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Contrato de seguro e pandemia

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Rodrigo Alves Andrade
Advogado
O estado de calamidade sanitária decorrente da COVID-19 motiva questões relevantes sobre o contrato de seguro. Há uma série de questões a serem definidas pelo Poder Judiciário, no âmbito do seguro de vida, de danos empresariais, que envolve interrupção de negócios, e de reequilíbrio contratual. O seguro é um negócio pelo qual uma das partes se garante diante de riscos futuros previstos no contrato. É contrato bilateral, com interdependência de obrigações, estando o pagamento da indenização vinculado ao prêmio pago pelo segurado (CC, art. 763), e aleatório, porque não se consegue antecipar a vantagem que a parte receberá, em troca da prestação efetuada. 
O estado de calamidade sanitária poderia trazer intenso debate no âmbito do seguro de vida. A discussão foi em boa medida afastada, porque as principais companhias de seguro optaram por garantir a indenização, em caso de falecimento decorrente da Covid – 19, sem questionar exclusão decorrente de eventos provenientes de endemias e pandemias. Ainda sobre seguro de vida, poderá vir à tona a disposição legal pela qual o segurado que agravar intencionalmente o risco objeto do contrato perde o direito à garantia (CC, art. 768). O ponto é se haverá perda de cobertura, em caso de recusa a se vacinar, em falecimento causado pela Covid – 19. Sucede que o dispositivo exige agravamento intencional do risco, e a sua interpretação é restritiva. É o caso da contratação de seguro contra incêndio de local que tem sua destinação alterada e passa abrigar inflamáveis, cujo garantia é, nesse caso, perdida. Não engloba manutenção de risco preexistente (no caso, a não vacinação do segurado), que já deve estar incluída nos cálculos de risco da seguradora, e, portanto, não é causa de agravamento de risco, não podendo servir para exclusão da indenização.
É no âmbito do seguro empresarial que parecem estar os mais intensos debates. Não é infrequente empresas contratarem seguros que cobrem imprevisível suspensão dos negócios. Como se sabe, em função da pandemia, muitas atividades tiveram suas atividades suspensas. É preciso saber se a exclusão de cobertura em caso de pandemia está clara do contrato, ou se a recusa a indenização decorre de disposição genérica, que finda por esvaziar o espírito e razão de ser do contrato (a Suprema Corte Britânica obrigou as seguradoras a cobrirem os danos decorrentes da interrupção de negócios pela pandemia, sob o argumento de que a restrição prevista nos contratos de que o dano ocorresse em um raio de 25 milhas, findava por esvaziar a proteção em casos de pandemia, em violação ao espírito e às disposições relevantes da cobertura). No Brasil, o entendimento parece ser o mesmo, diante de restrições não explícitas, especialmente diante do disposto na Lei de Introdução às normas de direito brasileiro, arts. 5° e 20. Agita-se ainda o tema pela suposta exigência de dano material concreto e tangível. Seria necessário o dano físico, como em explosão de refinaria ou alagamento de planta industrial. O conceito de dano, no entanto, é amplo, e se encontra vinculado à suspensão das atividades, não se exigindo alteração física em instalações empresariais (no mesmo sentido, parece ser a orientação nos Estados Unidos, França e Inglaterra, em conformidade com artigo publicado por Ilan Goldberg, na Conjur). 
O dano decorrente da suspensão de atividades empresariais, quando a cobertura por pandemia não é expressamente excluída do contrato, é concreto e tangível, não havendo como condicionar a indenização a dano físico no local. Em reforço, a Circular da Susep exige que o risco excluído se refira a evento definido e preciso, sem generalidades que não permitam identificar situações concretas (Circular Susep 621/21 e v. tb Circular Susep 560/2017). Desse modo, a indenização pelos lucros cessantes decorrente da interrupção das atividades empresariais pela Covid -19 é devida, se não afastada expressamente a situação de pandemia da cobertura, não podendo ser excluída por suposta ausência de dano concreto e tangível. Por fim, anote-se que a natureza aleatória do contrato de seguro não exime a aplicação da teoria da imprevisão, a incerteza e imprevisibilidade não forem vinculados ao risco garantido e decorrerem de evento posterior à assinatura do contrato. Portanto, em um exemplo, a companhia aérea terá direito à revisão contratual dos prêmios que paga no seguro de suas aeronaves, a fim de reequilibrar o negócio, em decorrência de os aviões não poderem operar normalmente, em função da pandemia, minimizando os riscos de dano. 
Os artigos publicados com assinatura não traduzem, necessariamente, a opinião da TRIBUNA DO NORTE, sendo de responsabilidade total do autor.

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