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Contendo os excessos

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Merval Pereira
A ambiguidade do governo Bolsonaro, determinada principalmente por seu desapreço pela política partidária — seu novo partido é o décimo a que já se filiou — e pelos grandes temas econômicos e sociais, criou um vácuo de poder que o Congresso tratou de preencher.
Até mesmo o combate à corrupção, uma de suas principais bandeiras eleitorais, agora está hasteada a meio pau. A pesquisa Datafolha mostra que a população identifica o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, como atuante e eficaz no combate à corrupção e ao crime organizado, e o governo como empecilho, principalmente por causa dos últimos acontecimentos, como a tentativa de, no STF, proteger seu filho Flávio de investigações pelos órgãos de controle financeiro como a atual Unidade de Inteligência Financeira (UIF) e a Receita Federal.

A população continua apoiando o combate à corrupção, cujo símbolo é a operação Lava-Jato, e vê os outros setores do governo, que deveriam estar ajudando nesse combate, como pouco eficientes. O pacote anticrime que Moro tenta aprovar no Congresso não teve em nenhum momento o apoio formal do presidente Bolsonaro, que se empenha apenas quando os temas são do gosto específico de seu núcleo duro de apoiadores: liberação de armamento, retirada de radares das estradas, questões de costumes. Mesmo assim, o Congresso tem imposto limites a essas pautas.

Fora disso, o governo deixa a seus “postos Ipiranga”, o ministro Paulo Guedes e Moro, a tarefa de batalhar apoios no Congresso, sem dar sinais de que está empenhado na aprovação de projetos importantes como a reforma da Previdência, por exemplo. O presidente Bolsonaro, além de um apoio não muito enfático ao que era considerado o movimento mais importante na economia, em alguns momentos interferiu para reduzir o alcance da reforma, atuando a favor das corporações militares.

A reforma da Previdência dos militares é exemplar disso. Foi muito elogiada pelos próprios, classificada pelo ministro da Defesa, general Fernando de Azevedo Silva, como “a mais importante realização de 2019”. Uma reforma necessária, mas que, em todos os lugares do mundo, inclusive no Brasil, provoca protestos, leva os militares a elogiarem o governo que a realizou.

A falta de empenho de Bolsonaro com as propostas que ele mesmo envia para o Congresso fez com que os políticos tomassem as rédeas das reformas estruturais de que o país necessita. E até mesmo agendas supostamente bolsonaristas, como o combate ao crime organizado e à corrupção, ficam ao sabor do ânimo do Congresso, que não raras vezes dá prioridade a temas que não são os do Planalto.

Há várias medidas provisórias paradas no Congresso, e algumas já caducaram por decisão dos parlamentares, como a desobrigação de publicação de editais em jornais. Urdida como instrumento de retaliação à imprensa, explicitada em comentários irônicos do próprio presidente que lhe podiam valer processo por crime de responsabilidade, foi colocada em banho-maria pela Câmara até caducar.

O pacote anticrime, que foi refeito pela Câmara, retirando o excludente de ilicitude, figura que favorecia abusos policiais, foi uma derrota pessoal de Bolsonaro, que mais uma vez atuou para proteger uma das corporações que sempre o apoiaram. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, explica assim a decisão: “No caso agora de Paraisópolis, se esse projeto tivesse sido aprovado, os policiais não teriam sido investigados”.

Também o plea bargain, essa uma das medidas consideradas por Sergio Moro mais importantes do pacote, foi considerada “um excesso” pela Câmara. Ela permite um acordo entre o promotor e o réu, que se considera culpado e pode receber um beneficio.

Explica Rodrigo Maia: “Você ter uma lei dura que caminhe para o enfrentamento da impunidade é importante também, mas limitada àquilo que não é excesso. Essas duas propostas que citei [excludente de ilicitude e plea bargain] eram excessos. Nos EUA, por exemplo, [o plea bargain] gerou um encarceramento enorme, principalmente da população negra; são temas não maduros e radicais.”

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