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Democracia e imprensa (2)

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Alexandre Gonçalves Frazão
Promotor de Justiça

No domingo passado, neste mesmo espaço, finalizamos o artigo “Democracia e imprensa” mencionando a dependência, para uma democracia substantiva, da seriedade no uso da liberdade de opinião e de comunicação, notadamente pelos profissionais da área. Tínhamos em mente o problema dos principais vícios que podem permear tal atividade. Para cada um deles, refletir-se-ão sintomas de uma democracia capenga.

Um primeiro grave problema é a cooptação política dos meios de comunicação. Ou seja, quando, sob a casca de veículos de informação, tem-se instrumentos disfarçados de dominação. Por eles, o que se veicula são versões dolosamente manipuladas dos fatos e das ideias, para favorecimento tanto de agentes públicos quanto privados.

O maléfico nesse cenário é o engodo deliberado e orientado para a manutenção ou conquista do poder, não tanto a parcialidade de visão ideológica, ínsita na natureza humana, contra a qual o pluralismo de orientação das agências é o melhor dos antídotos. Quando a notícia é simples instrumento de luta, a mentira graceja e parasita até a morte a liberdade que a permitiu surgir, com prejuízo ao direto à informação do cidadão.

 Trata-se de chaga desgraçadamente comum no Brasil, pela conhecida vinculação de órgãos de imprensa, veículos de televisão e de radiodifusão a grupos políticos tradicionais. Contribui, certamente, como um dos fortes motivos da baixa densidade de nossa democracia.

Extremamente maléfica, igualmente, para a prática democrática, por motivos aproximados aos já citados, é a instrumentalização dos veículos de comunicação para atender a interesses econômicos das próprias estruturas empresariais que deles são proprietárias ou mantenedoras. É o caso, por exemplo, quando notícias são insistentemente publicadas para catapultar anúncios ou induzir ações que, em última instância, sirvam apenas para incremento de lucros de seus próprios veiculadores.

Essa realidade pode ser observada no frequente uso de blogs e colunas em periódicos como forma de, através de insistentes pautas negativas – muitas vezes falsas –, levar o destinatário a oferecer vantagens em troca do silêncio ou de uma linha editorial mais benevolente.

Outro grave mal no exercício da liberdade de comunicação como sustentáculo de uma democracia de qualidade: o desprezo de métodos críticos para a construção da versão de fato levada a público.

As matérias jornalísticas ou análises baseadas em fatos têm que ter uma pretensão de verdade, e isso só ocorre com seriedade pela observância de caminhos para a confirmação de hipóteses de fato. Assim como se dá com investigações em geral que resultam em imputações, as notícias precisam de fontes que as sustentem, bem como das que desconstruam as versões opostas, capazes de emprestar-lhes verossimilhança num ambiente de livre debate e questionamento.

A falta desse método levará a uma comunicação de baixa qualidade. E substituirá a racionalidade, benéfica na exposição de ideias, pela racionalização, ou seja, pela nociva prática de uma construção de uma narrativa que, em que pese coerente em sua lógica interna, não possui raízes na realidade. O resultado serão erros em série, a multiplicação de injustiças e a desinformação. Parece-nos ser um sintoma desse vício comunicacional o jornalismo de manchete, que centra foco na chamada de atenção do leitor, deslizando no conteúdo repassado.

Finalizando, mencione-se, vinculado ao problema anterior, o próprio despreparo dos profissionais da comunicação como um desserviço à qualidade da democracia. Despreparo técnico (ausência de método) e, notadamente, ético, quando o objetivo do profissional transmuta despudoradamente entre informar, tergiversar, enganar e vender.

Sendo a democracia o governo do debate por excelência, há que se duramente combater os vícios acima tratados como indutor de um ambiente público propício a escolhas fundamentais bem orientadas.

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