramoré e Pajuçara. “E a população tem levado ao conhecimento do Ministério Público situações que evidenciam valores crescentes de contaminação em outros bairros”, acrescenta a promotora.

Gilka da Mata ressalta que a construção das adutoras, por parte da Caern, foi uma exigência judicial, em decorrência de uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público. “Irão melhorar a qualidade da água distribuída à população, mas essas medidas são para solucionar o problema em regime emergencial. A cidade cresce, a população aumenta e os mananciais do Jiqui e rio Doce não serão suficientes para o abastecimento da população a longo prazo”, alerta.

A  adutora do rio Doce tem previsão de entrar em funcionamento no início do segundo semestre. Os poços que atenderão à adutora já foram perfurados e, segundo a Caern, apresentaram água de excelente qualidade.

Tratamento de esgoto faz parte das soluções

A Caern entende que o projeto mais importante para a redução dos níveis de nitrato é o investimento que vem sendo feito na coleta e tratamento dos esgotos da capital. As obras evitarão que dejetos se infiltrem no solo, através de fossas, contaminando o lençol freático. Para Gilka da Mata, é preciso agilidade. Ela defende a preservação do manancial que ainda não foi poluído, sobretudo na região do San Vale, a conclusão das adutoras e a implantação integral do sistema de esgotamento sanitário.

“Não se pode igualar Natal a outras cidades que não possuem sistema de esgotamento porque a situação aqui é atípica. O aquífero de Natal não tem uma proteção argilosa que costuma separar o lençol freático do aquífero confinado. Dessa forma, tudo o que se despeja no subsolo acaba se espalhando por todo o aquífero e atingindo as camadas mais profundas de onde se retira água para consumo humano”, esclarece.

A promotora questiona a falta de um planejamento específico, como um Plano Diretor de Abastecimento de Água, determinando os locais mais adequados para a extração do líquido. A Caern, porém, confirma pelo menos um dos locais onde a água ainda é de boa qualidade: o San Vale. Essa mesma região, junto com a de Ponta Negra, são as que apresentam menores índices de contaminação por nitrato, variando de zero a um máximo de 4 mg/l.

Nas áreas em que o valor ultrapassa o limite de 10 mg/l, porém, o consumidor só é obrigado a pagar 50% da conta. O Ministério Público está avaliando ainda se pedirá na Justiça um desconto na tarifa de esgoto, tendo em vista que a Caern cobra pelo serviço, mas não realiza o tratamento de muitos dejetos coletados na cidade. “A estação do Baldo irá solucionar uma grande parte do problema, mas não resolverá o problema em sua integralidade”, diz a promotora.

Campanha

O Ministério Público lançou, no último dia 22, a campanha “Salve a Água Potável de Natal”, cujo objetivo é mobilizar a sociedade pela preservação do manancial localizado na área da zona de proteção do San Vale. “É uma campanha simples e a pessoa pode participar com apenas o gesto de assinar um abaixo-assinado eletrônico. O efeito final será determinante para mostrar aos poderes públicos que a população conhece o problema e exige solução rápida e eficaz para impedir que a contaminação por nitrato chegue à ZPA do San Vale, que abastece 16 bairros.”

De acordo com a promotora, a falta de saneamento na região fez com que poços que apresentavam 1,0 mg/l de nitrato, em 2004, hoje registrem até 5,4 mg/l. O abaixo-assinado já recebeu quase 4 mil adesões e está disponível no endereço:  www.mp.rn.gov.br/aguapotavel/

População não confia nas medidas

O índice de concentração de nitrato registrado nas últimas contas de água da população do conjunto Pirangi, zona Sul de Natal, foi de 7,8 mg/l. O valor abaixo dos 10 mg/l torna a água da região potável, segundo os critérios estabelecidos pela Portaria 518/04, do Ministério da Saúde. O número não convence quem bebe a água. “Não dá para confiar, quando o negócio fica errado, para ajeitar é difícil”, resume o aposentado José Guilherme Filho.

Morador do Pirangi há 26 anos, ele lembra que adotou o consumo de água mineral há cerca de três, quando as suspeitas de contaminação da água na região passaram a ser divulgadas pela imprensa. “Todo mundo ficou assombrado com essa história e agora só se bebe água mineral. Para voltar a tomar a água da torneira, precisava mudar muito”, aponta.

A opinião de José Guilherme não é exceção. “Nem acredito nisso (a concentração de nitrato registrada na conta), aqui em minha residência é agua mineral para beber e também é a única que utilizamos para cozinhar”, revela a dona-de-casa Zélia Firmino. O hábito também foi adotado há cerca de três anos e representa, hoje, um consumo médio de quatro garrafões por semana, o que equivale a um custo mensal superior a R$ 50. “Vamos continuar usando a mineral, porque não acredito que a água esteja limpa”, destaca.

Melhor para comerciantes como Núbia Gomes, cuja mercearia é praticamente toda tomada por garrafões de água mineral. “Acredito que vendo uns 40 por dia”, revela. Ela admite que o consumo tem aumentado em grade parte por causa do calor excessivo, mas lembra que os moradores da região continuam usando exclusivamente a água mineral para beber e não conhece ninguém que se “arrisque” na água da torneira.

Riscos

O Nitrato é considerado um dos contaminantes de ocorrência mais comum em águas subterrâneas. A água só é considerada potável quando a concentração dessa substância é inferior a 10mg por litro. O nitrato chega aos poços e aquíferos principalmente em decorrência da falta de redes de esgoto. A população utiliza fossas sépticas, onde a substância é produzida durante os estágios finais da decomposição do material biológico. O nitrato penetra no solo e chega ao lençol freático. Há suspeitas de que o acúmulo de nitrato possa provocar câncer e outras doenças no ser humano.

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