sexta-feira, 19 de abril, 2024
32.1 C
Natal
sexta-feira, 19 de abril, 2024

Elis Regina: a caminho do sol

- Publicidade -

por Francisnaldo Borges (*)

Elis Regina Carvalho Costa nasceu em 17 de março de 1945, em Porto Alegre-RS. Estreou  na Rádio Farroupilha, no programa infantil, do Clube do Guri.

Elis Regina: a caminho do solOs brinquedos e demais proezas infantis; menina coberta de dengos maternais: trajes variados, cabelos adornados e o piano (cor-de-rosa) no quintal. O cotidiano soprou musicalidade à vida de Elis: aplausos dominicais levaram-na a enfrentar as primeiras plateias; às vezes, na hora do almoço, com a família reunida e mais tarde em programa de auditório, sem maiores pretensões. Adolescendo o canto a voz tornou-se promissora e estreou no rádio, mas estudar era prioridade, exigência, impasse: o vermelho não podia se acender no boletim nem a aspiração musical podia apagar-se de seus planos.

O rádio espalhava grandes vozes nacionais e sedutores boleros latinos. Ângela Maria influenciou-a diretamente e seu canto começou a despontar vinculado a palcos locais, sinalizando, definindo a cantora que parte. “Vida de Bailarina” (1954), gravada pela Sapoti, é relançada pela Pimentinha, no LP Elis (1972). Em 1961 desponta o primeiro disco, adubando esse desabrochar da carreira de Elis, que exibindo um disco de Eydie Gourme, sentenciou a Carlos Imperial, de quem gravara duas faixas: “Meu próximo disco eu quero assim”.

Fazeres escolares engavetados, curso sem conclusão, vestidos na valise, estrada de setas: avista “os Dedos de Deus”. E, no Beco, em Copacabana deu de cara com as feras da noite, desafiou os valentes, desbravando o Rio. Mas um dia pensou em voltar à vida quieta de Porto Alegre, enterrando o projeto musical e exumando a escolaridade. Mas o jornalista Renato Sérgio encorajou-a e os ensaios se fortaleceram – pôs-se a cantar “num bar em troca de pão” –, partindo para apresentações mais sólidas, contrariando as expectativas dos produtores bossanovistas. “Eu tinha os olhos de espanto e o coração aberto demais” – disse mais tarde sobre sua inclusão carioca.

Em pouco tempo a TV Record presenteou-a com “O Fino da Bossa”, que fora seu primeiro e grande momento na televisão, ao lado de Jair Rodrigues; ofuscado pelo sucesso paralelo da Jovem Guarda, veio a declinar. A emissora buscando reabilitar o programa, convida Bôscolli à direção, conflitando-a: olhares fuzilantes, testemunha indesejável, ironia do destino. Mas ele sabia iscar anzol e fisgar mulheres. “Conversando no bar” olhares acomodam-se à meia luz, destilam-se palavras e ressentimentos: o amor, enfim, pacificava os inimigos.

E, da mansão “marroquina”, a visão paradisíaca do mar azul-turquesa de São Conrado, cravejado de ilhotas: a cerimônia de casamento aconteceu sob esse cenário e os dois não estavam nem aí a falatórios gerais.

O produtor adicionou traços urbanizados à cantora – entendia de moda, estrelato –, mas ela continuou assoviando, discos (voadores) arremessados sobre à Avenida Niemeyer. E as trivialidades somadas às severidades os separaram. Elis não era fácil porque desafiava o difícil, literalmente. Quando cantava “Quaquaraquaquá” escancarava o sorriso, parecia mandar um recado irônico e desafiador… Ria e chorava mais.

César Mariano abrilhantou a carreira da artista por toda a década de 70, na eclosão da modernidade musical. A casa da serra da Cantareira era o pedestal da paz: despontar de luas, ar sem diesel, inventos caseiros. “Quero a floresta em lugar da cidade…” Tocando as coisas simples instalava-se no cotidiano rural e pacificava-se, depois da explosão de Falso Brilhante. E, no entanto, a montagem de Trem Azul foi feita sem o pianista. Elis tinha, também, que conectar os trilhos da vida, mas este trem apressado, descarrilou… Encantada com a invenção de cantar, en(cantou)-se? “Cantar era buscar o caminho que vai dar no sol”.

(*) O autor é natural de Nova Palmeira-PB, tabelião, poeta, cronista, escreveu Imagens Eternas e Reluzir (poesias). Fará em breve exposição de Elis Regina, com seu acervo, no Nalva Café Salão, Ribeira, antecipando os 30 anos da morte da cantora.

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas