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‘Dancin Days’ a pista que abalou o Brasil

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Tádzio França
Repórter

Na metade dos anos 70, a  disco music começava a varrer o mundo com sua onda libertária de groove, prazer e movimento. No Brasil, mais especificamente no Rio de Janeiro, foi em uma pista de dança instalada num shopping da Gávea  que o barato aconteceu. A boate Dancin’ Days, aberta em 05 de agosto de 1976, abalou geral. Atraiu toda uma fauna diversa, louca pra dançar e experimentar sensações que o momento político do país reprimia. A casa noturna marcou época, virou novela e, décadas depois, agora é o espetáculo “O Frenético Dancin’ Days”, que será apresentado sexta e sábado no Teatro Riachuelo.

Musical mostra como uma casa noturna dentro de um shopping inaugurou a chegada da disco music  no Brasil


Musical mostra como uma casa noturna dentro de um shopping inaugurou a chegada da disco music no Brasil

A superprodução ‘clubber’ marca a estreia de Deborah Colker na direção de um musical, e tem texto assinado por Patrícia Andrade e Nelson Motta – o próprio criador dessa balada histórica, 43 anos atrás. No palco estão 17 atores e seis bailarinos, revivendo as festas entre hits da época como “I love the nightlife”, “You make me feel might real”, “Stayin’ alive”, “We are family”, “Y.M.C.A” , entre outros clássicos. No palco, músicas e sons são manipulados por um DJ, Alexandre Elias, exatamente como na época.  Os cenários e figurinos recriam a atmosfera disco, mas com uma identidade própria.

Nelson Motta mistura dados (auto) biográficos e a fantasia do teatro para recontar essa história. “Aquilo era uma ilha de liberdade, onde as pessoas se esqueciam da repressão, do medo, daquele clima horroroso – meio parecido com o que estamos voltando a ter hoje”, disse, em entrevista ao caderno FDS. Acompanhe os compassos do mestre pela música e pelas palavras:

A primeira boate foi criada num espaço destinado a um teatro, dentro de um shopping center. O que explica o sucesso de uma empreitada dessas?
O Dancin’ Days era um espaço de liberdade, de alegria, num momento onde havia uma ditadura instalada no país. O clima ainda estava pesado, apesar de 1976 ser o ano do início da abertura política. Então a gente aparece com um lugar onde 500 a 600 pessoas de todas as classes sociais, profissões, se encontravam pra dançar. Aquilo era uma ilha de liberdade, onde as pessoas se esqueciam da repressão, do medo, daquele clima horroroso – meio parecido com o que estamos voltando a ter hoje. As pessoas saem do teatro cantando, numa felicidade só. A peça também acaba sendo uma ilha de alegria no meio de um atual clima péssimo, onde as pessoas saem na rua e já estão se xingando, se matando. Esse espetáculo é para você sair do mundo real por um dia e entrar em outro, onde só tem músicas maravilhosas e alegria.

Você e a Patricia Andrade escreveram o texto do espetáculo. O que você quis resgatar?

Eu chamei a Patrícia pra escrever comigo, primeiro porque ela é talentosíssima, já trabalhei com ela no musical da Elis Regina, do Simonal, entre outros, e segundo, porque o que eu estava escrevendo acaba sendo muito jornalístico, documental, contando exatamente como foram as coisas, estava chato. Então quando a Patrícia entrou, ela não tinha vivido nada daquilo, ela não tinha compromisso com a história, então criou bastante em cima. Introduziu novos personagens, novas histórias, exageramos algumas coisas, e virou um peça de teatro onde metade é história real e outra é fantasia.

Nelson Motta, o fundador dessa balada histórica, mistura dados (auto) biográficos e a fantasia do teatro para recontar a história da Dancin’Days


Nelson Motta, o fundador dessa balada histórica, mistura dados (auto)
biográficos e a fantasia do teatro para recontar a história da
Dancin’Days

O musical se passa na boate, mas sobre o que é a narrativa?
A história começa na última noite da casa, e em flashbacks vai contando sobre o início da boate, de uma turma de amigos que estavam falidos depois de um festival de rock, e aí são chamados para ocupar um espaço num shopping, e é a última chance de a coisa dar certo. E dá muito certo. É uma história de muito sucesso em muito pouco tempo. A coisa terminou no auge do sucesso, não teve decadência – tenho horror de decadência.

Rolou alguma troca de figurinhas com a Déborah Colker, sobre as coisas que rolaram na boate, os passos de dança, etc. Você deu dicas a ela?
A Deborah é uma das maiores artistas com quem eu já trabalhei, e olha que eu já trabalhei com muitos, hein. Eu já era fã, e ela nunca quis fazer um musical. Ela não se interessava em fazer cópias da Broadway, essas coisas, ela é muito ambiciosa. Mas, por ela ser muito amiga da minha filha, Joana, a produtora do espetáculo, conseguiu convencer a Deborah a fazer. E claro, ela faria o que ela quisesse. Trocamos muitas ideias, sugeri que queríamos algo que parecesse um musical americano, mas inspirado no teatro de revista, nas escolas de samba, mas tudo isso misturado com um repertório brasileiro e internacional, dos grandes hits disco. São canções maravilhosas, com grandes arranjos, todo mundo no elenco canta pra caralho. A Deborah é exigentíssima na escolha dos bailarinos e cantores dela, de um perfeccionismo e inventividade que poucas vezes eu vi.

A trilha sonora é conduzida por um DJ, em vez de banda ou um sonoplasta comum. Por que vocês optaram por esse formato?
Hoje a tecnologia permite que você reproduza todos os sons que quiser. Você consegue o trompete do Chet Baker, o som de baixo do James Brown, a guitarra do Eric Clapton, etc. Tudo com o sampler sai igual ao original. Há a possibilidade de montar uma orquestra, todo digital. Com quatro sopros, cordas, tudo sampleado e licenciado. Teve uma coisa engraçada. O Mazola, um dos maiores produtores do Brasil, viu a peça no Rio de Janeiro, adorou, e veio falar pra mim: “Pô, que banda espetacular, cadê ela?” Ele não percebeu! Hoje em dia, o som que vai para o público é o mesmo do gravado.

O que a Dancin’ Days representou em termo de comportamento e cultura naquela época?
Era totalmente transgressivo. Porque podia tudo, né? Ali dentro não tinha polícia, não tinha vizinho, não tinha nada, era um vale tudo. E era isso que as pessoas gostavam, ficavam totalmente soltas ali, e depois tinham que voltar pra rua, onde eram vigiadas e aí voltavam para aquela vida de desconfiança, insegurança. Mas na boate você estava seguro, livre, podia fazer o que lhe desse na telha.

O desbunde continua no século XXI, mas o que ele tem de diferente daquela época?
É completamente diferente, e ao mesmo tempo muito parecido. Tanto que no final da peça os personagens falam do futuro, sobre a mulher, homofobia, etc., e um personagem que é mais cético  rebate que com o fim da ditadura todos os problemas não serão necessariamente resolvidos, e diz “Quem sabe se lá em 2019 nós não estaremos pior do que hoje?”. E nessa hora o teatro vem abaixo, hahahaha!

Serviço:
O Frenético Dancin’ Days. Sexta e sábado, às 21h, no Teatro Riachuelo. Entrada: R$50 (balcão/frisas), R$120 (camarotes), R$160 (plateia B), R$200 (plateia A).

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