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Estrangeiros desbravam novo mundo

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SONHO - Edmilson Correia Rodrigues quer ser engenheiro

Da infância Edmilson Correia Rodrigues, 19 anos, traz o sonho de ser engenheiro. De uma família de sete irmãos, o sonho desse jovem de sorriso estampado e conversa franca, poderia ser semelhante ao de tantos outros se não distinguisse em um fato: a formatura em Engenharia Civil está sendo buscada em outro país. Na verdade, Edmilson, que possui sobrenome muito próprio dos brasileiros, é de Cabo Verde  e é no Brasil, mais precisamente na Universidade Federal do Rio Grande do Norte que ele busca concretizar seu sonho.

Assim como ele, há atualmente na UFRN outros 64 jovens estrangeiros que participam do Programa Estudantil Convênio de Graduação (PEC-G). São jovens de países africanos e sul-americanos. Em comum, além da idade e do fato de estarem buscando uma graduação, esses universitários têm o espírito desbravador.

São rapazes e moças que, muitas vezes, saem do seu país de origem, com uma população sofrida e carente, para buscar um estudo melhor no Brasil. E morar aqui? Não. Eles fazem a faculdade aqui, mas a maioria retorna ao seu país de origem para lá desempenhar a profissão. Mas isso é a maioria, porque há casos de universitários que além do estudo encontram em Natal um amor. Nesse caso, eles perseguem o sonho da graduação, mas o retorno ao país de origem fica sendo apenas de visita, já que optam por construir a vida no Brasil.Na UFRN o PEC-G já é como uma tradição. O entrosamento dos estudantes estrangeiros com os potiguares é natural. Aliás, os africanos chamam atenção pela alegria que estampam na convivência. Jovens falantes, que gesticulam, sorriem e não se envergonham de dizer que vieram buscar um estudo melhor para levar ao seu país de origem.

Eles trazem também uma luta muito própria para tentar custear a sua manutenção no país visitante. Há apenas um ano o programa de gradução começou a oferecer bolsas. No entanto, nem todos os estrangeiros são contemplados com o benefício de um salário mínimo mensal. Recebem a bolsa apenas aqueles que comprovam a baixa renda da família.

Mas antes da criação dessa bolsa pelo Governo Federal, os estudantes chegavam e contavam com a ajuda dos familiares para se manterem em Natal. A estratégia deles é muito semelhante: alugam um apartamento e dividem com outros estrangeiros que estão em situação semelhante.

O Programa Estudantil Convênio de Graduação oferece um apoio ao jovem. No entanto, há algumas restrições, como o fato deles não poderem usar a residência universitária. No caso específico da UFRN eles têm o benefício da alimentação no restaurante universitário. A limitação orçamentária desses jovens é tanta que a maioria deles não retorna ao país para visitar durante o período de estudo no Brasil. A volta ocorre apenas quando conclui todo o estudo.

O sonho com o Brasil pela telenovela

Edmilson Correia, de Cabo Verde, diz que começou a planejar estudar no Brasil depois de ver as telenovelas nacionais, que mostravam um pouco de como o país é. E a escolha da UFRN? “Quando eu fui fazer a seleção (para tentar entrar no programa de graduação) eu pesquisei as universidades e gostei da UFRN”, comenta o jovem.

Ele mora em Natal desde fevereiro. Dividi apartamento com outros três colegas também de Cabo Verde. O caso de Edmilson é um pouco diferente dos demais estrangeiros. Ele planeja ir visitar a família no final do ano. Para essa viagem ele conta com a grande vantagem da distância. Cabo Verde fica apenas a três horas de avião de Fortaleza, no Ceará.

Tenho muita saudade da minha família. Vou no final do ano e volto em fevereiro”, comenta.

Sobre o estudo na UFRN, o jovem admite que é muito mais rigoroso do que no seu país de origem. Mas longe de isso desestimular, serve de incentivo para Edmilson Correia. O futuro engenheiro também se mostra empolgado com a estrutura de empreendimentos que encontrou em Natal. “Tem mais do que no meu país”, completa.

Estrangeiros usam dialeto para se comunicar entre eles

Os jovens que chegam à Universidade Federal do Rio Grande do Norte são de origens de língua latina. Muitos deles já chegam falando português. No entanto, não esquecem os dialetos dos seus países de origem. Durante entrevista para essa matéria, no momento de fazer a foto, os dois estudantes de Guiné Bissau Mário Fonseca e Leonel Pereira sorriem e começam a falar um dialeto. O que é isso? “Lá (em Guiné Bissau) a língua oficial é português, mas a gente fala o dialeto crioulo”. Questionado sobre o motivo de ficar falando crioulo no meio de brasileiros, Leonel nega que seja uma maneira de fazer comentários sem que esteja sendo compreendido pelo povo local. “É só para a gente conversar, não é nada”, comenta, com um leve sorriso.

Leonel Pereira, 23 anos, é estudante do terceiro período do curso de Direito. Comenta que veio ao Brasil em busca de conhecimento. “Aqui é mais perto da África, o estudo é bom e a educação está madura”, observa o estudante, ressaltando o sonho de voltar a Guiné Bissau para exercer a advocacia.

Leonel é um dos estudantes que recebe a bolsa do Governo Federal. É suficiente um salário mínimo? “Dá pra se virar por aqui”, responde o universitário. E na conversa descontraída ele vai mais além e faz questão de destacar que desde criança alimentava o sonho de vir ao Brasil.

Mário Fonseca, 23 anos, estudante de Comunicação Social, veio em busca de algo muito semelhante ao que trouxe Leonel. “Queria conhecer uma nova cultura. Queria estudar fora”, diz o estudante de Guiné Bissau.

E neste conhecimento de nova cultura uma opinião comum entre eles é que não se arrependem de ter optado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

A escolha pela economia

A escolha que o estudante da Guiné Bissau Eudésio Edwin da Silva, 27 anos, fez ao optar por cursar Economia na Universidade Federal do Rio Grande do Norte tem um componente que vai muito além da própria identificação com o curso. Eudésio admite que o grande objetivo é entender a economia do seu país.

“A economia do meu país é muito fraca e eu queria entender não com os olhos de leigo, mas com argumentos de algum conhecimento maior. Eu tinha uma inquietação para saber disso e entender a organização econômica do meu país que não é das melhores” comenta ele. Depois de dois anos estudando Economia, ele já se arrisca a fazer uma análise prévia: “A economia da Guiné tem um componente político muito forte. Não é só uma questão de estrutura da economia, mas principalmente da política”, afirma o estudante que faz estágio na Funpec.

Eudésio Edwin se mantém em Natal com a ajuda de familiares que enviam dinheiro. Ele explica que escolheu o RN por já ter amigos participando do programa no Estado. Ele lembra que nunca sonhou em deixar o seu país, mas sabia que em busca do conhecimento poderia passar uma temporada fora, como essa em que permanece no Estado potiguar. O que mais chamou atenção dele nessas terras foi a simpatia do povo. Eudésio elogia os potiguares como pessoas solícitas.

Antes de viajar para o Brasil, Eudésio cursou a escola de nível médio profissionalizante para professor de História e Geografia. Trabalhou como docente durante dois anos, até que decidiu participar da seleção do Governo brasileiro. 

Guiné Bissau lidera o ranking

A Guiné Bissau lidera o ranking dos estudantes estrangeiros na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Daquele país há 26 estudantes matriculados na instituição. De Cabo Verde são outros 23. Mas na lista total dos 65 estudantes há as mais diversas nacionalidades como Bolívia, Peru, Angola, Moçambique e São Tomé e Príncipe.

O assessor internacional da reitoria da UFRN, Djalma Arlindo Marinho Pereira, explica que o Programa Estudantil Convênio de Graduação (PEC-G) é um acordo de cooperação firmado entre o Governo Brasileiro e outros países em desenvolvimento. As instituições universitárias, públicas e privadas, disponibilizam as vagas e a embaixada do Brasil naqueles países faz a seleção. A escolha dos estudantes é feita com a análise do currículo do ensino fundamental e médio.

A seleção é realizada anualmente. E com um detalhe, ao final de cada ano mesmo o estudante que já está na instituição é submetido a uma nova avaliação para poder continuar estudando. Na UFRN, os estrangeiros cursam os mais diversos cursos como Ciências da Computação, Arquitetura, Estatística, Medicina. “Esse é um programa desenvolvido pelo Ministério das Relações Exteriores junto com o Ministério da Educação”. Para todos os universitários há uma regra comum: eles concluem o curso na instituição brasileira, mas são obrigados a retornarem ao seu país de origem para receber o diploma. Essa é uma exigência justificada para que o jovem possa retornar e exercer a profissão na sua nação.
Antes os estudantes não recebiam ajuda financeira, mas há um ano o presidente Lula, sensibilizado com a realidade que viu no continente africano, criou o Projeto Milton Santos de Acesso ao Ensino Superior (PROMISAES), que oferece um salário mínimo mensal aos estudantes estrangeiros que comprovarem a situação econômica familiar delicada.

Em todo Brasil, o PEC-G tem 2.700 alunos estrangeiros matriculados nos cursos universitários. “A maioria dos alunos quando termina o curso voltam, mas já tivemos casos de estudantes que se casaram e permaneceram no Brasil”, comenta Djalma Arlindo. Na UFRN o estrangeiro também tem a oportunidade de fazer as refeições no restaurante universitário.

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