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Duas joias do sítio histórico ganham revitalização

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Yuno Silva e Tádzio França – repórteres

Patrimônio histórico significa memória e identidade cultural, e o casario da Cidade Alta e da Ribeira é testemunha de um passado recente preservado (na medida do possível) pelo tombamento proposto pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional do RN (IPHAN-RN). Desde 2010 Natal passou a ser a primeira, e até agora única, cidade do Estado que tem seu centro urbano devidamente reconhecido como patrimônio, e em breve duas construções com mais de 100 anos cada estarão em plena atividade.

De traços arrojados, o prédio da av. Duque de Caxias começou a ser restaurado e será o novo IphanA primeira é o edifício onde funcionou a antiga estação ferroviária federal Sampaio Correia e foi utilizado como escola pública, nas Rocas, hoje sob a guarda do DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas), está praticamente pronto para abrir as portas como nova sede da instituição; já a segunda edificação, um casarão situado no número 159 da avenida Duque de Caxias, quase esquina com a Tavares de Lira na Ribeira, o antigo Instituto do Açúcar e do Álcool, começou a ser restaurada pelo IPHAN-RN agora em janeiro e até o início de 2013 deverá abrigar a administração e a divisão técnica do Instituto. As obras não tem nada a ver com a propalada revitalização da Ribeira, trata-se tão somente de iniciativas isoladas protagonizadas por órgãos públicos federais.

Sobre o casarão na Duque de Caxias, Heliana Carvalho, arquiteta, chefe da divisão técnica e superintendente substituta do IPHAN-RN, informou que a primeira etapa (orçada em R$ 350 mil) já foi iniciada e a previsão para conclusão das obras de restauração da estrutura física é de seis meses. “Os recursos são próprios do IPHAN/Ministério da Cultura, e nossa intenção é que a obra não seja paralisada em nenhum momento para cumprirmos a meta de transferir o setor administrativo e técnico até o início de 2013.” O valor para executar a segunda etapa, inclui instalações elétrica e hidráulica e compra de mobiliário, ainda não foi definido pois “depende da publicação do orçamento federal.”

#ALBUM-3238#A guarda provisória do casarão foi concedida ao IPHAN-RN pelo Patrimônio da União, mas o “processo para doação e transferência definitiva já está tramitando” pois foi há recursos garantidos para executar o projeto.

Construída no início do século 20 (a data correta ainda não foi confirmada), o imóvel pertenceu à família Fortunato Aranha até meados da década de 1940. De acordo com informações apuradas pela do Instituto, em 1947 foi objeto do processo de herança da família, em 1953 o local abrigou a Importadora Severino Alves Bila e em 1968 passou a ser propriedade da União. A partir de então sediou o Instituto do Açúcar e do Álcool até 1990 e, entre 1994 e 1997 a Fundação de Apoio ao Estudante. Nessa década, o prédio – já em decadência – ainda serviu como depósito utilizado pelo Poder Judiciário.

Por sua vez, a sede do IPHAN-RN na rua da Conceição, na Cidade Alta, servirá para atendimento ao público e interação com a comunidade através de exposições.

Em 2011, os dois principais trabalhos do IPHAN-RN foram a restauração do Sobradinho onde funciona o Museu Café Filho (reabertura agendada para o mês de março) e a casa onde funciona o Memorial Oriano de Almeida, anexo do Instituto Histórico e Geográfico do RN também na rua da Conceição. “As duas únicas obras recentes do IPHAN aqui no RN são a restauração (já concluída) desta casa, na Cidade Alta, que serve como sede da instituição; e a recuperação do prédio na avenida Duque de Caxias, na Ribeira.”

No interior, o processo em andamento de maior destaque é o de tombamento da segunda imagem de Sant’ana, em Caicó, justamente a que percorre a cidade no andor durante a festa da padroeira – vale ressaltar que o evento religioso acontece há 263 anos naquela cidade e foi reconhecido em julho de 2011 como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. Quanto a imagem primitiva, a original, já estava tombada.

ESTAÇÃO SAMPAIO CORREIA INAUGURA EM MARÇO

Após dois anos de meticulosos trabalhos de restauração, um dos prédios históricos mais bonitos de Natal está prestes a voltar à ativa. A antiga Estação Ferroviária Federal Sampaio Correia –  palacete neoclássico de 1906 instalado nos limites da Ribeira – está na reta final de recuperação para abrigar a sede estadual do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas – DNOCS. A previsão é de que entre março e abril deste ano o prédio já esteja em funcionamento. 

Com a obra quase pronta, Palacete da Estação Sampaio Correia reabre en março e será o DnocsO imóvel localizado na Esplanada Silva Jardim foi tombado pelo IPHAN-RN em 1987, e cedido ao DNOCS pelo Patrimônio da União através de Contrato de Concessão de Uso, com a finalidade de ser adequado para funcionar como sede da coordenadoria do departamento,  preservando todas as características originais do prédio. Foi pré-requisito do edital de licitação que a obra deveria ser conduzida por um engenheiro qualificado na área de restauração. O trabalho foi orçado em 1,5 milhão de reais.  

“A preservação dos itens remanescentes do prédio foi a parte mais importante do trabalho”, afirma Alcio Pereira, o engenheiro responsável pela obra. Ele define o serviço basicamente como “artesanal”, mesmo com todas as adaptações de instalações elétricas e hidráulicas necessárias para que o imóvel possa funcionar com sua nova função. “Os materiais novos que utilizamos foram escolhidos de modo a respeitar a integridade e a autenticidade da edificação. A intenção foi integrar o novo ao antigo”, explica.

PEÇAS ENCONTRADAS EM OLINDA

O serviço de recomposição foi bastante detalhista, segundo Alcio Pereira. Incluiu ladrilhos hidráulicos policromados;  azulejos portugueses com trabalhos em alto-relevo; as esquadrias das portas e janelas do prédio, que por serem feitas de pinho de riga – madeira nobre não existente mais hoje em dia – tiveram que ser restauradas. A bela escadaria de ferro exigiu um trabalho extra: algumas peças foram garimpadas em lojas de demolição em Olinda, como partes de ferro fundido, parafusos decorativos e peças de fixação. A calçada do edifício também foi toda refeita. “Evitamos a imitação a imitação do antigo, preferimos recompor”, completa. 

Segundo o coordenador estadual do DNOCS, José Eduardo Wanderley, as obras foram atrasadas não só pelo serviço detalhista da restauração, mas também por entraves burocráticos da prefeitura. “Exigiram que pagássemos até uma ‘taxa do lixo’, atrasada por 15 anos, além de várias licenças”, diz. José Eduardo conta que a velha estação estava em completo abandono, depredada, sem

manutenção e insegura. “Tivemos que contratar segurança, pois os marginais tomavam conta do local”. Foram comprados novos móveis e refeitas as instalações. “Complementamos muita coisa fora do orçamento”, diz.

O prédio de arquitetura neoclássica foi inaugurado no dia 13 de junho de 1906, com a função de ser o escritório da Estrada de Ferro Central do Rio Grande do Norte. Projetado pelo engenheiro Sampaio Correia, possui uma larga extensão horizontal, tendo a grande torre quadrada ao centro. No dia de sua abertura, recebeu a presença ilustre do presidente da república Afonso Pena.

Durante a solenidade aconteceu a primeira viagem partindo de sua plataforma, rumo a Ceará-Mirim, tendo como passageiros figuras como Tavares de Lyra, Carneiro Costa, e o próprio presidente. A estação só recebeu o nome de seu criador na década de 50. À medida que os serviços ferroviários foram se tornado secundários, a velha estação foi sendo esquecida. O prédio foi transformado numa escola pública que funcionou até a década de 90. A pacata área residencial em sua volta tornou o prédio quase invisível. Apesar de imponente, as pessoas mal notam sua existência. Espera-se que com a revitalização, a velha estação possa ser vista e admirada como antigamente.

BOA PARTE DOS IMÓVEIS TOMBADOS SÃO DE PARTICULARES

Natal é a primeira cidade do RN que teve seu Centro Histórico tombado. Ao todo são cerca de 550 imóveis localizados na área chamada Poligonal de Tombamento (Ribeira e Cidade Alta), onde “a fiscalização é bem mais rígida que na ‘Área de Entorno’, onde avaliamos flexibilidade no perfil de ocupação”, disse Heliana Carvalho, arquiteta e superintendente substituta do Instituto. A grande maioria dos imóveis, segundo Heliana, é de particulares e “a responsabilidade de conservação e restauração é deles. Ser tombado pelo IPHAN não significa dizer que iremos cuidar dos imóveis.”

Casario da rua Dr. Barata e os contrastes entre a conservação das construçõesHá cerca de uma década, os tombamentos eram voltados mais para sítios históricos homogêneos, e a justificativa para tombar parte dos bairros da Cidade Alta e Ribeira foi embasada em três frentes: a preservação do traçado urbano, a existência de diferentes estilos arquitetônicos (colonial, barroco, neoclássico, moderno) e a relação com o rio Potengi. Questionada sobre essa relação da cidade com o rio e o fato das construções estarem todas de costas para ele, a arquiteta informou que “a característica da cidade é essa desde o início da ocupação urbana. O rio era muito mais ligado à questões comerciais do que de lazer.”

Concedido provisoriamente em julho de 2010, e aprovado pelo conselho do IPHAN em Brasília no mês de dezembro do mesmo ano, Natal agora aguarda trâmite burocrático no MinC para ser registrada definitivamente no livro de tombamentos com perfil Histórico, Etnográfico e Paisagístico. “São várias as categorias de tombamento, Olinda (PE) e Ouro Preto (MG) por exemplo, estão no livro de tombamento arquitetônico de Belas Artes”, explicou Heliana. Na região do Seridó, ela ressalta a existência de cidades que merecem um olhar cuidadoso do IPHAN-RN. “Mas neste momento não temos nenhum processo (de tombamento de centros urbanos) tramitando. Temos que verificar que a equipe da divisão é pequena: somos duas arquitetas, um engenheiro e um arqueólogo.”

Segundo Heliana, proprietários de imóveis tombados pelo Patrimônio Histórico podem pleitear incentivos fiscais para restaurar as edificações. “Há uma lei no município que normatiza os incentivos fiscais, e os trâmites precisam correr com supervisão da Semurb – o IPHAN, nesses casos, avalia se o projeto preserva o patrimônio.” Outro incentivo apontado pelo IPHAN é a facilidade para se conseguir recursos através de uma linha crédito especial a juros baixos e prestações a perder de vista. “O Nordeste é uma região privilegiada nesse sentido, pois o Banco do Nordeste (BNB) é o agente financeiro. Mas, apesar da verba existir no IPHAN federal, a Prefeitura tem que ter uma equipe qualificada para gerenciar esses recursos.”

ARPEGE PODERÁ SER UM PRÉDIO RESIDENCIAL

O Clube da Arperge, que já foi destino certeiro àqueles que buscavam um pouco de diversão e prazer no coração do histórico bairro da Ribeira até os anos sessenta, está em pé por um mero capricho da engenharia. Tombado pelo Patrimônio Histórico, o prédio é uma das maiores construções da rua Chile, com três pavimentos, e há quatro anos quase veio abaixo devido o desmoronamento de um galpão vizinho.

Antigo Clube da Arpege está em ruínas mas tem comprador interessado.O Clube, ou Boate, como prefere chamar Francisco Pereira, 70, não funciona há mais de uma década (o Arpege fechou oficialmente no final dos anos 90, com direito a festa de despedida). “Quando fiz 18 anos, antes de me apresentar no exército vim tomar minha primeira cerveja. Morava aqui nas Rocas e vim com meu amigo Braz da Padaria”, disse.

NEGOCIAÇÕES

Mesmo em condições lastimáveis de conservação, o prédio está sendo negociado pelo empresário José Roberto, sócio em uma peixaria. “Dona Lúcia (que mora no Rio de Janeiro) ficou de vir a Natal agora depois do Carnaval para resolvermos isso. Minha intenção é recuperar o prédio, de acordo com as normas determinadas pelo IPHAN-RN, e ocupar”, disse Roberto. Na parte de cima ele pretende criar apartamentos (kitnets) para aluguel, e no térreo ocupar com alguma atividade comercial.

Porém, antes de qualquer movimentação de cimento e tijolo no local, será preciso destravar o processo que corre na justiça responsabilizando o proprietário do galpão vizinho que desmoronou e afetou as estruturas da Arpege e de outro edifício.

Há quatro anos seu Chico Pereira toma conta do espaço e vê com tristeza a deterioração do prédio. “Aqui no térreo”, disse à reportagem do VIVER olhando ao redor, “funcionava a tipografia de Nestor Galhardo, e nos dois andares de cima era a Arpege. Era uma Boate que tinha até mulher morando. Foi um cabaré famoso!”, confessa. Atualmente não mora ninguém no local, afinal a estrutura precisa ser totalmente restaurada para reerguer o prédio – os problemas físicos são visíveis: no térreo, o teto corre risco de desabar com o peso de uma caixa d’água que caiu do segundo andar na época do desmoronamento; e parede do lado direito está demolida.

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