Mariana Ceci
Repórter
Dos 167 municípios potiguares, 143 (85,6%) dependem de Natal para os atendimentos de alta e média complexidade. Os números foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta semana, e fazem parte da pesquisa Regiões de Influência das Cidades (Regic), e revela os fluxos de deslocamento da população para atendimento de saúde nos Estados brasileiros. A pesquisa analisa dados dos últimos 10 anos (2008-2018), e revela que, nesse período, o RN pouco resolveu gargalos históricos na rede de assistência que fazem com que todos os caminhos em busca de atendimento médico de média e alta complexidade levem à capital.
“Há uma alta dependência dos municípios do Rio Grande do Norte de Natal, mesmo que esse seja um problema recorrente ao longo da história política do Estado. A concentração dos pacientes de todo estado no Hospital Walfredo Gurgel é algo falado há anos, e isso não foi superado”, analisa o supervisor de Informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em Natal, Flávio Queiroz.
Em meio à epidemia do Coronavírus, a fragilidade do sistema de saúde no interior do Estado preocupa os gestores. “A gente vê, nesse momento, o quanto é importante uma política prioritária para resolver os gargalos históricos da saúde no RN”, destaca Flávio Queiroz.
A presidente do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde (Cosems), Maria Eliza Soares, afirma que a necessidade dos pacientes de se deslocarem para receberem tratamentos na capital é uma das principais preocupações dos gestores nos municípios, que temem o aumento da possibilidade de contrair o vírus.
“A gente tem que entender que o Coronavírus é um auge, uma pandemia, mas que as pessoas não adoecem só disso e não vão parar de adoecer por causa dele. Há toda uma história de pactuação dos municípios com Mossoró e Natal para atendimento em alta e média complexidade”, diz Maria Eliza.
De acordo com ela, já foram feitas reuniões com representantes dos principais centros de referência das pactuações, como é o caso do Hospital Universitário Onofre Lopes e a LIGA, que atende pacientes em tratamento de câncer. “O que foi eletivo, está suspenso. Nada eletivo vai funcionar para evitar o fluxo de pessoas, e essa estratégia vai ter que ser pensada dentro de cada município para reorganizar esses pacientes”, afirma Maria Eliza.
Além de pedir para que os municípios reorganizem a lista de quem será enviado para fazer tratamentos na capital, deixando apenas os casos imprescindíveis, como pacientes em tratamento de câncer, o Cosems orienta também que as Prefeituras evitem acomodar esses pacientes nas casas de apoio que muitas vezes são alugadas pelas Prefeituras em Natal para o caso de alguém precisar dormir na cidade.
“O município vai parar com seus atendimentos? Não. A nossa recomendação é que o município crie uma estratégia com foco de evitar aglomerações”, destaca.
Demanda em Mossoró
Outro município que recebe grande parte da demanda do interior do Estado, especialmente dos municípios do Alto-Oeste, é Mossoró, que recebe pacientes para alta e média complexidade de 19 municípios do Estado.
Apesar das tentativas de reorganizar o sistema para garantir a continuidade dos atendimentos, os municípios esbarram na ausência de uma rede hospitalar estruturada e regionalizada capaz de absorver essa demanda. “O Estado do Rio Grande do Norte não está organizado para essa pandemia, isso é fato. Está se precavendo e se planejando, mas, no sentido prático, cada região não tem suas referências organizadas para atender à Pandemia. É isso que querem dizer quando falam em colapso na saúde”, destaca Maria Eliza.
Baixa complexidade
Os problemas na assistência não estão restritos à alta e média complexidade. Ao todo, 21 municípios do Rio Grande do Norte dependem de outras cidades para oferecer serviços de baixa complexidade à população.
É o caso de Angicos, por exemplo, 186 quilômetros distante da capital. Para receberem atendimentos de baixa complexidade, os moradores do município, de acordo com a pesquisa do IBGE, precisam se deslocar os 186 quilômetros de ida e de volta para Natal. “O que isso revela é que o acesso à estrutura de saúde ainda é limitado no interior. Mesmo os serviço de baixa complexidade ainda não são capazes de serem supridos por alguns dos municípios”, ressalta Flávio Queiroz.
A pesquisa
Os dados divulgados pelo IBGE fazem parte da pesquisa de Regiões de Influência nas Cidades (Regic), feita de 10 em 10 anos e que visa demonstrar a hierarquia urbana entre as cidades brasileiras. “Há uma diferença entre metrópole e Região Metropolitana. No segundo caso, quem define é o Estado. No primeiro, há um conceito geográfico proporcionado pelo maior poder de influência que algumas cidades têm sobre outras”, explica Flávio Queiroz.
A antecipação da divulgação dos resultados da pesquisa foram feitos de forma extraordinária pelo IBGE para o Ministério da Saúde e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com objetivo de ajudar na elaboração de políticas públicas, logística e planos de enfrentamento à Covid-19.
Nacionalmente, os resultados da pesquisa demonstram que os brasileiros precisam percorrer, em média, 72 quilômetros para atendimentos de baixa e média complexidade, como consultas médicas, odontológicas, serviços ortopédicos e radiológicos e exames clínicos.
Alta e média complexidade
143 Municípios dependem de Natal
19 Municípios dependem de Mossoró
1 Município depende de Caicó
1 Município depende de Campina Grande (PB)
1 Município depende de Currais Novos
1 Município depende de Pau dos Ferros
Baixa complexidade
21 Municípios do RN dependem de outras cidades para atendimentos de baixa complexidade
Fonte: IBGE / REGIC 2018