quarta-feira, 24 de abril, 2024
32.1 C
Natal
quarta-feira, 24 de abril, 2024

Garibaldi homenageia Aluízio Alves no Senado

- Publicidade -

O senador Garibaldi Filho (PMDB) fez um pronunciamento ontem no plenário em homenagem ao ex-ministro Aluízio Alves, que faleceu no último sábado. O senador iniciou o discurso afirmando que se tratava do “mais doloroso” pronunciamento da vida pública dele. Garibaldi Filho destacou a biografia de Aluízio Alves, a partir da infância em Angicos, onde o ex-ministro revelaria, precocemente, as vocações de jornalista e político.

“Os depoimentos são unânimes de que se tratava de um menino adulto, um prodígio, uma mente curiosa e não acomodada, um indivíduo para quem as dificuldades nunca se constituíram em empecilho para a realização de seus sonhos e projetos de vida”, relatou Garibaldi.

Garibaldi Filho falou sobre a trajetória política de Aluízio Alves, iniciada em 1945 com a redemocratização do país, candidatando-se a deputado federal pela UDN, eleito aos 24 anos, deputado constituinte. “Aliás, ressalte-se, que Aluízio era o último remanescente dos que elaboraram a Constituição de 1946, de um Congresso que se destacava pelo brilhantismo da maioria dos seus membros”, continuou o senador.

Garibaldi lembrou que nos três de internação até o dia da morte de Aluízio Alves, ocorreu um fenômeno histórico incomum: “Todas as lideranças políticas do estado esqueceram as suas diferenças e reverenciaram o seu exemplo de vida pública. O homem que tanto dividiu opiniões ao longo de sua trajetória, uniu a todos em sua morte”.

Além de reforçar que Aluízio Alves faleceu sem estar ocupando nenhum cargo, o senador ainda disse dele: “Alguém de sua estatura e com a sua história de vida era amado e respeitado por sua gente, independentemente do exercício de funções públicas. Ele era simplesmente o menino do sertão, que sonhou e fez de sua vida um instrumento para a realização de projetos coletivos”. Segue o pronunciamento na íntegra.

Sr. Presidente,
Sras. e srs. Senadores,

Morreu Aluízio Alves. Certamente este é o pronunciamento mais difícil e doloroso da minha vida. O vazio de sua ausência é irreparável. Perco a presença física, a orientação, as observações e a visão de futuro de uma inteligência privilegiada. Perco, sobretudo, a minha maior referência de homem público. Sobrevivem, entretanto, o exemplo de vida, de devoção e de um verdadeiro sacerdócio em favor da sua terra e do seu povo.

Neste momento, são muitas as memórias que se confundem. Memórias do passado e do presente. Memórias visuais, das grandes concentrações populares, do colorido das manifestações e do semblante das pessoas atentas ao que dizia o seu líder; memórias auditivas, da lembrança de sua voz rouca levando uma mensagem de esperança e de desenvolvimento para um povo sofrido; memórias, sobretudo, afetivas, de um homem que soube plantar no coração de milhares de pessoas uma semente que se provou imorredoura. A lembrança de alguém cheio de vitalidade sentado no alpendre da casa dos seus pais, e todos ao seu redor, atentos a sua conversa inspirada. A memória de dias de angústia à espera da recuperação de sua saúde. E, enfim, a imagem do seu cortejo passando pelas ruas de Natal e sendo recebido por populares, que espontaneamente, tremulavam lenços e galhos verdes e cantavam músicas de suas campanhas.

Gostaria de retornar no tempo e recordar um pouco dessas memórias. No dia 11 de agosto de 1921, em uma pequena cidade do alto sertão do RN, Angicos, nascia Aluízio Alves. Naquela terra árida, de gente sofrida, de orações suplicantes por chuva, Aluízio revelou já na infância as suas vocações. Menino, editou um jornal de um único exemplar que circulava de casa em casa, “O Clarim”, levando a todos as notícias da cidade. A partir do seu pai, comerciante, agricultor e político da região, brotou em Aluízio a vocação política. Os depoimentos são unânimes de que se tratava de um menino adulto, um prodígio, uma mente curiosa e não acomodada, um indivíduo para quem as dificuldades nunca se constituíram em empecilho para a realização de seus sonhos e projetos de vida.

O jovem não deixou que as suas vocações e a expectativa gerada em torno dele se constituíssem em simples promessa. Em Natal, continuou a editar “O Clarim” e ingressou no movimento estudantil e na vida partidária. Torna-se repórter político do jornal “A República” e dirige o Serviço Estadual de Reeducação e Assistência Social no início da década de 40. Consolida-se, então, no gestor público, uma preocupação que marcou indelevelmente a sua vida: a busca por uma melhor convivência do homem com a seca. Ser humano incansável, encontrou tempo para assumir a diretoria da Biblioteca Norte-riograndense de História e da Sociedade Brasileira de Folclore. Aos 18 anos, publicou o seu primeiro livro, “Angicos”, no qual relata a história do município onde nasceu. Identificam-se, então, duas características marcantes de Aluízio: o apego as suas origens, o que revela o grande ser humano acima de tudo, e o homem estudioso e preocupado em conhecer a história e a realidade de sua gente.

Em 1945, com a redemocratização do país, candidata-se a deputado federal pela UDN.  Elege-se aos 24 anos, deputado constituinte. Aliás, ressalte-se, que Aluízio era o último remanescente dos que elaboraram a Constituição de 1946, de um Congresso que se destacava pelo brilhantismo da maioria dos seus membros. Elege-se, sucessivamente, deputado federal em 1950, 1954 e 1958, iniciando uma nova fase na história política do RN, na qual a população começou a participar ativamente do processo de escolha de seus representantes. Participou da fundação da Tribuna da Imprensa junto com Carlos Lacerda, sendo seu redator-chefe de 1949 a 1958. Aluízio como deputado e jornalista, foi um ator participativo do conturbado cenário político da década de 50. Foi vice-líder da bancada da UDN na Câmara dos Deputados e relator do projeto da Lei Orgânica da Previdência Social. Todo o destaque alcançado no cenário nacional e a sua postura de líder carismático e popular, inovador na forma de se dirigir ao povo, alçaram Aluízio à condição de candidato a governador do RN nas eleições de 1960. Todavia, a realidade estadual não afastou o então deputado das articulações de bastidores do seu partido que desaguaram no apoio a candidatura de Jânio Quadros. Foi o interlocutor do difícil encontro ocorrido em Lisboa entre Carlos Lacerda e Jânio Quadros. Logo Aluízio, com o seu temperamento forte e agitado, assumiu o papel de apaziguador entre aquelas duas lideranças polêmicas e de difíceis personalidades.

Em 1960, ocorreu a campanha que marcou definitivamente a trajetória política de Aluízio. Não conseguindo a indicação do seu partido para ser candidato ao governo – o então governador Dinarte Mariz preferiu indicar o também brilhante deputado federal Djalma Marinho – Aluízio abriu uma dissidência partidária com o apoio de outros partidos, entre eles o PSD, ferrenho adversário da UDN, os comunistas e integralistas, que se chamou “Cruzada da Esperança”. Todos esqueceram as diferenças e se uniram em torno de uma proposta administrativa inovadora. o “marketing” eleitoral, mesmo que de forma intuitiva e improvisada, constituiu-se em instrumento para levar a mensagem de um candidato. Os polegares para o alto, lenços e galhos verdes simbolizavam a mensagem de esperança. Foi uma campanha vibrante, porém radical, na qual se confrontaram duas das nossas maiores lideranças políticas da história, Aluízio Alves e Dinarte Mariz.

Com a sua vitória, Aluízio empreendeu o governo mais transformador da história do RN. As bases para o desenvolvimento socioeconômico e para superação de graves mazelas sociais,que ainda persistem, foram lançadas. Iniciou um processo de industrialização intenso no estado. Fundou empresas estatais importantes, que levaram a infra-estrutura necessária ao desenvolvimento, água, energia e telefone. Investiu maciçamente em educação e implantou o projeto pioneiro de alfabetização do educador Paulo Freire. Investiu em cultura através da Fundação José Augusto, criada no seu governo. Fundou a Faculdade de Jornalismo Eloy de Souza, a Faculdade de Sociologia e Política e o Instituto de Pesquisas Sociais Juvenal Lamartine. Ressalte-se que Aluízio, em um gesto de reconhecimento aos três homens públicos que mais o influenciaram em sua vocação, perpetuou-os na memória das novas gerações. José Augusto Bezerra de Medeiros, o grande parlamentar e incentivador de sua carreira política; Juvenal Lamartine, o exemplo do estadista inovador; e Eloy de Souza, o brilhante jornalista e político que se dedicou ao problema da seca. Após audiência com o Presidente John Kennedy na Casa Branca, obteve apoio da Aliança para o Progresso ao pioneiro plano de habitação popular com a construção da “Cidade da Esperança” em Natal. Planejou ações efetivas e permanentes de governo, inserindo o RN em um novo patamar histórico. Pode-se afirmar que o RN ingressara definitivamente no século XX com 60 anos de atraso.

Em 1966, elegeu-se deputado federal com votação recorde, sendo cassado, em 1969, pelo famigerado AI-5. Não se abalou e voltou-se para a vida empresarial.  Incentivou o seu filho, Henrique Eduardo Alves, que se tornou seu sucessor, levando a sua mensagem aos quatro cantos do Estado. Todo o seu grupo político integrou o então MDB, partido ao qual dedicou 37 anos de sua vida. Em 1970, o seu filho, Henrique Eduardo Alves, assumiu a sua bandeira e elegeu-se deputado federal com 21 anos. Disputei também, naquele ano, a minha primeira eleição, elegendo-me deputado estadual. Aluízio trabalhou pela abertura democrática e em 1982, sofreu a sua única derrota nas urnas, nas eleições para governador, para o hoje Senador José Agripino. Em seu discurso, após perder as eleições, cunhou uma frase que se tornou um dos lemas de sua história política: “a luta continua”. Não se deixou abater e exerceu um papel relevante nas campanhas para as Diretas, como também articulou decisivamente nos bastidores pela eleição no Colégio Eleitoral do presidente Tancredo Neves. Valeu-se, para tanto, de amizades que fez ao longo de sua carreira, como a do presidente José Sarney, que aceitou a indicação para vice-presidente. Exerceu o cargo de Ministro da Administração no governo Sarney. Como em todas as outras funções públicas, Aluízio deixou a sua marca através da criação da ENAP (Escola Nacional de Administração Pública) e da proposta do Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos. Propôs, ainda, a extensão do 13º salário para os servidores civis estatutários e militares da União.

Em 1990, elegeu-se deputado federal, o seu último mandato popular. Com a ascensão de Itamar Franco à Presidência da República, foi escolhido Ministro da Integração Regional, cargo no qual abraçou a grande bandeira de luta do final de sua vida, que é a de levar as águas do Rio São Francisco para os estados do Nordeste Setentrional, carentes de uma melhor estrutura hídrica.

Posteriormente, mesmo sem mandato, Aluízio nunca se afastou da política. A sua voz de líder maior do seu estado nunca se calou. Afirmou, certa vez, que só o veriam afastado da vida pública depois de morto. Estava enganado. Mesmo com seu corpo inerte, levado em cortejo fúnebre, produziu um dos momentos raros de manifestação popular espontânea: pessoas de várias idades e posições sociais querendo tocá-lo, guardando a última lembrança do homem que semeou a esperança. Ocorreu um fenômeno histórico incomum: todas as lideranças políticas do estado esqueceram as suas diferenças e reverenciaram o seu exemplo de vida pública. O homem que tanto dividiu opiniões ao longo de sua tragetória, uniu a todos em sua morte.

Aluízio faleceu sem estar ocupando nenhum cargo. Alguém de sua estatura e com a sua história de vida era amado e respeitado por sua gente, independentemente do exercício de funções públicas. Ele era simplesmente o menino do sertão, que sonhou e fez de sua vida um instrumento para a realização de projetos coletivos. Vale para Aluízio a definição que Somerset Maugham deu ao personagem principal de sua obra “Um Gosto e Seis Vinténs”: “poucos são aqueles que negam a sua grandeza. Não falo daquele tipo de grandeza alcançada por um político bem-sucedido ou por um bom soldado; essa é uma qualidade que faz parte da posição que ocupam e não do homem em si; e com a modificação das circunstâncias, tal grandeza é reduzida a proporções bem menores. O primeiro-ministro fora do seu cargo não passa, na maioria das vezes, de um retórico pomposo, e um general sem exército não passa de um insignificante herói. No entanto, a grandeza dele foi autêntica. Talvez você não aprecie a sua arte, mas mesmo assim não pode deixar de reconhecer que ele é capaz de provocar o seu respeito. Ele perturba e arrebata”. O poder é efêmero, mas os sonhos e ideais de um homem são perenes. Como disse certa vez Aluízio: “só o amor constrói a esperança”.

Muito obrigado.

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas