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Imponentes no chão

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Fred Carvalho – Enviado a Porto Príncipe

O palácio do Governo e a catedral de Porto Príncipe sempre foram considerados obras arquitetônicas importantes. Eram construções imponentes, motivo orgulho da população local. Hoje, são as principais lembranças daquela que é considerada por muitos como a maior tragédia da humanidade: o terremoto que devastou o Haiti em janeiro do ano passado. De diversos pontos de Porto Príncipe é possível ver uma das cúpulas do Palácio ainda ruída. A outra já foi tirada pelo Governo da França que, segundo informações de pessoas locais, se prontificou a recolher os escombros e reconstruir o prédio.

Palácio Nacional de Haiti, um dos símbolos da arquitetura nacional devastado pelo terremoto de janeiro de 2010, é protegido por seguranças enquanto o governo decide se há condições de recuperá-loOs escombros, aliás, ainda são muitos. Há restos do Palácio espalhados pelo chão. Mesmo assim, o Governo haitiano ainda funciona no local. Isso graças ao fato de ser tão grande e de haver mais de um prédio. Aqui nem tudo foi destruído no terremoto. Não é permitido entrar no prédio onde a cúpula ruiu por motivo de segurança. É comum se ver pequenas pedras ainda caindo da parte mais alta da coluna.

Um imenso e bem cuidado gramado e um cercado de ferro separam o Palácio da rua. Em frente ao prédio há uma favela de tendas armadas. Do lado esquerdo, a cena se repete. Na parte de trás e do lado direito, as calçadas estão completamente tomadas por ambulantes.

Além do telhado e de colunas, terremoto destruiu painéis da Catedral de Nossa Senhora da Assunção, pintados na década de 1950Além da guarda pessoal do presidente Michel Martelly, há uma guarnição do Exército brasileiro designada pela Minustah para auxiliar na segurança do Palácio. O mesmo não ocorre na catedral de Porto Príncipe. Para se ter ideia da grandiosidade do prédio, somente a parte interna dele tem dimensões maiores que as de um campo de futebol. Todo o telhado foi abaixo no terremoto. Colunas enormes também caíram. Não há mais objetos de valor do local. Os que não foram recolhidos pela igreja acabaram roubados pela população depois da tragédia.

Hoje o local serve apenas de abrigo para mendigos. Muitos, por sinal. “Hey, you! Hey, you!”, dizem homens, mulheres e crianças na tentativa de chamar a atenção de todos que passam pelo local antes de cercá-los e passarem a mão pela barriga, gesticulando que estão com fome.

Ao contrário do Palácio, ainda não se sabe se catedral será reerguida nem quando isso será possível. Enquanto isso, as pessoas devem continuar ocupando o prédio e esperando por esmolas para sobreviver.

Imundície no Mercado Venezuela

O ambiente é o mais inapropriado possível para abrigar uma feira livre. Há muito lixo, lama e o esgoto corre a céu aberto. Não bastasse isso, fica numa região onde somente há poucos dias houve uma reclassificação de área de risco vermelho para de risco amarelo. Ou seja: de risco iminente de violência para de possível risco de morte, sequestro, assalto e outros crimes.

Garoto perambula pelo mercado, onde esgoto corre a céu abertoEsse é o quadro do Mercado Venezuela, em Bel Air, zona portuária de Porto Príncipe. Por motivo de segurança, a minha permanência no local não passou de 10 minutos. Tive de colocar colete à prova de balas e usar capacete. Os militares que me acompanhavam na incursão pelo Mercado aconselharam que eu evitasse tirar fotos e fazer vídeos no local. As fotos que consegui, foram feitas usando apenas uma das mãos.

O mau cheiro é intenso. Cercando todo o Mercado há uma enorme vala para onde correm os dejetos. Os porcos chafurdam. Os pedaços expostos de carne estavam completamente cobertos por moscas. Os peixes, salgados para retardar o apodrecimento, não parecem bons. Aliás, o aspecto de todos os produtos vendidos é um convite para não comprá-los. Tomates, batatas, bananas, cebolas ficam no chão à espera de alguém que, exclusivamente por falta de opção ou condição de ir a outro local, os compre.

O mercado é formado por pouco mais de uma dezena de barracões doados pelo Governo da Venezuela após o terremoto que atingiu Porto Príncipe e outras cidades haitianas em 2010. Daí surgiu o nome do local.

Antes de sair do Mercado uma cena me chamou a atenção: por trás de um monte de lixo, um menino aparentando ter sete, oito anos nos observava. Havia acabado de atravessar o córrego de esgoto com os pés descalços. Acenou, deu as costas e sumiu pelos becos imundos.

Retornei à viatura, onde pude tirar o colete e o capacete. Só não ainda consegui tirar da cabeça a imagem daquele menino.

Diário

O fim de semana foi de muito trabalho aqui no Haiti, mas também houve tempo para descansar e aumentar a aproximação com os militares da base.

Na madrugada de sexta para sábado, fui a uma favela. O local é deplorável. Vou escrever sobre essa visita nos próximos dias.

Já pela manhã, fui a uma feirinha de artesanato que é montada todos os sábados dentro da base. Em seguida, visitei o Mercado Venezuela e o Palácio Nacional. Tive a honra de almoçar no Forte Nacional do Haiti, onde atualmente 139 militares são responsáveis por cuidar da segurança de vários dos bairros mais violentos de Porto Príncipe.

Voltei para a base já quase de noite. Enfim, um momento de descanso e confraternização com o pessoal da Companhia de Engenharia, onde estou hospedado: um churrasco com direito a cerveja.

Tirei o domingo para adiantar o envio de textos e fotos para a redação, deixando de lado a oportunidade de conhecer uma praia local. Mas acabei economizando 20 dólares, uma vez que as praias por aqui não são públicas.

Amanhã relato o que fiz ontem e hoje. Tchau.

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