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Gol contra o pobre futebol potiguar

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DESMOTIVAÇÃO - Conselho Arbitral reúne-se para definir o calendário 2007

“Com o brasileiro, não há quem possa!". A marchinha ufanista não embalou apenas a primeira conquista mundial da seleção brasileira, em 1958. Cantada nos quatro cantos do país, ela mergulhou o futebol no mar da rica cultura popular nacional. A partir de então, o futebol virou, literalmente, “a alegria do povo". E não é só.

O cordão umbilical do Brasil com o futebol é tão forte que o país é mais lembrado lá fora pela “produção" de craques que exporta, desde sempre – mais acentuadamente nos últimos anos.

Passado meio século do primeiro de cinco títulos mundiais, o futebol brasileiro virou refém do mercado capitalista, onde só os fortes sobrevivem. A frágil economia brasileira reflete nos clubes e federações, que são incapazes, mesmo estando no “país do futebol", de concorrer com o mercado externo. Resultado: com a globalização e a abertura do mercado externo, o Brasil se transformou no maior exportador de jogadores do mundo, o que acaba ajudando a esvaziar os estádios brasileiros.

Até países bem menos desenvolvidos do que o Brasil, caso do Leste europeu mais recentemente, tem conseguido levar nossos craques, graças a força de mercado, formado por empresários inescrupulosos e investidores milionários. É a Lei de mercado… (na semana passada a revista Veja publicou uma reportagem, que revelava a “compra” da seleção argentina por um milionário russo).

Com o propósito de salvar a “paixão nacional", a CBF, no início deste século, instituiu a nova ordem do futebol brasileiro. A idéia era louvável: modernizar o futebol canarinho e tentar aproximá-lo do Europeu, bem mais organizado e estruturado. O problema é que Ricardo Teixeira e Cia. “desenharam" o novo mapa do futebol nacional com os mesmos traços da pirâmide social do país. Ou seja, garantindo privilégios a poucos em detrimento da maioria, menos favorecida.

Amadorismo: “vírus” letal do futebol

Como se não bastasse o relaxamento da CBF para com o Nordeste, vários fatores internos também contribuem para levar o futebol do Rio Grande do Norte ao fundo do poço. Dependente, exclusivamente, de “forças externas", o futebol do Estado é mal administrado e ainda sobrevive de dirigentes abnegados que investem nos times até com recursos do próprio bolso, apenas por pura paixão ao clube de coração.

O RN está poluído com dirigentes amadores, muitos até sem credibilidade, e clubes que só são taxados de profissionais porque mantêm contratos trabalhistas com jogadores e técnicos. Itens suficientes para afastar qualquer investidor interessado no futebol.

Isso, sem falar no dirigente que tenta se autopromover às custas do esporte, transformando o clube em “curral eleitoral", fato muito comum no Brasil e que acaba influenciando e muito na hora de promover o espetáculo. Há ainda àqueles que vestem a “cartola” com interesses financeiros.

Somado a tudo isso há a desmotivação coletiva dos dirigentes, que deixam seus afazeres profissionais para quebrar a cabeça pensando numa saída para o futebol local – mais uma triste prova do amadorismo. Organização e planejamento foram riscados do dicionário do futebol potiguar.

Na primeira reunião do Conselho Arbitral da FNF, realizada no início do mês passado com o propósito de estabelecer o calendário do futebol do Estado para a próxima temporada, ficou claro o desanimo dos representantes dos clubes, que não conseguiram encontrar uma fórmula ideal para resgatar o futebol em curto prazo, sendo obrigados à reportarem-se ao “velho”, à mesmice.

A dependência de recursos do governo estadual é considerada pela FNF como a única alternativa para, pelo menos, manter o campeonato do Estado. “Não há possibilidade de haver campeonato no Rio Grande do Norte se não houver um investimento do poder público", ressaltou Alexandre Cavalcanti, presidente da Federação, que considera o futebol, um esporte de massa, educativo e, portanto, de interesse público.

Nem tudo está perdido no futebol do Estado

Nem tudo está perdido no futebol do Rio Grande do Norte. Segundo Tiago Cavalcanti, filho do presidente da FNF e secretário executivo da entidade, está sendo montado, em parceria com uma agência de publicidade de Natal, um projeto de captação de recursos junto a iniciativa privada.

“Por enquanto ainda não podemos entrar em detalhes para não atrapalhar as negociações. Mas, a partir da próxima semana começaremos a fazer os primeiros contatos com algumas empresas que se mostraram interessadas em investir", confirmou Tiago. A iniciativa da FNF é louvável, diante da incapacidade dos clubes. Aos poucos, organização e planejamento começam a ficar mais nítidos, pelo menos, no dicionário da Federação Norte-rio-grandense. 
As publicitárias, Melissa Cirne e Yahonna Cavalcanti, da agência Virttus Multimídia, “compraram” a idéia da FNF e serão responsáveis pelas estratégias de marketing, necessárias para captar os recursos no mercado potiguar. “Estamos tentando encontrar os problemas e, ao mesmo tempo, as oportunidades”, refletiu Melissa Cirne.

“A idéia inicial é procurar espaços, o tempero para que o investidor possa interagir, ser inserido no contexto do futebol e que possa satisfazer tanto o investidor, quanto o consumidor do esporte. Foi um ponta pé que foi dado”, destacou, animada, a publicitária, que criticou a falta de atitude e de iniciativa dos dirigentes de clubes na prospecção de patrocínio.  Segundo Tiago, algumas empresas manifestaram interesse em, pelo menos, escutar as propostas da Federação, o que já pode ser considerado um avanço. Do poder público, a FNF espera contar com uma verba superior aos R$ 300 mil negociados com o governo atual, mas que não foram repassados. “Sem dinheiro é muito difícil fazer futebol”, disse o presidente da FNF, Alexandre Cavalcanti, que revelou uma dívida com a arbitragem em torno de R$ 16 mil.

Com a recente auditoria realizada pela própria Federação revelou um déficit nos cofres da entidade, que já passa dos R$ 1,2 mi. Metade deste valor, segundo Alexandre, corresponde  à dívida da Federação com o INSS – herança de gestões desastrosas e amadoras de um passado bem recente.

Para atender, exclusivamente, aos interesses do mercado (lê-se: Rede Globo de Televisão), a Confederação Brasileira de Futebol acabou vestindo a carapuça de “madrasta", cavando a cova de milhares de clubes espalhados pelo Brasil, principalmente, pelas regiões Norte e Nordeste.

No Rio Grande do Norte, por exemplo, os clubes ainda estão bem longe de cumprirem a Lei – de acordo com o Estatuto do Torcedor, promulgado em 2003 com o objetivo de moralizar o futebol, um clube profissional tem que estar “produzindo", no mínimo, durante dez meses no ano. Os clubes do RN, quando muito, funcionam, em sua maioria, durante o primeiro semestre do ano apenas, o que os tornam frágeis e sazonais.

“O grande problema é a CBF. O calendário tem sido péssimo para o ABC, que foi obrigado a ficar parado neste semestre”, reclamou o presidente do ABC, Judas Tadeu, que sugeri como saída uma reformulação no calendário. “A sugestão é ter calendário para jogar. De outro jeito temos mais é que vencer os torneios locais para nos garantir nas competições nacionais”, completou o dirigente.

Para Ricardo Bezerra, diretor de futebol do América, a única alternativa para evitar o pior é apostar na transmissão do Campeonato Estadual pela TV. “O caminho é o patrocínio. E a transmissão dos jogos pela TV, neste caso, é fundamental para a captação de recursos”, disse Ricardo. “Antigamente, as receitas dos clubes vinham em grande parte do social. O América tinha receita dos sócios e das festas no clube, Carnaval, etc. Hoje, conta com 300 sócios, que pagam vinte reais por mês. Este formato de clube acabou. Hoje, o futebol só funciona com patrocínio”.

Os grandes clubes brasileiros (que já nem são mais tão grandes assim, se comparado com o futebol do resto do mundo), privilegiados pelo calendário da CBF, cumprem o que reza a lei: Campeonato Estadual, Copa do Brasil e Taça Libertadores (para os mais fortes) no primeiro semestre; Campeonato Brasileiro das Séries A, B e C e Copa Sul-Americana (para os medianos) no segundo semestre. Tudo certo. Mas, e a maioria, que engloba mais de 2/3 de um universo de cerca de, pelo menos, 1.500 clubes espalhados pelo país?

Credibilidade suspeita é o grande mal

A falta de credibilidade do produto “futebol do Rio Grande do Norte” e o imediatismo dos empresários locais, que querem retorno rápido e garantido de imagem no investimento em marketing, são apenas alguns dos entraves encontrados para captar recursos junto a iniciativa privada do Estado, segundo a publicitária Melissa Cirne, da agência Virttus.

“Patrocinar é acreditar”, diz. “Há uma descrença em torno do produto como gerador de retorno de imagem. Independente do negócio, o empresário quer um retorno tangível. Para eles, investir no marketing esportivo não dá retorno imediato. O nosso mercado é formado por varejistas, que querem esse retorno imediato, baseado em ações promocionais na mídia tradicional (Rádio, TV e jornal)”, explicou Melissa Cirne.

A falta de planejamento dos empresários com as agências de publicidade de Natal para médio e longo prazo e o desinteresse dos agentes envolvidos em procurar novas alternativas de exploração de imagem, também, foram inseridos pela publicitária no rol de barreiras anti-futebol no Estado.

Melissa aponta um item importante na negociação de verbas privadas para o futebol, mas que também dependeria do poder público: os incentivos fiscais. “Acho que no futebol, também, deveria haver incentivos fiscais. O futebol é um esporte de massa e está na cultura do brasileiro. Com incentivos fiscais, talvez, as empresas se interessassem mais em investir no futebol”, disse Melissa, ressaltando a importância da renúncia fiscal do governo para incentivar a cultura –  Lei (estadual) Câmara Cascudo, que isenta de impostos as empresas investidoras dos projetos culturais.

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