Beirute – O presidente Emile Lahoud declarou, ontem, estado de emergência no Líbano e ordenou que o exército controle a situação, menos de quatro horas antes do fim de seu mandato. Lahoud afirmou que o Líbano está sob “estado de emergência.” O anúncio imediatamente levantou mais questões sobre a crise política libanesa.
O presidente não pode declarar estado de emergência sem a aprovação do governo, mas o porta-voz de Lahoud disse que o governo do primeiro-ministro Fuad Saniora é considerado inconstitucional. “O presidente da República do Líbano declarou o estado de emergência porque temos uma situação de emergência em todo o país,” disse o porta-voz presidencial, Rafik Shalala. “O exército recebeu ordens para preservar a segurança em todo o território libanês e colocar todas as suas forças sob a disposição do presidente.”
O comunicado instruiu o exército a “se submeter às medidas recebidas do gabinete, uma vez que existe um gabinete que é constitucional,” ele disse. Não houve nenhuma reação ainda do governo de Saniora, cujo gabinete estava reunido enquanto o presidente decretou o estado de emergência, no palácio presidencial no subúrbio de Baabda, em Beirute.
A decisão de Lahoud foi anunciada logo após a sessão do Parlamento do Líbano na qual os deputados deveriam eleger um novo presidente para o país ter sido adiada até 30 de novembro porque não houve quórum para o início da sessão. A oposição xiita (pró-Síria) boicotou a última oportunidade constitucional para a eleição indireta do novo presidente do Líbano, que estava marcada para as 13h locais (9h pelo horário brasileiro de verão
O presidente do Parlamento, o xiita Nabih Berri, anunciou o adiamento da sessão por uma semana, até 30 de novembro, para que as facções políticas rivais do Líbano “tenham mais tempo para realizar novas consultas e chegar a um consenso para a eleição do presidente” do país. A decisão de Berri, que pertence à oposição xiita, foi anunciada depois de 30 minutos de espera pela formação do quórum mínimo necessário para a eleição de um presidente (dois terços). Berri anunciou o adiamento da votação depois de consultar líderes da maioria (pró-Ocidente).
A situação cria um vácuo de poder potencialmente explosivo, apesar de líderes nos dois lados afirmarem que estão se esforçando para impedir que a situação se deteriore ainda mais.
Cenário de guerra civil
Enquanto tanques tomavam as ruas de Beirute e teorias da conspiração – um dos passatempos preferidos dos libaneses em momentos de tensão – dominavam as conversas na cidade, parte da população começava a tomar algumas medidas similares aos tempos da guerra civil (1975-90), enquanto outros ignoravam os tanques e os soldados que estão espalhados pelas esquinas da capital do país desde o início desta semana.
Em um restaurante, uma analista política libanesa afirmava temer combates nas ruas no fim de semana. Sua amiga foi embora dizendo que queria estocar leite para os seus filhos. Uma libanesa-americana filha de um rico empresário xiita estava proibida pelo pai de sair de casa a partir da noite de quinta-feira.
Alunos da Universidade Americana de Beirute faltaram à aula para acompanhar pela TV o que ocorria no Parlamento durante a tarde. E a principal casa de shows fecharia as portas na noite de ontem, cancelando o programa de parte da elite libanesa. Ao mesmo tempo, contrastando com a insegurança de alguns, em Ashrafyeh, uma área cristã, pessoas ainda lotavam restaurantes e o shopping estava com as lojas abertas. Casais tomavam café e havia fila para o cinema. Na rua Monot, uma das mais badaladas de Beirute, alguns bares abriram as portas.
Em muitos países, os tanques espalhados pelas ruas podem parecer algo estranho, mas os libaneses estão acostumados a este cenário. Durante a guerra civil, havia placas de trânsito indicando as vias pelas quais tanques e blindados podiam circular. A maior parte dos militares estava posicionada nos principais cruzamentos da cidade, na linha-verde, que separa a parte ocidental (muçulmana sunita) da oriental (cristã) de Beirute. As forças de segurança também se postaram diante dos ministérios a partir da noite de quinta.
A segurança era maior no centro reconstruído, onde se localiza o Parlamento. A região, destruída durante a guerra civil, foi reconstruída pelo ex-premiê Rafik Hariri, morto em atentado em 2005. Até novembro do ano passado, era uma das áreas mais movimentadas de Beirute, sendo freqüentada por pessoas de todas as religiões. Porém, há um ano, membros da oposição liderada pelo Hezbollah e pelo líder cristão Michel Aoun acamparam em volta do centro, que também é conhecido como Solidere, reduzindo o número de visitantes. Muitas lojas e restaurantes fecharam nos últimos meses.