Renata Moura,
*Andrielle Mendes e
Sara Vasconcelos
Editora e repórteres
O resultado do leilão do aeroporto de São Gonçalo do Amarante – realizado ontem na sede da BM&FBovespa, em São Paulo – mostrou, na avaliação do ministro chefe da Aviação Civil, Wagner Bittencourt, que o mercado recebeu bem o novo modelo de concessão desenhado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). O consórcio vencedor, o Inframérica, composto pela brasileira Engevix Engenharia e pela operadora argentina Corporación América, deu lance de R$170 milhões pela concessão do novo aeroporto, o primeiro a ser incluído no Plano Nacional de Desestatização, e acabou vencendo a disputa. O valor oferecido pelo consórcio foi três vezes maior que o lance mínimo estabelecido para o leilão (que foi de R$ 51,7 milhões).
O leilão começou às 10h02 e durou aproximadamente 50 minutos. Ao todo, quatro consórcios se habilitaram para a disputa: consórcio Aeroportos Brasil (composto pela empresas MPE e Instituto de Transportes Aéreos do Brasil); consórcio ATP Contratec (composto pelas empresas Triunfo e FCC Construction); consórcio Aeroleste Potiguar (os nomes dos componentes não foram divulgados) e consórcio Inframérica (composto pela Engevix e pela Corporación América). Dos quatro, três apresentaram proposta inicial acima do lance mínimo. E apenas dois, o Aeroportos Brasil, com lance de R$75 milhões, e o Inframérica, com R$132,5 milhões seguiram para o leilão de viva voz, a segunda e decisiva fase da disputa. O valor das propostas e a ‘pequena’ diferença entre as ofertas credenciaram os dois consórcios para a etapa.
Em poucos segundos, o leilão, disputado lance a lance pelos investidores, ultrapassou a marca de R$150 milhões. Já nos últimos minutos, o Aeroportos Brasil ofereceu R$166 milhões pela concessão. Poucos segundos antes de terminar o tempo para novas ofertas, entretanto, o Inframérica apostou mais alto: subiu a proposta para R$170 milhões e arrematou o aeroporto.
Próximos passos
O processo, porém, não termina com a realização do leilão. A Anac analisa agora a documentação entregue pelo consórcio vencedor e só divulga em outubro se o Inframérica assumirá realmente as obras e operará o aeroporto de São Gonçalo do Amarante. Até lá, também será aberto prazo para recurso por parte das demais concorrentes. Se não houver nenhum entrave, o contrato será assinado no dia 21 de novembro. A concessão terá prazo de 28 anos – três poderão ser voltado à construção do empreendimento e 25 para explorá-lo. O contrato pode ser renovado por mais cinco anos.
A governadora Rosalba Ciarlini, que viajou a São Paulo com representantes das classes produtivas do estado para acompanhar o leilão do aeroporto, cobrou ao consórcio vencedor que a obra fique pronta antes da Copa. “Esse investimento é fundamental para nosso estado”, disse.
[*Enviada especial a São Paulo ]
Empresa terá opção de parcelar valor da outorga
O valor que a empresa ofereceu pela concessão – o chamado valor de outorga – deverá ser pago à União a partir do 37º mês do contrato (ou seja, após o prazo de três anos previsto para a construção do aeroporto), independente do início da operação. O pagamento poderá ser feito em até 25 prestações anuais, com possibilidade de quitação antecipada e pagamento à vista – opção que deverá ser informada pela empresa até a data da assinatura do contrato.
De acordo com estimativa da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) o consórcio vencedor também deverá desembolsar R$ 650 milhões para construção dos terminais e operação do aeroporto.
Em carta enviada à Anac, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) se mostrou disposto a analisar um possível apoio aos investimentos relacionados ao empreendimento, nos termos das políticas operacionais que estiverem vigentes à época da aprovação de um possível pedido de financiamento a ser apresentado pelo futuro concessionário.
Atualmente, entre as condições estariam: até 70% dos investimentos financiáveis, podendo alcançar até 90%; e prazo máximo de pagamento de 240 meses, sendo até 48 meses de carência e até 192 de amortização.
Para lideranças, resultado mostra que projeto é viável
O ágio registrado no leilão do Aeroporto de São Gonçalo do Amarante, ou seja, a diferença entre o lance inicial e o lance vencedor, que chegou a 228,82%, ajudou a provar a viabilidade do negócio – questionada por grandes grupos que desistiram de entrar na disputa – disseram ontem lideranças empresariais e políticas do Rio Grande do Norte.
Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado (Fiern), Flávio Azevedo, o resultado desmentiu a tese defendida por grandes operadoras de aeroportos estrangeiras – como a alemã Fraport e a mexicana GAP – de que São Gonçalo do Amarante não é bom negócio. Ele reiterou que o argumento foi usado como uma tentativa de “sabotagem” ao projeto potiguar, em benefício de outros aeroportos que também serão concedidos à iniciativa privada, em Brasília e São Paulo.
“O anúncio das outras privatizações poderia ter ficado para depois. Como não ficou, algumas empresas pensaram “Por que eu vou investir agora se posso guardar o dinheiro para disputar o leilão de um aeroporto mais rentável, que já está funcionando, que já tem fluxo de caixa?”, observa. A ausência das gigantes, na opinião dele, não prejudica, entretanto, o projeto, considerando que o consórcio vencedor “é do ramo”. “O aeroporto pode não ser do tamanho da vontade de lucro das super empresas, mas com certeza foi provado que é economicamente viável”, disse ainda, acrescentando esperar que não haja demandas judiciais envolvendo o leilão. “Se isso acontecer (se houver recurso por parte das demais concorrentes), vamos esperar que a justiça se pronuncie da forma mais rápida possível”.
Surpreendendo
O lance de R$ 170 milhões, feito pelo consórcio Inframérica, superou todas as expectativas, avaliou o ministro da previdência social, Garibaldi Alves Filho, durante o seminário Motores do Desenvolvimento, promovido ontem pela TRIBUNA DO NORTE e parceiros.. “Agora é hora de pensar no próximo passo. De começar as obras o mais breve possível, para estar em operação para a Copa do Mundo de 2014”, disse. O senador José Agripino Maia também ressaltou que o ágio registrado no leilão demonstra a viabilidade do aeroporto e lembrou que definido o ganhador, o estado deve fazer sua parte, com a infraestrutura de acesso ao aeroporto.
O potencial do empreendimento para ajudar a desenvolver a economia também foi ressaltado. O superintendente do Serviço de Apoio à Micro e Pequena Empresa, Zeca Melo, fez coro. E disse que a entidade irá trabalhar junto ao Sebrae nacional para mapear as oportunidades de negócio para micro e pequenas empresas durante as obras e também depois, na fase de operação do empreendimento. “O aeroporto muda a nossa competitividade em relação a atracão de investimentos e oportunidades de novos negócios”, analisa.
O resultado do leilão também foi comemorado pela ex-governadora Wilma de Faria. Foi na época em que estava à frente do governo, que começou-se a discutir e ganhou corpo a movimentação em direção à privatização do aeroporto. “Houve muitas barreiras ao longo desse caminho, mas felizmente temos agora esse desfecho”, disse Wilma.
Leilão aguça apetite dos investidores
Glauber Gonçalves
e Cley Scholz
Rio e São Paulo (AE) – A corrida de quatro grupos para concorrer à concessão de São Gonçalo do Amarante deve estimular mais empresas pela privatização dos Aeroportos de Cumbica (Guarulhos), Viracopos (Campinas) e Juscelino Kubitschek (Brasília), apontam especialistas.
O plano do governo é finalizar essas outras concessões até o fim do ano para não correr o risco de o País passar por constrangimentos durante a Copa do Mundo de 2014.
“O interesse (em São Gonçalo do Amarante) foi grande e o ágio foi expressivo, principalmente por se tratar da concessão de um aeroporto que não existe. É um aeroporto que está em obras há muitos anos e tem meia pista pronta. Até a viabilidade é discutida. O sinal disso para os leilões marcados para o fim do ano é muito positivo”, avalia Guilherme Lopes do Amaral, especialista em Direito Aeroviário e sócio do Aidar SBZ Advogados.
Os outros três aeroportos vão precisar apenas de obras de ampliação e de modernização. Além disso, o fato de já estarem em operação há muitos anos permite que os interessados estimem com maior precisão a demanda.
Entre especialistas, a percepção é de que as grandes operadoras internacionais não participaram do leilão de São Gonçalo do Amarante para guardar munição para as próximas concessões.
“O aeroporto que já está pronto garante receita imediata para as empresas, ao contrário de Natal, onde serão necessários três anos de investimentos para o aeroporto entrar em funcionamento”, afirma o presidente da Associação Brasileira dos Empreiteiros de Obras Públicas, Luciano Amadio, cuja empresa, a CVS, estava entre as que desistiram da disputa na última hora.
Segundo ele, o mercado tem interesse não só nos três leilões já confirmados como em vários outros aeroportos que também precisam de investimentos em ampliação. Amadio cita os casos de Congonhas, em São Paulo, Galeão e Santos Dumont, no Rio, e os aeroportos de Porto Alegre, Curitiba, Florianópolis, Recife e Salvador.
O sucesso de São Gonçalo do Amarante, no entanto, não significa que o governo não precisará trabalhar para atrair investidores para as próximas concessões, diz o especialista em aeroportos Erico Santana. Na avaliação dele, as autoridades do setor terão de sentar com as empresas e renegociar a alteração de regras que afastaram grandes operadoras, como a alemã Fraport.
Além disso, um dos pontos que provocam dúvidas nos investidores, afirma, é o papel que a Infraero desempenhará nas próximas concessões. O plano do governo é de que a estatal tenha participação de até 49%. Ao mesmo tempo, a empresa vai integrar a recém-criada Autoridade Portuária, uma espécie de “síndico” dos aeroportos. “Isso não está muito claro e pode diminuir a vontade do mercado de entrar no Brasil”, diz Santana.
O especialista alerta ainda que, para tornar as concessões de São Paulo mais atrativas, o governo precisaria dar garantias aos grupos interessados de que não vai permitir a construção de outro aeroporto na região.
Nos últimos meses, as construtoras Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez têm tentado emplacar no governo o projeto de um aeroporto erguido em regime privado.
Resultado da disputa pelo aeroporto surpreende Anac
A oferta final feita pelo consórcio vencedor, 228% maior que o lance mínimo estabelecido para o leilão, deixou o diretor-presidente da Agência Nacional de Aviação Civil, Marcelo Pacheco, surpreso. A Anac, que comanda o processo de concessão dos aeroportos brasileiros, não sabia como o projeto seria recebido pelos investidores. “O leilão de São Gonçalo do Amarante mostrou que os aeroportos brasileiros despertam sim o interesse da iniciativa privada”, concluiu, logo após investidores e representantes do RN baterem o martelo.
O diretor-presidente da Anac reconheceu, porém, que a divulgação da concessão dos outros aeroportos – já construídos, com grande fluxo de passageiros e mais rentáveis – antes da realização do leilão do aeroporto de São Gonçalo afastou grandes operadoras internacionais da disputa. “Várias operadoras não participaram. Pensávamos que elas iam entrar, mas elas devem ter pensado: por que vou investir neste aeroporto, se posso investir naquele outro?”.
A ausência das ‘gigantes’ também teve um lado positivo, segundo Marcelo. “Empresas que eu nem imaginava que entrariam, entraram (na disputa). Isso mostra que há mais interessados no setor”. Guilherme Amaral, especialista em Direito Aeroviário, concorda com o diretor presidente da Anac. Para o especialista, o fato da proposta final ter chegado a R$170 milhões mostra que há mercado para ser explorado e interesse por parte dos investidores.
“O resultado do leilão de São Gonçalo do Amarante mostra que o modelo desenhado pela Anac foi bem recebido pelo mercado, mesma tese defendida pelo ministro chefe da Aviação Civil, Wagner Bittencourt.
Enquanto o contrato não é assinado, São Gonçalo do Amarante faz seu ‘dever de casa’, como explica Jaime Calado, prefeito do município. “Agora vamos dar as mãos: iniciativa privada, Município, Governo do estado e federal”, disse. (A.M.)
Concessão melhora qualidade do serviço, diz especialista
Para Guilherme Lopes do Amaral, especialista em Direito Aeroviário, a concessão dos aeroportos brasileiros, iniciada com o leilão do aeroporto de São Gonçalo do Amarante, no RN, acelera obras e aumenta a qualidade do serviço oferecido no País. Isso porque a iniciativa privada, que ‘compra’ o direito de construir/reformar os aeroportos e administrá-los num regime de concessão (no qual o empreendimento volta para as mãos do governo ao final do contrato), busca o lucro e para obtê-lo precisa investir.
Se não concedesse os aeroportos à iniciativa privada, o governo federal, cujos recursos são limitados, demoraria muito para realizar as intervenções necessárias, justifica o especialista. O aeroporto de São Gonçalo, por exemplo, está sendo construído há quase 14 anos pelo governo federal, que até o momento investiu cerca de R$138 milhões, através da Infraero. A iniciativa privada vai investir cinco vezes mais em ¼ do tempo (3 anos, segundo o edital).
Aeroportos com maior capacidade e melhor estrutura física, explica Guilherme Amaral, atrairão novas companhias e levarão as que já atuam na região a ampliarem a frequência dos voos. A tendência é que com o aumento do fluxo de passageiros, as tarifas caiam. Para aumentar o fluxo e atender bem os passageiros, mantendo o lucro, as empresas terão que continuar investindo no negócio. “O passageiro busca eficiência; as companhias buscam redução de custos. Se você constrói um aeroporto ‘modelo’ consegue conciliar as duas coisas”, diz.
O Aeroporto de São Gonçalo do Amarante será privatizado dada a declarada impossibilidade do poder público de concluir as obras com recursos próprios. A concessão do empreendimento servirá de modelo para pelo menos outras três concessões previstas para o final do ano – dos aeroportos de Guarulhos (SP), Viracopos (SP) e Brasília. (A.M.)
Bate-papo
Henrique Alves » líder do PMDB na Câmara
O que o leilão representa para o Estado?
É o segundo momento mais marcante da história do Rio Grande do Norte do ponto de vista econômico e social. O primeiro foi quando a energia de Paulo Afonso chegou ao RN. O aeroporto de São Gonçalo do Amarante será o mais moderno aeroporto de cargas e passageiros do Brasil. Isso foi possível porque a ministra Dilma, agora presidenta, decidiu priorizar o Nordeste na hora de fazer as concessões dos aeroportos.
Apesar de todas as especulações, quatro consórcios participaram do leilão, sendo que alguns fizeram propostas bastante ousadas. Como o senhor avalia isso?
Havia muitas pessoas descrentes, mas aí está o resultado. Cerca de 228% de ágio (valor da proposta vencedora foi 228% maior que o lance mínimo no leilão) mostra a importância desta obra, do Rio Grande do Norte, para o Nordeste e o Brasil. Fora a energia de Paulo Afonso, é o segundo momento mais marcante da história do RN.
E qual o papel desta obra para o Estado?
O Rio Grande do Norte passa a ser um antes do aeroporto e outro depois do aeroporto. Nós perdemos num passado recente a refinaria, mas esta obra é mais importante que a refinaria, em termos de emprego, renda e desenvolvimento. O aeroporto de São Gonçalo do Amarante será o mais importante do Brasil.
A trajetória do aeroporto foi marcada por vários percalços. Quais os maiores e como foram superados?
Há 14 anos, o então presidente do Brasil Fernando Henrique Cardoso, e o então governador do estado e atual ministro da Previdência Social, Garibaldi Alves, iniciaram o processo, mas ao longo dos anos a Infraero, por mais que tentasse, não tinha condições econômicas para viabilizar o aeroporto nestes moldes. Aí a decisão inédita, pioneira, do governo Lula, de conceder os aeroportos a iniciativa privada. E a primeira experiência foi no Rio Grande do Norte. Agora vai acontecer no Rio de Janeiro, em São Paulo. Mas a primeira vitória foi nossa. Uma obra de R$1 bilhão, que vai gerar 20 mil empregos. Hoje é a maior alegria de minha vida pública, meus 40 anos de político.
Ao consórcio vencedor, o senhor fez um apelo: que contratassem potiguares…
Fiz este apelo, que já era o da governadora Rosalba Ciarlini, para que esta obra possa empregar os norteriograndenses. Que os brasileiros que moram no RN tenham oportunidade de renda, emprego. Acho que esta deve ser uma imposição, no bom sentido, feita pelo nosso estado. Fiz também outro apelo, que é entregar o aeroporto antes da Copa do mundo, em 2014.