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Festival

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Dácio Galvão
Era manhã de domingo. Aglomeração de pessoas em frente ao cinema Rio Grande, na Avenida Deodoro com a Rua Açu. As sessões de arte aconteciam promovidas pelo Cine Clube Tirol. O filme que seria exibido pela primeira vez em Natal? O documentário do Festival de Woodstock. Todas as tribos presentes. Na fila indiana figuras emblemáticas da cena Underground local. Se destacava José Maria Dumaresq. Apontando para quase dois metros de altura sem camisa portava macacão jeans, cabelo black power, brinco, pulseira e tamancos. O protótipo alternativo. Se movimentava elétrico e fazia pantominas frequentes. Todos ali. Era a celebração cabal da liberdade de expressão levada a efeito. Várias causas: a não criminalização da opção sexual, a do sexo livre, do uso de drogas ilícitas, do vestuário unissex… Transgressões comportamentais. Tudo sob trilhas musicais diversas: country, blues, rock and rool.

Na tela o Capitão. Sim o Capitão. Era a denominação do líder da banda Grateful Dead, o lendário guitarrista californiano, Jerry Garcia, ou o Capitão Barato!

No Festival da música, da paz, do amor, do protesto contra a guerras (em especial a do Vietnam) juntando mais de meio milhão de pessoas, o primeiro artista a subir no palco foi Richie Havens. Cantou, gritou repetindo Freedom que virou refrão- símbolo. O quarteto Crosby, Stills, Nash & Young deu seu refresco, a canja folk. O The Who na voz de Roger Daltrey e na guitarra de Peter Townshend arrebentou geral fazendo o fragmento da Ópera Tommy. Joe Coocker incorporou coreografia particular reinventando With a Little Help From My Friends, canção dos Beatles. Sensacional!

Carlos Santana sob efeito de ayahuasca rasgava a latinidade em Soul Sacrifice. Jimi Hendrix o som melancólico do Hino americano e a gestualidade inconfundível explorando solos e distorções lisérgicas na canção Purple Haze. Alvin Lee fazia I’m Going Home, junto a banda Ten Years After explodindo solos frenéticos, virtuoses.

Janis Joplin, Joan Baez, Jefferson Airplane, Ravi Shankar …

Na onda dominical na sede social do ABC Futebol Clube onde hoje é o CCAB- Petrópolis, rolava o baile a partir das dezoito horas. A Banda era Impacto Cinco.

Liderada por Etelvino que fazia teclados. Tinha na formação Joca Costa na guitarra, Idalmir no contrabaixo, Clauto no sopro e Paulo Rosback na bateria. Repertório cover?

O melhor da contracultura: John Lennon, Beatles, The Who, Chicago, Blood, Sweat & Tears, Santana, Ten Years After…

Do lado de fora o coletivo aguardava para entrar na hora certa e curtir esses sons. O salão parava. Amaro Lima dançava em evoluções e em mil vibrações. Fazia seu número sozinho. Bonito e estonteante. Contorcer e manipular o corpo em ritmos e movimentos diversos.

Pontos imprescindíveis. Na Rua João Pessoa, Galeria do Edifício Sisal, a Loja Helisom girava os discos em vinil todas as tardes. Marcos, sósia de Mark Farner guitarrista do Grand Funk Railroad, potencializava dardos sonoros: Rolling Stones, George Harrison… Audição viajante e gratuita para a rapaziada encostada nos carros estacionados. Paz e amor! No lado oposto a Galeria esbarrava na Rua Cel. Cascudo, pintava o restaurante AMAI de Véscio Lisboa. Contrição e espiritualidade oriental. Na Rua Princesa Isabel a sede da Sociedade Rosa Cruz. Reverencia para Helena Blavátskaya, fundadora da Sociedade Teosófica. O Templário, na Avenida Rio Branco, disponibilizava livros do taoísta Lao-Tsé, do iogue Paramahansa Yogananda, o Livro da Mutações ou I Ching, do filósofo Jiddu Krishnamurti, raros incensos indianos… O poeta-filósofo Miguel Cirilo de dia e de noite de óculos escuros era a tradução perfeita dessas andanças. O script intelectual estava nos escritos contidos no livro-bíblia, A Nova Consciência, de Luíz Carlos Maciel. O Guru da Contracultura escreveu sobre Norman O. Brown, Wilhelm Reich, Norman Mailer, Carlos Castaneda, Herbert Marcuse, Alan Watts, Ken Kesey, Freud, orientalismo gays, hippies, feministas e tropicalistas. Hoje falar desses temas… É um passeio canônico. Apesar de. Meados da década de 1970. De um lado a violência e a repressão. De outro a resistência política, ainda no final da luta armada e da guerrilha contracultural.

O Festival de Woodstock vai completar agora em agosto de 2019, cinquenta anos e se reafirma como evento-paradigma de conquistas sociais. Destravou tramelas e abriu porteiras. Entre mortos e feridos meio século depois demandas da sociedade civil traz na pauta (i)moral temáticas de bandeiras já hasteadas e tremuladas por ventos que já se foram. O poder Executivo, o Congresso e o poder Judiciário engalfinham-se para regular e ou debater a democracia, questões de gênero, diversidades, descriminalização de droga ilícita, sexualidade, feminismo, racismo, xenofobismo, fascismo, guerra fria, meio ambiente… É ordem do dia. A história espiralada. O Trem da História… Em vagões de Maria Fumaça. No bojo do Trem Bala, ou do VLT. Ou no trem em suspensão, veículo em levitação por campo magnético na circularidade civilizacional?

É. A história se repete e rapidamente. Maquiada como uma balzaquiana passeando em cidades inteligentes, sustentáveis navegando digitalmente nas redes sociais. O mundo, o Brasil, Natal viveu o impulsionamento do Festival de Woodstock. Dos acontecimentos e desdobramentos. Realizado na cidade de Bethel, no estado de Nova York, nos Estados Unidos o evento consolidou o DNA do ativismo político-cultural. O que fazer?

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