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Ingrid Betancourt

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ESPERANÇA - Candidata à presidência foi sequestrada há cinco anos

Já se passaram quase cinco anos desde que a candidata à presidência da Colômbia, Ingrid Betancourt, partiu para um dia de campanha na estrada de San Vicente del Caguan, uma zona controlada pelas guerrilhas das Farc, e nunca mais voltou para casa.  Mas o tempo parece só aumentar a esperança de Yolanda Pulecio, sua mãe, que, incansável, transmite diariamente mensagens de rádio em direção à selva na expectativa de receber uma resposta ou um sinal de vida –que até hoje não veio. Em entrevista a veiculos do grupo O Globo, Yolanda critica o presidente Álvaro Uribe por ter suspendido a negociação para realizar “trocas humanitárias” com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Mas diz que ainda não perdeu as esperanças de reencontrar Ingrid viva. Sem informações confiáveis, ela não sabe dizer se Ingrid está bem ou mal, mas imagina que a ex-senadora, uma mulher forte e batalhadora, deve ter encontrado uma forma de sobreviver em meio às agruras da selva.

Há quase cinco anos Ingrid Betancourt, sua filha, foi seqüestrada pelos guerrilheiros das Farcs. Como você tem lidado com esse sofrimento?

Yolanda Betancourt: Faz exatamente 4 anos e dez meses que minha filha foi seqüestrada. Não sei como suportar esse terrível momento de pressão, tenho momentos de ilusão, de esperança. Mas, por algum problema, o governo e a guerrilha não conseguem chegar a um acordo. Faz cerca de um mês que Uribe [Álvaro Uribe, o presidente colombiano] fez uma declaração que cortou toda a esperança que tínhamos para nos aliviar desse sofrimento.

A senhora se refere ao fato de o presidente Uribe ter declarado que não vai negociar as “trocas humanitárias” com a guerrilha. Em sua opinião, o que deveria ser feito para resolver o problema dos seqüestrados de uma vez?

YB:  Deveria ser feito o acordo humanitário. O governo deveria reunir os representantes da guerrilha e os representantes do governo da Colômbia, com um acompanhamento internacional, dos comitês da França e da Suíça. É um acordo de troca entre os combatentes, os guerrilheiros presos, e os políticos, como minha filha, e todos os que têm que ser soltos. As trocas humanitárias são a única saída.

Como o governo da Colômbia tem trabalhado para solucionar essa questão tão delicada?

YB: Muito mal. O governo não faz nada. Eu creio que não lhe interessa [resolver isso]. Nestes últimos cinco meses Uribe disse que está interessado em fazer o acordo humanitário, mas voltou atrás. Um processo de paz é uma coisa muito difícil, porque a Colômbia vive esse conflito [com as Farcs] há mais de 40 anos, é muito tempo. Primeiro é preciso fazer o acordo humanitário, soltar os seqüestrados e quem sabe depois poderia se chegar a uma aproximação com a guerrilha. Não sei se isso interessa a Uribe, ele tem um contato muito próximo com os paramilitares, e tem muitos problemas por isso, não quer nada com a guerrilha nem com as Farc.

Uma missão de resgate poderia ajudar?

YB: Uma missão de resgate significa a morte dos seqüestrados, como já vimos em diversas oportunidades. A filha de um ex-presidente, a esposa de um ex-procurador, um ministro de Defesa… Enfim, são múltiplos os casos em que os seqüestrados foram mortos. Porque a guerrilha, quando sabe que virá o resgate, dá a ordem de matar os seqüestrados para não entregá-los.

Na época, como a senhora soube do seqüestro de sua filha? Recebeu algum contato dos seqüestradores?

YB: Nunca recebi nenhum contato deles. O seqüestro de minha filha não é por dinheiro, é um seqüestro político. Só soube que ela tinha sido seqüestrada porque ela não chegou ao seu lugar de destino. Os seqüestradores nunca pediram resgate.

•  Como é viver com esse sentimento diário de espera, sem notícias?

YB:Acho que não existe uma situação mais triste e mais dura para uma mãe do que essa. Eu sofro muito, desde que abro meus olhos estou sofrendo. Todos os dias às 4h30 da manhã eu saio da cama para mandar uma mensagem a Ingrid por uma emissora de rádio, com a esperança de que ela me ouça. Faço isso todos os dias, porque há uma emissão das cinco às seis da manhã. Nós todos (os familiares dos seqüestrados) falamos, e temos a esperança de que nos escutem. Peço muito a Deus, não quero perder a esperança.

Os seqüestradores deram alguma prova de que Ingrid está viva?

YB: Sim, eles me mandaram mensagens por jornalistas que falaram com os comandantes da guerrilha, disseram que Ingrid estaria com saúde. Tenho que acreditar nisso, porque quem mais pode me dizer como ela está? Ninguém mais.

Como os filhos de Ingrid encaram o fato?

YB: Eles sofrem muito, muito. Cheguei de Paris há oito dias, estive com eles (os filhos de Ingrid moram em Paris, com o pai). E por sorte o pai deles (o ex-marido de Ingrid, Fabrice Delloye), está muito próximo dos filhos. Eles estudam muito, graças a Deus, porque querem que sua mãe se sinta orgulhosa deles. Melanie está estudando Filosofia. E o menino (Lorenzo) está fazendo um curso dedicado às Finanças, mas ele gosta muito de música, toca violão e canta. É um artista. É algo que o emociona em meio à dor de não ter sua mãe.

E o marido de Ingrid, Juan Carlos Lecompte?

YB: Juan Carlos não me liga muito, quase não o vejo, ele nunca me procura, apesar de também viver em Bogotá.

Além das transmissões de rádio, a senhora segue algum tipo de rotina para conseguir informações sobre Ingrid?

YB:  Todo dia faço alguma coisa. Agora estamos trabalhando numa idéia para apresentar à Comissão de Direitos Humanos na Organização dos Estados Americanos, estou trabalhando nisso. Estive na embaixada da Suécia pedindo apoio. Tenho todo o apoio das embaixadas da França e da Suíça, esta é uma luta que deve ser lutada todos os dias. Eu conto com esse apoio para que possamos obrigar o presidente da Colômbia a ter uma atitude mais humana. Quero pedir também o apoio do governo e do povo brasileiro para que entrem na nossa luta para a libertação dos seqüestrados na Colômbia.

Tem alguma idéia de como Ingrid tem sobrevivido na selva?

YB:  Devem ser condições muito duras, e isso me dói muito. Estamos caminhando para cinco anos do seqüestro e ela deve ter se acostumado às situações terríveis em que é obrigada a viver. Mas Ingrid tem um interior muito forte, tem muita coragem e muita fé em Deus, penso que isso a ajuda.

• Em sua opinião, por que o seqüestro de Ingrid e Clara Rojas já dura tanto tempo?

YB:  Porque falta interesse do governo. A guerrilha já acenou com a vontade de fazer o acordo humanitário, mas o governo põe toda a sorte de travas e problemas para chegar a uma negociação. Isso é o que eu não entendo, é o que me dói na alma. Estou há um ano tentando falar com o presidente e agora, há um mês da visita, a secretária do presidente me diz que ele está muito ocupado para me receber.

• Qual a sua opinião sobre as Farc?

YB: É uma guerrilha que está na ativa há 45 anos, quase 50, muitos guerrilheiros aderiram por causa da falta de oportunidades na vida. Na Colômbia, os governos não têm consideração com as pessoas mais necessitadas. Muitos jovens aderem [às Farc] porque não têm direito à educação, saúde, porque não têm esperança. Há quem está metido nisso por causa do narcotráfico, é claro. Há alguns que crêem na luta através das armas, mas isso é um absurdo. Com as armas, com a guerra, com a violência não se chega a nada.

• Acredita que o narcotráfico sustenta as Farc?

YB:  Na Colômbia, o narcotráfico sustenta tudo. Sustenta o Congresso, os congressistas eleitos, sustenta a guerrilha.

• Você recebe algum tipo de ajuda do governo?

YB: Não, nunca. Só recebo apoio intelectual e solidariedade da França, Bélgica e Suíça, mas ajuda financeira, nunca.

A senhora também escreveu um livro sobre o assunto, “Ingrid, ma fille, mon amour”, editado na França (ainda não publicado no Brasil).

YB:  No livro estão as mensagens que mando desde 2003 até agora. Quem ler o livro poderá ter uma noção de como temos vivido durante todos esses anos. Temos vivido com esperança, mas também com desesperança, especialmente por causa da falta de interesse do governo da Colômbia.

E a sociedade colombiana, o que pensa dos seqüestros promovidos pelas Farc?

YB:  Na Colômbia, não são tão solidários quanto na Europa. Na Europa, as pessoas demonstram uma grande solidariedade, é bonito de ser ver. Mil e quinhentas cidades concederam a Ingrid o título de “cidadã honorária”, há mais de 500 comitês de apoio a todos os seqüestrados colombianos. Aqui na Colômbia acontecem coisas terríveis todos os dias, massacres, assassinatos. Estamos em meio a um conflito muito violento, e as pessoas acabam se acostumando a isso. É uma tristeza. Queria fazer uma passeata e levar muita gente à praça principal de Bogotá, por exemplo, mas as pessoas não saem de casa, têm medo de ir às ruas.

O jornalista colombiano Jorge Enrique Botero, que escreveu um livro-testemunho sobre a vida em meio às Farc. No livro, ele conta que Clara Rojas chegou a ter um filho na selva com um guerrilheiro. É verdade?

YB:  Eu creio que sim, ele me disse que falou com um comandante, que confirmou. É uma história linda, porque Clara pode ter encontrado o amor no meio de toda essa tragédia.

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