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Cosme Gregory: ‘O Bolshoi vai me dar todo alicerce’

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Anna Ruth Dantas – Repórter

O bailarino Cosme Gregory é mais um daqueles natalenses que estão fazendo nome e fama fora do Estado e é pouco conhecido no Rio Grande do Norte. Depois de passar pelo Balé Municipal e pela Escola de Dança do Teatro Alberto Maranhão ele alçou novos e grandes voos, se apresentou em Portugal e hoje está no Balé Bolshoi, na filial de Joinvile.

 Cosme Gregory admite que é uma exceção por conseguir sobreviver da dança. Mas se mostra otimista e acredita que o Brasil já começa a dar os primeiros passos para uma valorização maior da cultura. O bailarino se ressente de mais apoio e lamenta que os incentivos sejam destinados prioritariamente para o esporte. “Viver da dança é um privilégio. O Brasil ainda não é um país que cultiva a cultura. É um país de esporte, de futebol, de atletismo, de natação”, comenta Cosme Gregory. 

E o que representa a dança na vida desse natalense? “É a energia que corre no meu corpo, é meu alimento, é meu café da manhã, é meu almoço, meu jantar. Eu acordo e respiro dança, eu durmo respirando dança. Acho que a dança é minha segunda família”, responde, com toda carga de emoção. Aliás, emoção que Cosme Gregory também leva para os palcos onde se apresenta. Um sentimento onde, diz ele, se sobressai o “amor”.  O artista desmitifica o conceito de que o balé é para a “elite”. “A dança está aí para quem quer dançar, independente de ser rico ou pobre. Acho que quem tem vontade, quem acha que tem talento, independente de classe social, tem que ir lá e insistir”, afirma.

O convidado de hoje do 3 por 4 é um natalense simples, um jovem que começa a traçar uma trajetória de vencedor, um bailarino que encanta no palco e na própria força de vontade de buscar construir uma carreira profissional.

Com vocês, Cosme Gregory.
Desde 2007, Cosme faz parte da Companhia Jovem do Balé Bolshoi
Como um jovem natalense sai para brilhar em uma companhia de renome internacional como o Bolshoi? O que foi determinante?
Isso para mim foi tudo muito espontâneo, foi acontecendo comigo.  Acho que sempre tive muito foco no que eu queria. Eu saí de Natal sabendo o que queria, continuar meus estudos de bailarino, aperfeiçoar a técnica clássica para poder ingressar em grande companhia. Hoje faço parte da Companhia Jovem do Bolshoi. Acho que para mim, isso é o princípio de tudo para eu começar a ingressar em grandes companhias. O Bolshoi vai me dar todo alicerce que eu preciso agora.

Quando você despertou para dança?
Eu sempre dancei. Não lembro de nunca ter deixado de dançar. Aos 8 anos fiz curso de dança popular no SESC. Minhas irmãs já faziam balé antes e eu sempre ficava assistindo elas dançando. Então começou aí toda minha admiração pela dança. A partir do curso de dança popular que comecei a fazer foi que entrei no balé clássico. Eu faltava, às vezes, o próprio curso (de dança popular) para ficar vendo a aula das meninas e eu ficava gesticulando com os braços, imitando.

O que é a dança na sua vida?
Dança para mim, costumo dizer para meus amigos que dança é como eletricidade: sem ela a gente não consegue viver. É a energia que corre no meu corpo, é meu alimento, é meu café da manhã, é meu almoço, meu jantar. Eu acordo e respiro dança, eu durmo respirando dança. Acho que a dança é minha segunda família. Para mim a dança é uma família.

Seria um privilégio seu conseguir viver da dança? Poucas pessoas conseguem isso.
Sim. Viver da dança é um privilégio. O Brasil ainda não é um país que cultiva a cultura. É um país de esporte, de futebol, de atletismo, de natação. Se você vai procurar um patrocínio, um incentivo, você diz que é para cultura, para teatro, dança, eles (os patrocinadores) não aceitarão de primeira, mesmo tendo grandes nomes de companhias como Débora Colker, Bolshoi, Grupo Corpo. Primeiro eles vão fechar a cara  para todos eles. O país vive de esporte, o incentivo vai todo para o esporte. Quem sobrevive de dança é privilegiado, com certeza.

Esse cenário traçado por você, mostrando que o Brasil só valoriza o esporte, estampa a “pobreza” do país?
Não. É tudo muito cultural. O Brasil não é um país que observou dança como uma profissão. Hoje em dia já mudou muito, as pessoas já veem o dançarino como profissional, ele tem carteira assinada, tem DRT, então está mudando muito a visão do Brasil. Mas é tudo muito devagar ainda. O Brasil não cultivava isso (o fato do dançarino ser tratado como um profissional).

Não seria o balé uma arte da elite?
Pois é. Daí eu pergunto e o que é do povo? A dança está aí para quem quer dançar, independente de ser rico ou pobre. Acho que quem tem vontade, quem acha que tem talento, independente de classe social, tem que ir lá e insistir. Eu não sou de classe alta, sou de classe baixa. Nasci no bairro das Rocas, já morei na Zona Norte, fui para o Alecrim, meus pais hoje estão morando na Ribeira e é lá que eu fico quando estou aqui em Natal. Minha vida em Natal foi muito corrida, muito sofrida também. Eu estudei em escola pública. Minha mãe colocou eu e minhas irmãs na dança  como uma válvula de escape para gente não ficar na rua mesmo. A gente ia para escola pela manhã, à tarde, íamos para o balé e eu fazia balé e atletismo junto. Saía do balé já correndo para ir para aula de atletismo. Então foi tudo como uma válvula de escape. A população mais pobre que usa a cultura como uma válvula de escape, com certeza, conseguirá coisas maravilhosas.

Você fala na ótica de como ingressou.  Mas hoje o balé que você apresenta não chega para o povo?
Concordo com isso. Daí as companhias tem que ter essa preocupação e levar espetáculo para rede pública. Lá (em Joinvile) nós da Companhia Jovem do Bolshoi sempre fazemos isso. A gente faz dois espetáculos para toda comunidade que não tem condições de pagar, a gente abre as portas, a gente faz aula, coloca figurino, faz maquiagem e apresenta 40 minutos do espetáculo para que eles possam ver o que é o balé. Isso tem que acontecer aqui também. Tem que trazer mais a rede pública para o teatro. Se eles não podem ir para o teatro, vamos levar o teatro e a dança para eles.

Mas as ações de instituições públicas para levar a arte para o grande público ainda são muito pontuais?
Aqui em Natal tem lugares baratos para fazer. A EDTAM só cobra R$ 10,00 para manutenção da escola. Acho que quando procura bem acha lugares baratos para praticar a dança ou qualquer outra coisa.

Algum motivo de frustração pelo fato de ter saído de Natal e ser mais reconhecido lá fora do que aqui?
Não. De forma alguma. Saí de Natal por perceber que aqui não tinha mais como crescer, como aprender mais. Fui para fora a procura disso, a procura de aprender mais, buscar novas experiências, novas técnicas para trazer para cá. Sempre estou aqui, sempre estou fazendo curso de férias, para passar (aos alunos de Natal) o que estou aprendendo fora. Acho bacana isso. O incentivo que tive de Hilneth Correia, que é diretora do Teatro Alberto Maranhão, da Vânia Rose, que é diretora artística da EDTAM, a ajuda que tive delas, do Governo do Estado, da Prefeitura, para que eu fosse para Joinvile, estudar no Bolshoi e ter ido para Portugal. Fui para Portugal com ajuda da governadora (Wilma de Faria). Foi ela que pagou minha passagem. Uma semana antes de viajar eu não tinha passagem. Incentivos assim são maravilhosos.

Mas você é uma exceção?
Realmente. São poucos que conseguem isso. Mas mesmo sendo um dos poucos que conseguiu sair daqui e procurar coisas fora para trazer para aqui, as pessoas devem insistir mais, devem buscar.

Qual sua meta?
Minha meta agora é entrar em uma grande companhia, seja no Brasil ou fora. Meu grande desejo é fazer arte no meu país. Acho que sou muito nacionalista, sou muito brasileiro, sou daqueles que  quer fazer arte no Brasil, aqui que vai acontecer tudo. O Brasil é um berço de talento, de pessoas bonitas, divertidas, de coração quente e faz toda diferença quando dança, quando atua, quando canta. O brasileiro faz com amor, com paixão.

Seria uma nova fase cultural do Brasil?
Sim. O Brasil aos poucos está se descobrindo, um país de cultura, de dança, de teatro, de música. Quando o artista persiste, insiste no que ele quer ele acaba conseguindo. Cabe a nós, artistas, fazer esse movimento e fazer com que a arte cresça e as pessoas vejam, queiram ir mais ao teatro.

Quando Cosme Gregory está no palco o que ele leva?
Levo todo amor que eu tenho, amor que tenho pela minha mãe, meu pai, minhas irmãs, o amor que tenho pela minha cidade, pela companhia que fiz parte durante seis anos. Eu levo muito amor, todo desejo, todas as energias boas, levo junto comigo junto para o palco.

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