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Crise ameaça reeleição de Sarkozy

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André Lachini
Agência Estado

São Paulo (AE) – O desgaste de mais de 15 anos dos governos de centro-direita e a insatisfação do eleitorado francês com a crise da dívida soberana europeia, que não poupou o país, poderão levar o candidato do Partido Socialista (PS), François Hollande, de 57 anos, a uma vitória nas eleições presidenciais da França neste ano, cujo primeiro turno está marcado para 22 de abril. O presidente Nicolas Sarkozy, que tenta a reeleição e anunciou sua candidatura no dia 15 de fevereiro, busca os votos da extrema direita e tenta exibir uma imagem de estadista para conquistar o eleitorado. O quadro eleitoral, entretanto, está longe de estar definido: a candidata de extrema direita, Marine Le Pen, ainda precisa reunir 150 assinaturas de prefeitos e funcionários públicos municipais em cargos de liderança para poder formalizar sua candidatura.
Sarkozy: desgaste político provocado pela crise da dívida soberana europeia
Especialistas em política internacional e analistas econômicos alertam que embora as chances de Marine Le Pen, de 43 anos, chegar à presidência da França sejam remotas, ela poderá forçar um segundo turno contra Hollande, impondo uma derrota ao atual presidente já no primeiro turno. O socialista Hollande, um advogado de uma região rural do centro da França, nunca ocupou qualquer cargo no governo. Se vencer, colocará Sarkozy na lista de líderes europeus que perderam seus postos desde 2010 devido à crise, após Irlanda, Portugal, Grécia, Itália, Espanha, Eslovênia e Eslováquia. Além disso, uma derrota faria de Sarkozy o segundo presidente francês a perder uma reeleição, após Valery Giscard ‘Estaing.

“No atual e difícil clima político e econômico e com base nas últimas pesquisas de intenção de voto, François Hollande parece ter uma forte chance de vencer as eleições presidenciais deste ano”, disse a economista Marion Laboure, do banco Barclays Capital, em análise do final de janeiro. Laboure comenta que embora as pesquisas indiquem que Hollande tem mais de 30% das intenções de voto e Sarkozy tenha estacionado ao redor dos 25%, a disputa irá se acirrar muito em março e abril, antes do primeiro turno da eleição presidencial.

Pesquisa Ipsos realizada na primeira semana de fevereiro e divulgada no dia 15 de fevereiro revelou que Hollande tem 32% das intenções de voto, enquanto Sarkozy aparece com 25%. Marine Le Pen aparece com 16%, e o centrista François Bayrou tem 12,5% da preferência do eleitorado.

Dívida

Enfraquecido, Sarkozy vem tentando se apresentar como um estadista internacional, especialmente após o envolvimento francês na guerra civil da Líbia no ano passado e ao liderar as pressões econômicas e políticas sobre a Síria na Europa. Além disso, sua posição de defensor do euro não foi abalada nem mesmo após a perda da nota triplo A da dívida francesa, em 13 de janeiro, uma sexta-feira, reduzida pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s. O rebaixamento do rating soberano da França foi recebido com silêncio pelo governo. Mas no começo de dezembro Sarkozy teria dito a assessores que “se perdermos o triplo A estou morto”, afirmou o mandatário, citado pela imprensa francesa.

Sarkozy tem o apoio declarado da chanceler alemã Angela Merkel, da União Democrata-Cristã (CDU, na sigla em alemão), aliada da União por um Movimento Popular (UMP), partido de centro-direita de Sarkozy. O apoio de Merkel, entretanto, embora comemorado pela imprensa conservadora alemã, pode ser perigoso. “A fachada de unidade entre os dois pilares da zona do euro (Alemanha e França) parece ter começado a impressionar os mercados financeiros. Berlim e Paris veem o sucesso como consequência do show ‘Merkozy’. A ameaça mais perigosa a essa harmonia é o candidato socialista François Hollande”, escreveu o diário de centro-direita Frankfurter Allgemeine, que criticou o plano fiscal de Hollande.

Reforma fiscal une adversários

São Paulo – No final de janeiro, François Hollande apresentou seu projeto econômico e social, intitulado “60 compromissos para a França”, saindo na frente de seus adversários pelo menos “em termos de transparência e explicação de promessas de campanha”, disse Laboure. No documento, Hollande promete equilibrar o Orçamento francês até 2017, um ano após o prometido por Nicolas Sarkozy. Hollande planeja aumentar os gastos em  20 bilhões de euros e elevar a arrecadação em 29 bilhões no mesmo período, reduzindo o déficit público francês. O socialista também promete uma reforma fiscal profunda e propõe a criação de uma taxa sobre todas as transações financeiras, mas não deu nenhuma – indicação de que vá flexibilizar o mercado de trabalho francês. Atualmente, os franceses trabalham 35 horas semanais e se aposentam aos 60 anos, a menor jornada de trabalho e a menor idade de aposentadoria da Europa, superando até a Itália e a Espanha. O candidato socialista propõe o aumento da idade da aposentadoria dos 60 para 62 anos, mas apenas a partir de 2018.

Já Sarkozy, que apresentou partes do seu plano de governo no começo de fevereiro, incluiu medidas fiscais e trabalhistas na sua proposta. Em anúncio na TV francesa, o presidente prometeu aumentar o IVA – o Imposto sobre Valor Agregado, que incide sobre vendas de mercadorias e serviços (semelhante ao ICMS brasileiro) e propôs a redução de impostos para empresas que contratem jovens. Ao contrário de Hollande, Sarkozy defende vigorosamente o aumento da idade mínima para aposentadoria de 60 para 65 anos. Pelas projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), a economia francesa deverá crescer apenas 0,2% em 2012, após ter crescido 1,6% em 2011. A taxa de desemprego francesa, no entanto, ainda é baixa para padrões europeus, de 9,6% da força de trabalho em dezembro de 2011, mas está em elevação. Nem se compara, contudo, aos 21% da Espanha. A dívida pública francesa estava em 2011 em  1,69 trilhão de euros, ou 85% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2007, a dívida pública representava 64,2% do PIB francês.

“Sarkozy está encurralado. Ele não pode adotar um discurso mais à esquerda, mesmo porque sua rejeição é alta entre parte desse eleitorado e ele dividiria votos com Hollande. Então ele apela para os valores morais franceses, tentando atrair votos da extrema direita. Mas essa estratégia também é perigosa e ele corre o risco de dividir votos com Marine Le Pen”, diz o professor Walter Hupsel, de relações internacionais da Faculdade Santa Marcelina, em São Paulo. Além disso, o apoio declarado de Merkel a Sarkozy deverá prejudicá-lo, alerta. “O francês médio verá isso como uma ingerência da Alemanha, o que dará votos a Hollande”, acredita Hupsel.

No poder há mais de 15 anos, a centro-direita francesa está desgastada, avalia Hupsel. Após assumir o governo em 1995, com Jacques Chirac, a centro-direita continuou liderando em 2002 com a reeleição de Chirac e depois em 2007, quando Sarkozy derrotou a candidata do PS, Ségolène Royal, ex-mulher de Hollande. “Existe um desgaste no discurso da centro-direita. A população francesa está cansada do arrocho econômico”, diz Hupsel. “Sarkozy ataca os socialistas em seu discurso, ao afirmar que a situação fiscal é crônica por causa dos departamentos (províncias), cuja maioria é governada pelos socialistas. Ele também culpa os ciganos, as minorias e os imigrantes, principalmente os argelinos, pelos problemas”, explica Hupsel.

Em 2009, seguindo o exemplo do então conservador governo italiano de Silvio Berlusconi, o governo francês começou a expulsar ciganos romenos e búlgaros da França. Os ciganos têm passaporte da Romênia e da Bulgária, que são da União Europeia (UE), mas os dois países ainda não aderiram ao Acordo de Schengen, o qual permite que cidadãos de um país da UE vivam e trabalhem em outro com todos os direitos sociais e trabalhistas, e não apenas três meses como turistas extracomunitários. Sarkozy, por outro lado, exibiu uma imagem que os franceses atribuíam a um playboy ao participar de festas em iates de empresários amigos e ao separar-se de sua segunda mulher, Cecilia, após ser eleito em 2007, para logo em seguida circular com a cantora e ex-modelo italiana Carla Bruni, sua atual esposa Na época, o casal Bruni-Sarkozy foi fotografado de mãos dadas na Eurodisney, o que foi considerado de gosto duvidoso entre os franceses. Nos últimos meses, o casal Bruni-Sarkozy adotou um perfil mais discreto e evitou mostrar aos jornalistas a filha Giulia, que nasceu no final do ano passado.

A improvável “zebra” da eleição

No caso de Marine Le Pen chegar a um segundo turno, possibilidade tida como remota embora não impossível, haveria uma repetição das eleições presidenciais de 2002, quando o pai de Marine, Jean-Marie Le Pen, fundador da Frente Nacional, ficou em segundo lugar e enfrentou o presidente Jacques Chirac, o fundador da UMP. Assustada com a possibilidade da vitória do partido xenófobo de Le Pen, a população reelegeu Chirac. Atualmente doente e retirado à sua vida privada, Chirac é processado por abuso de poder.

“Marine Le Pen pode ir para o segundo turno, mas não ganha. Os eleitores de Sarkozy votariam em Hollande, caso a disputa seja entre ela e o socialista. Se for entre ela e Sarkozy, os eleitores de Hollande votariam na UMP”, diz Hupsel. Marine Le Pen já chegou a defender que a França deixe o euro, é contra uma maior integração da UE e tem um discurso duro contra os muçulmanos e as minorias. Até 15 de fevereiro, Marine Le Pen não havia registrado sua candidatura à presidência.

Como todo candidato presidencial francês, ela precisa de 500 assinaturas públicas de prefeitos e funcionários públicos municipais graduados (como presidentes de Câmara de Vereadores) para registrar a candidatura. Marine Le Pen teria 350 assinaturas até 14 de fevereiro e fez um pedido ao Conselho Constitucional para que a exigência seja abrandada. O pedido deverá ser analisado no dia 22, segundo informações da Associated Press.

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