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Imprimindo histórias e livros

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Yuno Silva  – repórter

Responsável por publicar boa parte da recente história literária e principalmente acadêmica do Rio Grande do Norte, a Editora da Universidade Federal inicia nesta quinta-feira, às 10h, no auditório da Reitoria, a temporada de atividades que marcam os 50 anos desde sua criação nos idos de 1962. Na programação de hoje, lançamento de três novos títulos (sendo duas reedições e uma compilação inédita) e apresentação de um painel que remonta a memória da Editora.

Geraldo começou na época da tipografia universitária, e há mais de uma década não visitava a EDUFRNVisto como um dos pontos altos do evento, o painel estará a cargo do professor aposentado e escritor Geraldo Batista, primeiro diretor da editora quando ela ainda era conhecida por Imprensa ou Tipografia Universitária; de Sirleide Costa, ex-diretora da instituição e agora dedicada a tese de doutorado sobre a trajetória da EDUFRN; e do atual diretor, Herculano Campos, que durante a solenidade se despede do cargo que ocupou nos últimos quatro anos para assumir a direção do Centro de Ciências Humanas Letras e Artes – CCHLA.

Além de livros com perfil acadêmico, técnico-científico e didático, ao longo desse meio século de existência a EDUFRN também se notabilizou pelo lançamento de obras culturais e literárias de autores consagrados como Luís da Câmara Cascudo, Esmeraldo Siqueira e Veríssimo de Melo; mas, antes de ser um lugar de máquinas para imprimir, a Editora é feita por pessoas e lembranças. Que o diga Geraldo Batista.

Convidado pela reportagem da TRIBUNA DO NORTE, o professor de História aposentado, fundador e primeiro diretor da Tipografia Universitária visitou a sede da Editora, onde não pisava há mais de dez anos, e lembrou de como tudo começou: “Quando fui com a turma da universidade para um passeio em Fortaleza, fiquei sabendo que lá eles tinham uma gráfica própria. Pesquisando, vi que a UFRN era das poucas do Nordeste que não tinha a própria editora. Escrevi uma carta para o reitor, na época Onofre Lopes, sugerindo a criação. Entusiasmado, me convidou para assumir a missão. Nos tornamos amigos desde então”, disse Geraldo, que esteve à frente da editora dos 26 aos 40 anos. Durante a visita, topou com um velho colega de trabalho, Francisco de Assis, e reconheceu uma antiga máquina de dobrar livros ainda na ativa. “Está tudo em perfeito estado!”, diz examinando as engrenagens do equipamento de fabricação alemã. “Essas é que são boas”, garante.

Na primeira fase da EDUFRN, as máquinas funcionavam nos fundos do prédio da reitoria, alojada no imóvel onde hoje está instalado o 3º Distrito Naval da Marinha, em frente à Escola Doméstica, Tirol. Geraldo não chegou a trabalhar na sede atual da editora, dentro do Campus Central, inaugurado em 1989.

Em 14 anos, editou livros dos principais intelectuais potiguares e recorda com orgulho quando recebeu a incumbência de assinar a arelha do livro “O tempo e Eu”, de Câmara Cascudo. Também contou quando, em 1971, imprimiu 12 títulos em quatro meses para Onofre Lopes. “Ele queria um livro para cada ano de sua administração como reitor. Foi um desafio que no fim me rendeu um abraço afetuoso de Onofre Lopes em agradecimento”. Essas e outras histórias ilustram o livro “Lembranças”, que encerra a trilogia iniciada com “Moleque do Acari” e “Memórias de um velho pároco” – nenhum deles publicado pela editora. “Terminei meu quarto livro, ‘Romance no gueto de Varsóvia’, e quero ver se este eu publico aqui pela Editora Universitária”, planeja. Geraldo também foi chefe, vice-diretor e diretor da Comperve.

Editora modernizada

Modernizada na atual gestão de Herculano Campos, a EDUFRN teve seu parque gráfico renovado nos últimos quatro anos, e uma série de procedimentos internos foram postos em prática para tornar a edição de novos títulos uma decisão ainda mais compartilhada. “Criamos um conselho editorial, adotamos uma política editorial que amplia a publicação de obras selecionadas através de editais abertos a toda comunidade universitária e definimos nosso perfil editorial”, enumera Herculano.

Em 2011, foi realizado o terceiro edital, que teve 48 obras inscritas – desses, cerca de 30 serão publicados. “Nos últimos quatro anos lançamos cerca de 60 títulos, e para comemorar esses 50 anos criamos um selo alusivo à data”, informa Campos. Sobre a edição e reedição de obras literárias, Herculano informou que a decisão passa pelo crivo do conselho. “Optamos por títulos de grande relevância cultural, e temos nos esmerado para produzir obras com alto padrão de acabamento. Nossos livros têm uma boa aceitação no mercado, inclusive em âmbito nacional”, conclui.

Os livros que serão lançados hoje na reitoria, e que poderão ser encontrados depois na Cooperativa Cultural do Campus, são “A biblioteca e seus habitantes” (reedição), de Américo de Oliveira Costa; “Gracioso Ramalhete” (reedição), pesquisa do escritor Cláudio Galvão sobre a poesia de Ferreira Itajubá; e a compilação inédita “Poesias, de Luís Carlos Guimarães”, uma seleção preparada pelo próprio autor pouco antes do seu falecimento em 2001.

Outras obras já relançadas pela EDUFRN e que merecem destaque são “O Tempo e Eu”; “Vida Breve de Auta de Souza”; e “Nosso Amigo Castriciano”, todos de Câmara Cascudo. “A poesia reunida de Zila Mamede”, compreendendo a reunião inicial de Navegos, acrescida de “A Herança”, a “Memória Viva de Onofre Lopes”, e “História da República no Rio Grande do Norte”, de Itamar de Souza.

Orelha para cascudo: “O Tempo e Eu”

O assunto mais fácil do mundo seria apresentar Luís da Câmara Cascudo. Mas, quem teria a ousadia de fazê-lo? Adjetivá-lo de Comendador, de Professor Emérito, de Historiador, de Etnógrafo? A lista seria interminável e, por mais que me esforçasse nos qualitativos, não traria uma novidade sequer. Somente vim a conhecê-lo de verdade, neste ano da graça de 1968. Antes já o cumprimentava. Chamava-o de mestre. Respeitava-o. Admirava-o. Lia e consultava suas obras. Mas foi “O tempo e Eu” que me fez CONHECÊ-LO. Bati, inúmeras vezes, em sua porta. Sempre o mesmo sorriso. A mesma alegria de receber. Anedotas. Histórias. Estórias. Estímulo. Elogios sinceros, embora imerecidos. Batismo do sobrinho honorário. Vi-me, então, promovido a seu parente. Parentesco sentimental, honroso, invejável. (…)
“O tempo e Eu” já estava quase pronto, quando perguntei ao mestre pelas orelhas do livro.
– Meu filho, livro de surdo não precisa de orelhas.
Mas a capa foi planejada para receber orelhas!
– As orelhas são suas; faça delas o que quiser.
Se são minhas, as escolho para confidentes. Falarei da alegria, do prazer de editar um trabalho que é o próprio Cascudo. (…) E, para elas não ficarem ouvindo coisas inúteis, foi apenas o algodão que as tapou.”

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