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Estoque de rock sem parar

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Quando o conheci, o mundo era como brasas insistentes. Lembro do reinado da discórdia entre povos, na televisão e no rádio. Era como se uma descomunal chuva de nuvens, debelasse o amor que se nutria por tudo que reluz ouro e se eterniza. Lembro das placas dos letreiros nos meio das ruas anunciando que o mundo ainda tinha jeito. Que nós humanos, poderíamos ainda nos produzir, e sair para a rua vestidos de uma esperança tão fé. Que as máquinas que lavam, energizam nossos juízos, iriam desaparecer, e que as ruas, tomadas de flores, lançariam o último sucesso do Rock, como fértil e febril recado para nossos sonhos e passos.

Foi assim que conheci esse pensador e pescador de baladas que depois tornou-se meu amigo. Baladas revestidas de filetes de sinas e minas. Vestidas pela indumentária que faz todo homem refletir sobre a violência que a cada dia, cometemos uns contra os outros. Como uma lágrima que saí do rosto e que se alastra por todo o corpo.

O tempo no mundo não para. Já dizia meu avô, olhando para a avenida cheia de bicicletas, e de pedintes orando, como suplicando pelo resto de amor quando encostamos o rosto no travesseiro, e tentamos dormir. Esquecer do mal que a cada dia se alastra, a espalhar suas garras entre igrejas, supermercados, clínicas, cemitérios e  verões.

Ouço ao longe o tilintar do trem que parte. Esse trem não diz para onde vai. Pelo meio do caminho, freia, e entra pelas sua bordas, uma infindável classificação de bichos e perfumes da floresta. Pela suas bordas, borrifa o medo que ficou na esquina da noite passada. Tudo como se fosse um colar de ossos. Daqueles colares famosos, dos caciques das tribos que não existem mais. Sim. Foi em cima da boleia desse nosso sino que badala, que conheci Leno Azevedo. Um garoto coberto por casacos Lees e de tantas outras jornadas juvenis. Ele morava numa daquelas ruas, próximas da Angelo Varela. E eu morava na Ezequias Pegado, bem ao lado da Escola Doméstica. Naquela época o mundo era uma caixinha de surpresa para os nossos quintais. Nos satisfazia a algazarra de Elvis, de Fats, de uma cantora de blues.

Lembro do inteiriço dos quintais, quando se transformavam em uma pista de dança cheia de uma pasta gosmenta que punhamos nos cabelos e corríamos para dançar. Lembro do dia que Ronaldo Sormani, nosso maior cantor brega, surgia na esquina da rua Ângelo Varela e assobiava suas canções para Leno. A cidade se vestia de azul, e suspirava em direção a praia do Forte. Como esperando pelo desfile das meninas da ED, tão apetitosas e inesquecíveis. Bem mais do que aqueles calendários anuais, que se encontravam nas oficinas de carro, mostrando as modelos belas e robustas para nossos olhos juvenis, rebeldes e românticos. Era o tempo por onde aparecia a carícia dos casais que se encontravam e trocavam juras do duradouro amor. Lembro quando escutei uma das primeiras músicas de Leno. Era uma labareda de vinil, tão viril e iconoclasta. Que revirava nossos olhos e sonos.

Lembro das meninas formando um cordão de tanto afã para seu ídolo, para toda sorte de pensamento e tensão corpórea. Sim, a juventude sempre foi um cordão brilhante de pulos e suores. Assim, as tardes de domingo era um grande auto falante ligado. Era como se fosse nós mesmos ligados em uma caixinha de surpresa. Compaixão de contorções da cintura. Pintura de tanto fervor e namoro.

O Rock balada definitivamente entrava nas nossas vidas, com alguém daqui, como um divisor de mágoas. Como um divisor do tempo perdido, entre tantos brinquedos e das audácias de um jardim sem perfume. Sobre essas fragrâncias que um dia foram substituídas pela embalagem do lança perfume. Sim, o flâneur dos romances juvenis ao som das músicas de Leno.

Leno conseguiu formar uma fiel e enorme platéia ao seu redor. Porque Leno sempre soube que a conquista dos corações, ela sempre se dá olhando para os olhos e falando a verdade. A verdade que se espalha e que provoca um novo sentimento, cadeia de reação a tudo que para e se esconde.

Como uma inteiriça mensagem. Feita de múltiplas cores e promessas. Feita de um horizonte tão repleto de frases que se espalham pela rua, pelos seus habitantes. Que esse nosso permanente representante de uma sonoridade de tantas léguas sem tréguas, nos acorde continuamente com suas canções, como verdadeiro alento ao que se vê e sente. Desse mundo que só Leno sabe como lhe dá valor.

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