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Escândalo em 42: clubes cassam presidente da FNF

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HISTÓRIA -  Tão grande era a ligação do Paysandu com o ABC que o torcedor confundia  as fotos dos dois clubes. O Paysandu (foto) também era alvinegro

Everaldo Lopes – Repórter e Pesquisador

Com a  Base Aérea de Parnamirim já instalada e  bombadeiros e caças dos países aliados decolando e pousando a cada momento, pondo um pavor constante na população da  capital, eis que os velhos cartolas do futebol norte-rio-grandense entraram em conflito. Tudo foi gerado pela velha queixa do América, Alecrim e Santa Cruz, de que o Secretário da antiga FND – o polêmico Vicente Farache Neto favorecia escandalosamente ao filiado Paysandu, igualmente ao ABC  jogando com camisas alvinegras, listradas, sob as  vistas do presidente da entidade, engenheiro Gentil Ferreira de Souza. O Paysandu era tido como filial do ABC, com um fundo de verdade porque Farache usaria os jogadores do mesmo Paysandu contra os adversários dos três clubes reclamantes. A frágil regulamentação da entidade permitia aberrações, como a de um clube poder utilizar jogador de outra associação, desde que tivesse assinado nova inscrição por esse clube.

Vicente Farache sempre foi um dirigente arguto e matreiro, sabia partir na frente dos demais adversários do seu ABC, contando com o beneplácito do presidente da federação, de tradicional família de  abecedistas. Tanto que, mais tarde, Ferreira seria presidente do Alvinegro, apesar de  apontado como um cidadão íntegro. O temor dos outros cartolas é que Farache era vivo e sabia como “labiar” seu amigo Gentil. Por isso, cansados de ver jogadores do Paysandu sendo transferidos para o ABC  em pleno andamento do campeonato, esses dirigentes conseguiram quorum e convocaram o Conselho Geral (uma espécie de Conselho Arbitral dos dias atuais), cassando Gentil Ferreira da presidência da antiga FND e a conseqüente desfiliação do Paysandu FC. O curioso em tudo isso é que, um dos homens mais fortes do América, Humberto Nesi, liderava o movimento rebelde ao lado de outros nomes de peso, como João de Vasconcelos e Djalma Maranhão,  aumentando o volume da crise. Nesi, entretanto,  era amigo pessoal de Farache.

O Conselho Geral não somente cassou o presidente da federação, como suspendeu o campeonato, criando em seu lugar um torneio  com os clubes que estivessem ao lado da nova administração. Crise brava, torcedores estupefatos por decisão tão surpreendente, enquanto Farache e Gentil entravam com um recurso junto ao Conselho Regional de Desportos  (hoje extinto), presidido por José Gurgel do Amaral Valente. Este, não somente tornou sem efeito a cassação de Gentil Ferreira, como também autorizou o reinício do campeonato, que havia sido suspenso. Com os clubes rebeldes dispostos a endurecer a decisão do Conselho Geral, eis que é a CBD quem suspense a greve autorizando o retorno de Ferreira à presidência da federação, com o conseqüente reinício do campeonato.

Mesmo reiniciado o campeonato, o mal-estar entre os adversários de  Gentil Ferreira e Vicente Farache   continuou, sempre aparecendo como motivo a subserviência do Paysandu ao ABC, bastando dizer que, em toda sua trajetória como filiado à FND, o  que o torcedor contrário chamava de “filial” jamais derrotou o ABC. Pelo contrário, se necessário fosse sofria até goleadas acachapantes diante do Alvinegro, contanto que os gols feitos pelos adversários pesassem na classificação do ABC. Nos anais da federação há até um bilhete do sr. Humberto Nesi a seu amigo Farache, desculpando-se por afastar-se do tumulto, “até porque reconhece que tem o temperamento forte, preferindo ficar de fora, lembrando a Farache que o problema eram as inscrições do ABC e Paysandu vinha de outras gestões. Há também um outro (bilhete) de Farache, fazendo parte dos arquivos do autor desta matéria. Diante do imbróglio criado, terminou Vicente Farache resolvendo se afastar do cargo de Secretário da federação, até porque era notória a sua sólida vinculação ao ABC, prejudicando até as  posições que teria de tomar, mesmo com a decisão da CBF  a seu favor. 

Vicente Farache começou como jogador do ABC, até viajar para concluir o curso de Direito no Rio de Janeiro. Sempre atuou na defesa do Alvinegro, como uma espécie de diretor de futebol eterno (acumulando com a função de treinador). Na verdade, era um “dono” do clube, colocava dinheiro na agremiação, o carro de seu irmão Tonho Farache era uma espécie de veículo do clube no transporte dos jogadores, os empregados de sua loja da rua dr. Barata jogavam no ABC, enquanto sua mulher, Maria Lamas Farache – contam os mais próximos, chegava a cuidar  da rouparia dos jogadores. Após os jogos do ABC, ela costumava receber os jogadores em sua residência (próxima à sede do clube) . A prendada senhora faleceu aos 40 anos. Vicente Farache foi presidente do Conselho Regional de Desportos, de 1961 a 66, foi jornalista dos bons. Em 1950, cobriu o Mundial de Futebol como correspondente da TRIBUNA DO NORTE. Faleceu em 18/08/67.  Só deixou filhos de uma segunda união, após a morte sua amada mulher, Maria Lamas.  Todos os personagens desse imbróglio, que quase cancela em definitivo o campeonato de 1942, são falecidos.

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