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Dissecando gigantes

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Ramon Ribeiro
Repórter

Depois da repercussão em cima da mais recente escultura do artista visual Guaraci Gabriel, “Pé de Mangue” – um goiamum gigante exposto em frente à Pinacoteca do Estado, alvo de pichadores na semana passada – agora os natalenses, especialmente os próprios pichadores do seu trabalho, terão a oportunidade de conhecer o que envolve a criação de não apenas essa obra, mas de uma dúzia das mais marcantes entre as esculturas de grande porte que projetou na paisagem urbana. Essa é a proposta da exposição “Os 12 Trabalhos”, que será aberta ao público na próxima quinta-feira (4), a partir das 18h, na Galeria Sesc Cidade Alta.
Erguida em Ipanguassu-RN, Colibri se destaca pela complexidade e senso ecológico
Artista reconhecido internacionalmente, Guaraci valoriza o processo de criação como a etapa mais importante no trabalho – mais até do que a obra finalizada, A exposição é a oportunidade que tem de revelar ao público essa construção. O artista preparou um vasto material para expor, desde maquetes, vídeos, fotos, croquis, rascunhos, tudo montado com olhar poético, mostrando o que há por trás de peças como “Colibri”, “Boca da Noite” e “Guerra e Paz” – registrada no Guinness Book como maior escultura feita de material reciclado do mundo. “É na montagem que os meus trabalhos apresentam movimento”, contou ao VIVER.

Guaraci começou nas artes na década de 1980. Seus primeiros trabalhos foram de pintura, resultado dos estudos no ateliê da ETFRN, com o saudoso artista Thomé Filgueira. Nesse período fez esculturas, mas em formato pequeno, usando argila. Depois ele passa a se dedicar a outras linguagens, como instalações e performances.
Esboço da recente obra “Pé de Mangue”, o primeiro projeto itinerante de Guaraci Gabriel
Em meados da década de 1990, retoma a escultura, dessa vez explorando grandes dimensões. Sua primeira obra dessa nova fase é “Crucifixo Coação em Cristo de Escape”, de 1996, na Via Costeira, onde usou estruturas de metal, cano de escape de carros e carcaças de duas brasílias. “Acho a mais bonita das minhas esculturas”.

Primeiro foi a argila
O artista explica que a ideia de trabalhar com metais tem a ver com uma insegurança antiga sua. “Minhas esculturas de argila acabavam quebrando em algum momento. Com metais realizei trabalhos que resistem mais ao tempo”. Outro importante aspecto de suas esculturas gigantes é o fato delas estarem fora das galerias, envolvidas com a cidade, diante dos olhos de qualquer cidadão. “O entorno onde a obra vai ser montada é um dos elementos principais do meu trabalho. Isso é pensado já no pré-projeto. Levo em consideração a iluminação do lugar, como fica à noite, durante o dia, que elementos próximos podem se comunicar com a escultura”, comenta.

Já os grandes formatos servem para mostrar a pequenez do ser humano no mundo. “Somos insignificantes diante da natureza. Eu me anulo diante da minha obra”. Mas ele ressalta: “Minha visão de arte independe do tamanho do trabalho. O importante é a mensagem, e ela é passada não importa a estrutura e as dimensões do projeto. Para mim o papel da arte é despertar o ser. A arte é uma chave de libertação. Tem muitas coisas trançadas na sociedade e a arte pode abrir isso”.

Guaraci afirma que a realização de seus trabalhos não seriam possíveis sem o apoio e patrocínio do Grupo Compal, Metal Aço e Geraldo Patrocínio. “Temos muitos outros artistas talentosos no RN. O que falta para eles aparecerem mais é apoio. Eu tenho essa parceria com que me ajuda a viabilizar os trabalhos. Acredito que outros artistas contando com patrocínios também produziriam mais”.
O Crucifixo de Escape ganhou o mundo nos anos 1990
Novos conceitos
“Pé de Mangue” marca um novo passo em suas obras gigantes. Antes sempre estáticas, em local fixo, com o goiamum Guaraci trabalhou o movimento na escultura pronta, por meio da itinerância, planejando a obra para ser instalada em diversos pontos da cidade. “A itinerância amplia o contexto da escultura ao fazê-la dialogar com diferentes ambientes. Era algo que sentia falta no meu trabalho e experimentei agora”. Ainda em exposição na Pinacoteca do Estado, o goiamum depois partirá para Via Costeira, Viaduto de Ponta Negra, Ponte Newton Navarro, permanecendo sete dias em cada local, até chegar em definitivo no bairro Nordeste, próximo ao mangue.

Depois da itinerância, outro conceito que Guaraci quer trabalhar em suas esculturas de grande porte é a interação com o público. Quanto a isso ele diz já ter um projeto em andamento, mas não dá maiores detalhes. Ele informa apenas que a ideia é montar um polvo gigante para dialogar com grupos de uma comunidade local.

Provocar impacto
Para a jornalista e artista plástica Rejane Cardoso, uma das maiores marcas de Guaraci Gabriel é a capacidade de provocar impacto com suas obras, algo raro de ver em muitos artistas locais. Entre 1993 e 1996, Rejane foi a diretora da Fundação Capitania das Artes (Funcarte). Desse período ela lembra algumas ações do artista em exposições promovidas pela instituição. “Naquela época ele já usava elementos enormes, de difícil manuseio, como pneus de aviões, cordas grossas de navio. Ele fazia questão de expor dentro da galeria, mas para isso era preciso estudos técnicos para saber se o piso do espaço tinha condições de aguentar a obra”, recorda.

Em outra ocasião ela conta que para fazer o cartaz de divulgação de uma exposição Guaraci pediu liberação para usar as instalações da Funcarte. “Ele posicionou uma geladeira velha e sentou em cima, nu, de frente para a avenida. Era uma época em que Natal ainda não estava acostumada para essas coisas”. Apesar do impacto de algumas obras de Guaraci, Rejane vê que muitas pessoas não fazem leituras para além da obra física. É algo que ela sente principalmente nas redes sociais. “As pessoas esquecem de comentar sobre o conteúdo conceitual e as metáforas do trabalho do Guaraci”.

Serviço:
Vernissage da exposição “Os Doze Trabalhos”, de Guaraci Gabriel. Quinta-feira (4), às 18h. Galeria Sesc Cidade Alta (Rua Cel. Bezerra, 33, Cidade Alta). Visitação: até dia 09 de setembro (9h às 19h). Acesso gratuito.

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