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Crédito imobiliário tem reajuste acima de 30% e sufoca os salários dos americanos

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IMOBILIÁRIO - Plano anunciado pela Casa Branca atende apenas um fração dos que hipotecam suas casas

 Por Joe Bel Bruno

NOVA YORK – Quando Domenico Colombo percebeu que o pagamento mensal  da hipoteca da sua casa teria um aumento de 30%, ele teve um quadro claro de  o quão ruim ficaria a situação. O pagamento da sua hipoteca iria ter um acréscimo mensal de US$ 1,500 a partir  de dezembro. Com sua filha indo para a universidade no próximo trimestre, e  o conseqüente pagamento das mensalidades, ele ficou com medo de acabar como  muitos dos seus vizinhos em Fort Lauderdale, Flórida, que viraram inadimplentes  e cujas casas agora estão com uma placa de “vende-se”.

Colombo conseguiu renegociar uma nova taxa de juros para o empréstimo com o  seu banco e agora acredita que está tudo bem – mas o futuro é menos certo para  os americanos. Nos próximos meses, milhões de outros devedores como Colombo terão que renegociar  para mais a recomposição das taxas de juros que pagam por suas casas hipotecadas,  e muitos desses proprietários serão incapazes de pagar as prestações das suas  hipotecas. Muitos não se enquadram no perfil dos mutuários que poderão ter o  reajuste dos juros congelados, em seguida a um plano anunciado na quinta-feira  da semana passada pela Casa Branca.

Apenas uma fração dos mutuários que hipotecaram suas casas e enfrentarão os  aumentos de juros no próximo ano preenchem os requisitos para receber a ajuda  do plano da Casa Branca, anunciado na última quinta-feira. O plano prevê o congelamento  dos juros por cinco anos, mas ele não força as empresas de crédito a fazerem  isso. É voluntário. Bush diz que 1,2 milhão de americanos poderiam ter as taxas  das hipotecas congeladas. Mas o Centro para Empréstimos com Responsabilidade,  um grupo que ajuda mutuários a enfrentarem empréstimos ruinosos, estima que  apenas 145,000 pessoas estariam qualificadas a ter os juros das suas hipotecas  congelados.

Para ter a taxa da hipoteca congelada, é preciso que o mutuário  não esteja com nenhuma prestação atrasada, tenha comprovante de rendimentos  fixos e tenha feito a hipoteca entre 2005 e 31 de julho deste ano. O aumento na inadimplência do crédito imobiliário nesse ano já atingiu as grandes  instituições financeiras, e a persistência e aumento da inadimplência dos consumidores  poderão atingir não só os bancos, mas se espalhar para outros setores da economia  americana.

Ninguém acredita que o pior cenário irá se materializar, mas alguns intuem que  o quadro será muito ruim.  “Nós não tivemos uma retração tão grande assim desde a Grande Depressão,” disse  Bill Gross, chefe de investimentos da Pimco, maior fundo de bônus do mundo.  Ele não sugere a volta de tempos terríveis como os vividos pelos EUA e boa parte  do Ocidente na década de 1930 – mas, como um especialista em crise global de  crédito, ele fala com autoridade. “O efeito disso no consumo, o efeito disso na tomada futura de empréstimos,  são fatores que poderão nos levar próximos ao zero em termos de crescimento  econômico,” ele disse. “Isso tira o meu sono.” Cerca de 2 milhões de proprietários de casas têm atualmente nos Estados Unidos  US$ 600 bilhões em empréstimos de baixa qualidade, os chamados ‘subprime’, com  taxas de juros não fixas, que deverão sofrer reajustes nos próximos oito meses.  O empréstimo ‘subprime’ é concedido a pessoas com histórico ruim de crédito.  Nem todos esses empréstimos apresentam problemas, mas proprietários que vão  à falência ou atrasam os pagamentos podem causar um choque econômico de uma  intensidade nunca vista antes. Algumas das mentes econômicas mais brilhantes dos Estados Unidos traçam um cenário  que se mostra assustador.

A próxima etapa da crise nos empréstimos poderá não  apenas tirar as casas das pessoas que tomaram crédito, poderá também levar a  economia a uma espiral negativa. A já severa queda no mercado do crédito imobiliário poderá ser exacerbada também  pelo maior número de casas que estão à venda no mercado. O aumento da oferta  de imóveis já derrubou os preços em 40% no mercado imobiliário dos Estados da  Califórnia, Flórida e Nevada, que sempre estiveram entre os mais valorizados  dos EUA.

Construtoras como a Neumann Homes, de Chicago, que pediu proteção contra  os credores (concordata) neste mês, poderão desaparecer. Os dez maiores bancos,  que fizeram proteção ao escorar os empréstimos em aplicações exóticas como as  obrigações colaterais de débito (CDOs, na sigla em inglês), poderão sofrer perdas  maiores que os US$ 75 bilhões que já desapareceram neste ano. Perdas maciças de empregos cortarão os gastos no consumo, que responde por dois  terços da economia dos Estados Unidos. O Departamento de Trabalho do governo  americano estima que quase 100,000 postos de trabalho relacionados aos serviços  financeiros e de crédito imobiliário, apenas nos EUA, já não existem mais.

Milhares  de americanos que trabalham diretamente no mercado imobiliário poderão se encontrar  sem empregos. E ninguém calcula como isso afetará as vendas das concessionárias  de automóveis, dos hipermercados e de outros setores do comércio e da indústria. Com base em modelos históricos, um crescimento econômico zero, ou a estagnação,  no Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA, levaria a taxa de desemprego americana  para 6,4%. Isso eliminaria 3 milhões de empregos na economia, de acordo com  uma projeção do Instituto de Políticas Econômicas, de Washington. Em comparação, na crise econômica entre 2001 e 2003, cerca de 2 milhões de empregos  foram perdidos, de acordo com o Departamento de Trabalho.

A crise ocorreu após  o estouro da bolha da internet e os ataques terroristas de 11 de setembro de  2001. Economistas ressaltam que, oficialmente, os Estados Unidos estiveram em  recessão entre março e novembro de 2001, mas o declínio se prolongou até 2003. Existe forte indicação que outro declínio já começou.

Credores que tomaram empréstimos no primeiro semestre deste ano começaram a  atrasar as prestações mais rápido que outros que haviam feito empréstimos em  2006, informa um relatório do banco Friedman, Billings Ramsey, sediado em Arlington,  estado da Virginia. Isso torna mais restrito o crédito a novos credores – uma perspectiva sombria  para as construtoras, e também para as pessoas endividadas que tentam vender  seus imóveis. Chad Raskovich, um morador de Minneapolis que hipotecou sua casa, é mais um  entre milhões que se encontram nessa situação perigosa. Ele esperava – em vão,  percebeu mais tarde – ganhar mais liquidez com a hipoteca da sua casa enquanto  o mercado imobiliário estava em valorização e os juros baixos. Isso permitiria  que ele obtivesse outro empréstimo em condições mais vantajosas no futuro. Mas  o mercado está em queda e a taxa de juros subiu várias vezes.

“Não fui apenas eu, muitas pessoas que conheço estão na mesma. O mercado imobiliário  aqui em Minneapolis mudou de maneira dramática para pior, desde o primeiro ano  em que eu comprei minha casa. Agora, todos procuramos uma solução,” comentou. Colombo, que vive no subúrbio bem planejado e construído de Weston, perto de  Fort Lauderdale, diz que o aumento das prestações da hipoteca da sua casa “arruinaria”  suas finanças. Ele procurou o Centro de Refinanciamento de Hipotecas, um dos  centenas de centros de conselheiros de dívidas que tentam ajudar a desesperados  chefes de família com casas hipotecadas. “Mas muitas pessoas na minha vizinhança não procuraram ajuda, e alguns literalmente  saíram pela porta e foram embora de casa quando receberam os comunicados dos  bancos,” disse Colombo. “Existem mais de 133,000 casas à venda nos condados de Miami, Dade e Broward,  e algumas delas estão realmente abandonadas. As pessoas nessa situação não gostam  de falar sobre isto,” afirmou Colombo.

Quando os preços das casas estavam em alta, os imóveis eram ativos atraentes  para os bancos. Mas o colapso nos preços dos imóveis levou a uma reação em cadeia:  os credores esticam o prazo de pagamento, os devedores passam por um tempo difícil  ao refinanciar os empréstimos e as apólices e ações que escoram as operações  ficam sob ameaça. Isso tem resultado em mais de US$ 500 bilhões de papéis potencialmente sem valor  que estão nos balanços dos maiores bancos do mundo – perdas que poderão atingir  os fundos de pensão e fundos mútuos que também investiram nesses papéis, dos  quais dependem os rendimentos de milhões de investidores e aposentados.

Mais dor espera Wall Street: “Ainda estamos distantes do final do colapso,”  disse Mark Patterson, dirigente da MatlinPatterson Global Advisors, um fundo  de ‘hedge’ (proteção) especializado em fundos. A carcaça do ‘subprime’ poderá superar a última grande crise bancária dos EUA  – a falência de mais de 1,000 bancos de cadernetas de poupança, na década de  1980. A grande diferença é que os problemas naquela época foram contidos e o  governo teve caixa suficiente para tapar o buraco com US$ 125 bilhões.

Mas a crise de agora tem alcance maior, o que alguns especialistas dizem torna  mais difícil debelá-la. O senador Charles Schumer, um importante integrante dos comitês de bancos e  finanças do Senado dos EUA, disse que os devedores são um dos grupos que ainda  precisam de ajuda. Ele afirmou que o dinheiro, no entanto, precisaria chegar  aos necessitados através de organizações sem fins lucrativos e não através dos  bancos. “O cenário é ainda mais dramático e pior porque o financiamento de casas é uma  das chaves da nossa economia. Mais execuções de hipotecas levam para baixo os  preços dos imóveis, o que leva a novas execuções de hipotecas, é um círculo  vicioso,” disse Schumer. Ele reclamou que o critério no plano anunciado por Bush é muito restritivo.  “Existem muitas famílias que ficarão fora do plano e muito da ajuda dependerá  da boa vontade do setor privado. Também não existe transparência que garanta  que as famílias qualificadas receberão a ajuda,” disse. 

O impacto com mais uma nova rodada de perdas no ‘subprime’ permanece como uma  preocupação primordial para os economistas – especialmente porque existe pouca  certeza sobre como isso poderá assediar ainda mais a economia americana. “Todos nós sabemos que mais perdas provocadas por esses empréstimos ‘subprime’  estão a caminho, mas não sabemos exatamente como isso acontecerá ou como evitá-las,”  disse Thomas Lawler, um ex-chefe de empréstimos na Fannie Mae, atualmente consultor  de crédito imobiliário. “Nós nunca nos encontramos antes nesta situação.”

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