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“Faltam quadras de Tênis no Brasil”

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A expressão do trabalho do árbitro de Tênis Beto Almeida é apontada pela própria lista de competições internacionais que participa. Hoje ele é um dos principais juízes desse esporte no país. Mas o destaque profissional em nada o distancia da simplicidade. Beto Almeida admite que as novas tecnologias aplicadas no jogo, como a possibilidade de ver a imagem em replay quando há uma discussão na jogada, reduzem a responsabilidade do árbitro. No entanto, ele aposta que para ganhar destaque nesse segmento é preciso muito mais do que apenas a técnica: cabeça fria, para acalmar os ânimos, muitas vezes acirrado, dos atletas. “Primeiro ter uma boa visão e ser uma pessoa calma. O árbitro de Tênis hoje se depara com o jogador nervoso e aí tem que acalmar (o jogador). O cara tem que ter calma, ter uma boa visão e conhecimento das regras. São aspectos fundamentais para ser um bom árbitro”, comentou. Ele admite que já errou em jogos e, pior, passou toda partida pensando no erro que havia cometido. “Tive um jogo muito difícil na Argentina, onde na quadra estava o melhor jogador argentino da época. Era um set point que errei, fiquei pensando na minha cabeça naquela bola e quase que ele perdia o jogo. Eu pensei, vou esquecer o erro porque vai atrapalhar”, comenta.  Quem vê a simplicidade e alegria de Beto Almeida nem imagina a história de superação que ele traz. Ele já foi vítima de um câncer no estômago, passou 80 dias no hospital, sendo 15 na UTI. Um período difícil, mas que deixou muitas lições. Uma superação promovida com muita fé e apoio da família. O convidado de hoje do 3 por 4 é um árbitro de Tênis famoso, um cidadão atencioso, um profissional simples e que traz lições.

Com vocês, Beto Almeida:

Beto Almeida é um dos principais juízes de tênis no BrasilO que é necessário para ser um bom árbitro de Tênis?

Ter uma boa vista. Primeiro ter uma boa visão e ser uma pessoa calma. O árbitro de Tênis hoje se depara com o jogador nervoso e aí tem que acalmar (o jogador). O cara tem que ter calma, ter uma boa visão e conhecimento das regras. São aspectos fundamentais para ser um bom árbitro. Tem também que fazer os cursos. Hoje em dia a gente tem uma carreira. O primeiro curso é o nível um, como a gente chama. Depois o nível 2 você ganha o certificado internacional, depois o bronze, prata e o ouro. São várias etapas.

Na sua carreira o senhor teve participação em vários torneios internacionais. Já passou por momentos em que depois descobriu que errou?

Já, várias vezes. No passado não tinha os recursos que têm hoje. Agora você tem o replay. O jogador pára o jogo e vai ver como foi a jogada. No passado não tínhamos isso. O jogador ficava duvidando de você, você não poderia corrigir e já passou a jogada. O jogador ficava o jogo todo pensando que você errou ou o contrário.

E o senhor já passou o jogo todo pensando no erro que havia cometido?

Já. Tive um jogo muito difícil na Argentina, onde na quadra estava o melhor jogador argentino da época. Era um set point (ponto do set) que errei, fiquei pensando na minha cabeça naquela bola e quase que ele perdia o jogo. Eu pensei, vou esquecer o erro porque vai atrapalhar. O árbitro tem que esquecer o erro, ele é humano.

Sua consciência já lhe puniu?

Sou muito detalhista. Mas com a experiência a gente vai esquecendo os erros e pensando nas próximas jogadas

Os novos mecanismos criados, como o replay para o árbitro ver antes de continuar o jogo, tira um pouco a responsabilidade do árbitro?

Tira, é verdade. Tanto do árbitro quanto da coisa do jogo mesmo. As pessoas gostam da discussão do árbitro com o jogador, mas agora ficou mais mecânico mesmo. Por outro lado, o árbitro de cadeira e os juízes de linha, podem também corrigir. Hoje em dia o juiz de cadeira já tem medo de corrigir porque se pede o replay ele poderá estar errado. Acho que diminuiu muito o árbitro chamar a responsabilidade. Demora um pouco. Para o jogador é bom (os novos recursos). Para o árbitro não.

Por que esse tipo de recurso não é bom para o árbitro?

Porque não vai ver se ele é bom ou não. Limita um pouco o talento. Mas, por outro lado, acaba com aquela discussão da jogada, já que só é pedir o replay e ver. Mesmo você errando ele aceita e o jogo fica tranqüilo. É como no futebol se tivesse um mecanismo acabaria com as discussões, que fica eternamente a distância e vai ficar a discussão se foi gol ou não. Ficam todos na dúvida. A tecnologia enquanto ajudar o esporte é boa.

O árbitro torce?

Não. São altamente neutros. O árbitro não torce.

Mas o senhor um dia já não se deparou torcendo mesmo?

Não. Inclusive, já fiz jogo de Guga. A gente é super isento. Ao contrário, a gente se fiscaliza mais quando trabalha com jogador brasileiro para evitar que falem qualquer coisa. Claro, que a gente evita trabalhar o árbitro do mesmo país do jogador, mas quando acontece não há problema. É difícil não trabalhar em jogo brasileiro.

Como um árbitro consegue se projetar na carreira?

Tem que ter duas coisas: conhecimento de regra e postura. Precisa fazer todos os cursos, nível um, dois e três e ter sorte. Hoje em dia todo mundo precisa ter sorte. Precisa estar no lugar certo, na hora certa. O árbitro precisa ter, além dos cursos, as avaliações anuais. Tem que ter o mínimo dos jogos para fazer. Eu, por exemplo, como tenho prata e ouro (categorias) preciso fazer, no mínimo, 70 jogos. Se não fizer serei rebaixado para nível bronze. Para subir de nível, eu só subo com avaliações boas. Se você está em um jogo transmitido pela televisão, atua bem, as pessoas lhe sobem de nível. Por isso falo que tem que estar no lugar certo e na hora certa.

O senhor teve sorte ou competência para chegar a repercussão internacional da sua carreira?

Eu atribuo as duas coisas. Além de gostar do que faço, eu batalhei, fui atrás, investi. Como toda profissão o árbitro tem que investir, você não pode ficar só no Brasil. Eu tive que pagar minhas passagens para ir aos Estados Unidos, minha hospedagem também era paga por mim. Para ganhar dinheiro, as vezes, eu tinha que ficar sete semanas nos Estados Unidos. Hoje em dia eu não pago nada, mas antes não era assim. Com seu nível você vai melhorando.

Na ótica do árbitro, o que define um bom jogador de tênis?

Ter bons golpes e mente. Hoje em dia 70% do Tênis é mental e 20% é a parte técnica e ainda tem 10% de física.

O que o senhor quer dizer com a capacidade mental do jogador?

Mental é não ficar nervoso. As vezes você joga com um cara mais forte e precisa ter muita força mental. Não pode deixar que as coisas que lhe perturbem na parte pessoal não leve para quadra.

O Brasil teve a época de Gustavo Kuerten, mas o Tênis hoje parece estar numa fase de baixa?

Hoje em dia temos só três jogadores entre os 100 melhores do mundo. É muito pouco para um país como a gente. Argentina tem muito mais e é um país menor. Tem duas coisas: a mentalidade dos argentinos, termina de jogar vão para quadra treinar. O brasileiro se perde ele vai para internet, para o celular, para o shopping. A mentalidade conta muito. Uma vez o Larry Passos disse que o brasileiro só quer saber de MIC: mulher, internet e celular. Poder ser uma verdade. Se chega a idade de 16 ou 17 anos, ou o cara entra firme no profissional e abandona muita coisa. É uma carreira de viagens, tem que largar amigo, família, viajar sozinho. Aos 16 anos tem que decidir ficar com a família, namorar ou ser profissional. As nossas viagens não são turismo, são trabalho. Para ganhar dinheiro tem que entrar no top 100.

E no caso dos juízes, para ganhar dinheiro precisa estar onde?

Acho que você chegar a nível silver, viajar e sendo pago, é difícil, mas ganha por torneio até ser contratado full time. Ou seja, independente do número de torneios você recebe um salário anual. Mas isso são poucos no mundo.

O senhor já pediu desculpa a um jogador por ter errado?

Já pedi desculpa sim. Isso mostra o caráter. O jogador aceita.

O Tênis continua sendo elitizado no Brasil.

Um pouco, mas melhorou muito. O problema do Brasil é que faltam quadras públicas. Uma raquete hoje custa R$ 250 ou R$ 300. Agora para você jogar precisa se associar a um clube, ter uma quadra. É elitizado nesse ponto. Falta investimento do governo em quadras públicas. Nos Estados Unidos tem quadra em tudo que é lugar. Nos Estados Unidos a latinha custa 2 dólares, aqui custa R$ 20.  Você joga bola e deixa na quadra porque 2 dólares não é nada para ele. Precisa também de professores que ministre aula de graça. Mas estamos melhorando. A Confederação Brasileira de Tênis está fazendo um bom trabalho.

O senhor é conhecido também por ser um profissional que traz uma história de superação.

Foi em 2006 quando eu já viajava com as competições de Tênis. Eu tinha programado 7 viagens internacionais. Antes de começar uma das viagens fiz uma endoscopia, acusou um tumor no esôfago. Minha operação era para durar duas horas, durou oito horas. Tive que retirar todo estômago. Eu fiquei 80 dias no hospital, peguei infecção no pulmão, foi uma infecção violenta chamada Síndrome da Alta Suficiência Respiratória. Foi um tratamento com drogas pesadas, fiquei 15 dias em coma induzido. Um dia o médico falou para minha mulher: pode se preparar que ele não vai escapar. Foram muitas orações, foi uma provação. Deus me fez repensar minha vida, minha família e organizei mais minha vida.

Perfil:
Sonho concretizado: trabalhar no que gosto, construir família maravilhosa e escapar da doença horrível que é o câncer, antigamente era um atestado de óbito saber que estava com câncer
Em acredita: em Deus
Plano: fazer muitos torneios no Brasil

Detalhes
Beto Almeida começou a carreira como técnico de Tênis em 1991. Hoje tem no currículo a participação em diversos campeonatos internacionais: US Open (10 vezes), Wimbledon (3 vezes) e Australian Open (2 vezes).
Além disso atuou em duas Olimpíadas, a de Atlanta e Sidney. Além de árbitro, Beto Almeida hoje viaja pelo Brasil promovendo grandes eventos de Tênis.

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