quinta-feira, 28 de março, 2024
25.1 C
Natal
quinta-feira, 28 de março, 2024

Gravidez na adolescência preocupa

- Publicidade -

No corredor o silêncio era tão grande que dava para ouvir os passos. Pela porta entreaberta de um dos quartos era possível observar que havia uma cama e um bercinho. Depois de abrir a porta totalmente lá estava ela com as  unhas pintas de rosa clarinho, o corpo ainda de boneca e o rosto de menina. Com apenas 17 anos e pouco mais de 1,50 de altura, a garota, que será identificada como Fernanda, havia acabado de receber a visita da “cegonha”. Mãe de primeira viagem, a menina agora mulher ainda se adaptava à novidade – o filho, um menininho lindo.

Fernanda Morais, 21 anos, não programou a gravidez, mas está feliz com a chegada do bebêFernanda estudou até a sétima série do ensino médio. Mora no conjunto Pirangi com o marido que trabalha em um motel. A casa fica no mesmo terreno da residência dos pais. O casal não paga aluguel, mas para sustentar a família, o marido de Fernanda que tem 19 anos vai precisar fazer algumas acrobacias no orçamento. Ele ganha R$ 510 mensais. “Dá para a gente viver”, diz Fernanda.

Se vai ter mais um filho? Ela afirma que não quer nem pensar em ser mãe novamente. “Sofri muito durante a gravidez”, justifica a adolescente que revelou estar morando junto com o companheiro há pouco mais de um ano. “Eu não pensava em ficar grávida, mas aconteceu. Agora vou tomar remédios para não engravidar novamente”.

Fernanda fez cesariana. O procedimento cirúrgico foi o mais apropriado porque ela não tinha abertura suficiente para que a criança nascesse de parto normal.    O menino que nasceu às 10h02 da quarta-feira (22), na Maternidade Escola Januário Cicco tem nome de anjo, pesa 3,2 quilos, mede 48 centímetros e está ótimo.

Na mesma enfermaria, onde estão 26 novas mães a TRIBUNA DO NORTE encontrou outra adolescente. Com 17 anos e um sorriso de menina, Patrícia (nome fictício) estudou até a metade da sétima série do ensino médio e deu a luz à uma menininha na terça-feira (21), às 20 horas da noite. Ela não é mãe de primeira viagem. Já tem outra menina. Ficou grávida pela primeira vez com 15 anos. O relacionamento com o primeiro marido não deu certo. Hoje vive com um outro homem de 37 anos. O marido é pedreiro e ganha  R$ 620. Moradora de Felipe Camarão, Patrícia é como Fernanda, não esperava ficar grávida, mas sem tomar os cuidados necessários engravidou novamente. Ela também precisou fazer cesariana. Patrícia é hipertensa e para evitar possíveis problemas em um parto normal foi optado pelo outro procedimento. Agora com duas filhas, ela afirma que não existe a possibilidade de trabalhar e  já sabe: “Com a chegada de mais um membro  o orçamento vai apertar. Moramos em casa alugada”. 

Fernanda Pessoa, 21 tem um histórico um pouco diferente das adolescentes, em relação aos estudos. Parou a faculdade de pedagogia porque ficou grávida. É moradora de São José de Campestre e sempre quis ter um filho. Mas assim como Fernanda e Patricia, a gravidez não foi programada. O marido trabalha como garçom e ganha R$ 400. Mora em casa própria e apesar do pouco dinheiro no orçamento familiar ela está muito feliz com a chegada do primeira filha. “É uma sensação maravilhosa. Uma benção de Deus”, sorri e beija o rostinho da menininha que estava vestida com um macacão rosa.

Unidade não faz registro por faixa etária

Na Unidade Mista das Quintas conhecida como “Maternidade das Quintas”, a assistente social Cláudia Mesquita, 40 afirma que é comum a entrada no hospital de jovens gravidas e que muitas mulheres se tornam avos com 28 ou 29 anos. A assistente lembra que um dos casos lhe chamou muito a atenção. “Tivemos uma garota de 12 anos que deu entrada em trabalho de parto. Precisamos acionar o S.O.S Criança diante da menina gravida”. Cláudia diz que “em via de regra” as mães das adolescentes não ficam satisfeitas com a gravidez indesejada, mas que como não há o que fazer, o jeito é aceitar a novidade. “Não temos uma estatística de quantas adolescentes gravidas chegam aqui, mas são inúmeras. Geralmente tem entre 14 e 17 anos”.

A diretora da unidade, a assistente social Swani Bezerra, 48 afirma que a média de partos na unidade é de 150 por mês, mas que não é possível identificar quantas menores dão à luz no hospital. “Registramos quantas gestantes entram na unidade, mas não fazemos o quantitativo da idade deles”.

Swani lembra que o município disponibiliza de alguns projetos que orientam os jovens à não engravidar. O Programa de Saúde da Família (PSF) possui grupos para trabalhar com adolescentes sobre sexualidade, drogadição e  gravidez na adolescência. “No programa se aborda a questão da família. A educação de base. A resistência em utilizar o preservativo. As jovens não tem consciência do perigo”.

Swani revela que as jovens estão utilizando as chamadas “pilulas do dia seguinte” após a relação sexual, porém, segundo a profissional, este método pode vir a ser prejudicial à menor já que o  medicamento é recomendado  somente em “último caso”.

Médico defende educação sexual na escola

O Ministério da Saúde divulgou este mês a análise da Situação de Saúde e da Agenda Nacional e Internacional de Prioridades em Saúde com base em dados de 2000 e 2008. A fecundidade caiu 21,5% em adolescentes entre 15 e 19 anos e 16,4% em adultas jovens entre 20 e 24 anos.  No Rio Grande do Norte não há dados estatísticos sobre este assunto, porém o diretor geral da Maternidade Januário Cicco e médico obstetra, Kleber Moraes disse que na unidade não chegam muitas jovens grávidas e que, numa maioria, assim, como ocorre na Maternidade das Quintas, a idade entre as gestantes (adolescentes) é de 14 e 17 anos. “Não vejo reflexo na diminuição de casos de grávidas na adolescência. Aqui é uma maternidade de referência e por isso muitos casos acabam chegando no hospital”.

Para o médico, os ministérios da Saúde e da Educação deveriam inserir nas salas de aula, a  educação sexual. “O adolescente questiona pouco o assunto sobre sexo com os pais. A jovem não sabe o período ovulatório, além do que o apelo sexual é muito forte. Nenhuma adolescente quer engravidar. Ficam gravidas porque não tem consciência que só com o preservativo ou com outros métodos contraceptivos evitam a gravidez”.

Kleber enfatiza que uma gravidez precoce pode levar a vida da jovem a tomar rumos diferentes. “É a inversão de valores. Deixa de ser menina para ser mulher. Ainda tem aquelas jovens que arriscam a vida fazendo um aborto em clinicas clandestinas”.

Klebar afirma que os pais precisam orientar os filhos. “Muitos pais até querem conversar com o adolescente sobre a vida sexual, mas eles sequer querem ouvir. O canal mais importante é, sem dúvida, a família e depois os ensinamentos na escola”.

O médico obstetra acredita que da mesma forma que se estuda matemática, história e geografia nas escolas deveria também entrar na grade curricular a educação sexual. “É uma responsabilidade do Estado”.

Mas em que classes sociais há o maior número de adolescentes grávidas?

Kleber identifica que há alguns anos, nas classes mais desfavorecidas eram as que apresentavam o maior número de adolescentes gravidas, mas que hoje em dia não existe classe social. “As jovens estão engravidando, independente, de condição financeira”.

Kleber Morais lembra que há pouco tempo chegou uma menor de apenas 11 anos na  maternidade para dar a luz.. “O Rio Grande do Norte tem como superar esta falha onde muitas menores ficam gravidas. A facilidade geográfica do Estado proporciona que profissionais de saúde possam chegar em qualquer lugar e, desta forma, orientar as jovens para evitar uma gravidez precoce”.

O diretor geral diz que quando uma jovem chega no hospital a preocupação maior é com o próprio parto. “Muitas vezes as menores chegam com o aborto em curso e com infecção. O aborto pode provocar hemorragia, infertilidade e até a morte”.    

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas