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Descortinando o infinito

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Os homens ignoram ou esquecem as evidências de sua destinação. A vida proporciona a cada um momentos de silêncio e reflexão, quaisquer que sejam suas circunstâncias: justas ou iníquas, dignas ou aviltantes, ternas ou brutais, pacíficas ou violentas, felizes ou amargas. Esses instantes, infelizmente perdidos e desperdiçados pela grande maioria, apontam o caminho das estrelas, ou seja, do infinito. Libertam o homem de si mesmo. Exorcizam coisas passadas, amarguras, contradições, erros, egoísmos, ressentimentos, indiferenças, vaidades, injustiças, violências e arbitrariedades. Permitem vislumbrar, identificar e assimilar o sentido universal da vida: o amor. É o homem novo, no dizer de São Paulo. Incorporado indefinidamente pelo Cristo à plenitude da Luz: “Eu sou a Luz do mundo; quem me segue não andará nas trevas; pelo contrário, terá a luz da vida” (João 8,12).  Desfrutará com Deus do amor à vida e de tudo que integra a Criação. Esse homem erradicaria, para sempre, a injustiça, a hipocrisia, o cinismo, a crueldade, a miséria, a estupidez, as desigualdades, a desfaçatez e a mentira. Vergonhas que infelicitam até hoje a humanidade. Evidentes no Brasil.
Ernest Renan, em sua “História do Cristianismo”, deplorou as guerras, a desertificação de áreas de agricultura e pastoreio, o desmantelamento de canais de irrigação, a intolerância política e religiosa, que contribuíram para esturricar a Palestina dos tempos de Jesus. O vale do Jordão era paradisíaco. As cidades ribeirinhas do Lago de Genesaré eram modestas, mas desfrutavam de um clima primaveril. Flores e arvores abundantes, parreiras de uvas e fruteiras nas casas emolduravam a Judéia, a Galiléia e a Samaria. Torquato Tasso, no século XVI, na admirável “Jerusalém Libertada”, relatou que, à época da Primeira Cruzada (séc. XII), os europeus se surpreenderam com estigmas e marcas de destruição. Walter Scott, em “O Talismã” e “Ivanhoé”, também descreveu os efeitos dessas lutas. Henry Rider Haggard, em “Cruzada- No reino do paraíso”,  disse que, da planície coberta de flores, acima de Tiberíades ( à margem do Mar da Galiléia), avistavam-se os dois picos da montanha de Hattin, onde Jesus fez o Sermão da Montanha. As flores e a vegetação desapareceram depois que, ali, desenrolou-se a batalha final entre Saladino e os cruzados. Dai seu nome até hoje: “Montanha do Massacre”. Os ódios endureceram o coração e o sentir desses povos até hoje. Os conflitos, que se sucedem sem fim, inviabilizaram a harmonia entre povos e culturas, os quais remontam à aurora dos tempos. Paradoxos da humanidade. 
Quando eu tinha três ou quatro anos, espantava-me o cenário, à noite, da luminosidade de holofotes devassando os céus de Natal. Feixes de luz pareciam não ter fim. A percepção de uma criança ampliava ainda mais as proporções do espetáculo. A Guerra terminara. A explicação: sinais para algum avião que emitira um SOS. A cidade era muito mal iluminada. Dominava-me certa frustração. Já naquele tempo. Pois enquanto não me punham para dormir, encantava-me olhar as estrelas. Com o passar dos anos, adolescente, adulto, agora setuagenário e avô, sempre me arrebato ao contemplar os céus à noite. Com luar ou sem luar. É como se o meu ser tivesse asas, voasse, contemplando e devassando as incontáveis e surpreendentes manifestações da condição humana. Em todos os tempos e lugares. Culturas e nações. Nos campos e nas cidades. Nos vilarejos mais humildes, simples, onde as vaidades inexistem.
Até aos fantásticos e impactantes centros cosmopolitas, onde impessoalidade, solidão e anonimato desfiguram a vida, conspurcando das relações humanas a dimensão e o peso da solidariedade, da caridade e da humildade. Chamo a isso, de mim para mim, de minha janela para o mundo. Sempre a tive. É uma dádiva de Deus. Assim tento perscrutar não apenas o amanhã, mas o infinito. Muitas coisas me fascinam nessas reflexões, que também me remetem para o sentido transcendental da vida, ao inesgotável, ao Universo. Imagino o jovem Davi, extasiando-se com as estrelas nas noites frias e silenciosas de colinas na Palestina. Enquanto pastoreava suas ovelhas, conversava com Deus. Cantava seus salmos. Inebriava a madrugada com os sons suaves de sua lira e de sua voz. Antoine de Saint-Exupéry, Thomas Merton e Teilhard de Chardin reafirmaram algo que os homens, em sua estupidez, persistem ignorar: a vida, somente se desvenda plenamente com amor e paz de espírito. Há dentro da alma humana um universo de sentimentos, sonhos e aspirações susceptíveis de incorporação à própria consciência. A ciência, destituída dessas percepções, jamais alcançará a Luz: privilégio dos justos e humildes de coração. A dimensão cósmica do amor.
Anatole France, em “Crainquebille”, e François Mauriac, em “O Deserto do Amor”, ambos Nobel da Literatura, vaticinaram a crise atual. Deploraram o desamor e a falsidade, que germinam decadência e desencanto. Anteviram o declínio de ideais políticos, que emergem das origens da cultura ocidental.
 
Refiro-me à recentíssima pesquisa de âmbito universal, feita por instituição sueca, denunciando erosão no culto a ideais como liberdade, privacidade, controle e repressão de todos os meios de destruição do meio ambiente, rearmamento e privação de saúde, educação, segurança e informação de maioria da humanidade. O sr. Donald Trump e outros pisotearam sagrados princípios da civilização. Enquanto o mundo enfrenta as consequências. Até quando?
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