A entonação, o entusiasmo e as rimas foi o que chamou a atenção da estudante Stephany Cristina, hoje com 18 anos de idade, e cordelista há três anos.
Mesmo crescendo com toda essa sorte, a jovem apenas se descobriu cordelista no ensino médio, ao participar de oficinas na escola estadual onde estudou. Dois professores desenvolveram uma oficina de cordel, e foi lá onde Stephany aprendeu e colocou em prática toda a sua admiração pela literatura.
Stephany transforma tudo em poesia, até mesmo contar seu processo de aprendizagem. A estudante relata que sentiu tudo fluir muito naturalmente quando estava aprendendo a rimar, “Eu acho que o cordel ele já estava dentro de mim desde sempre, ele estava só esperando eu colocar pra fora, por isso que foi tão natural.”
E ao fim da oficina nasceu o seu xodó, ‘Marginal Alado’ o seu primeiro cordel, que foi em homenagem ao ex-vocalista da banda Charlie Brown Jr. falecido em 2013. O encanto pela poesia se tornou ainda maior no momento em que ela declamou seus primeiros versos autorais:
Dedico esse cordel
De todo o meu coração
Para o poeta das ruas
Que marcou uma geração
O líder do Charlie Brown
Nosso eterno Chorão
Foi no dia 09 de abril
Que Alexandre nasceu
Lá na cidade de São Paulo
Onde o menino cresceu
Mas foi na terra de Santos
Onde tudo aconteceu
Sua carreira começou
Nas noitadas em um bar
Quando um vocalista faltou
Ele ocupou seu lugar
E a partir daquele momento
Sua vida começou a mudar…..
Ao fim da recitação, veio a surpresa: “as pessoas adoraram, e a maioria não sabia quem era o Chorão, mas mesmo assim adoraram. Me parabenizaram e queriam comprar o cordel. Então a partir daí eu comecei a refletir sobre o poder da poesia. Eu ‘tava’ declamando sobre uma pessoa que a maioria do público não sabia quem era, mas mesmo assim o meu amor pela banda tocou de alguma forma eles também” relembra.
O impacto da oficina de cordel no município levou os jovens a mandar suas obras para fora da escola. Mas em 2019 Stephany precisou deixar em Florânia as rodas de declamações nas ruas da cidade onde cresceu, e se mudou para Natal para cursar Jornalismo. Na mala da mudança, alguns versos brigando por espaço com a saudade das suas raízes.
“Eu sinto muita falta, mas no geral eu vim pra cá muito realizada, porque eu tinha conseguido entrar no curso que eu sempre quis” conta, “com um pouco de saudade de casa… na verdade trazendo na mala só saudade” brinca.
A realidade natalense da literatura de cordel para Stephany ainda é um tanto desconhecida, “lá em Florânia eu estava sempre declamando, sempre em algum evento levando o cordel. E quando eu vim pra cá eu senti bastante falta. Mas no geral, a saudade mesmo é de poder declamar na minha cidade, com outros cordelistas”, diz. Mas da nostalgia ainda nasce arte. O último cordel escrito por Stephany foi para um evento da UFRN – onde estuda – sobre mulheres negras. O ‘Heroínas, mulheres, negras’ relembra a história de muitas mulheres que foram importantes para a nossa história, passeando por Marielle Franco até a poetisa Zila Mamede:
A voz de toda
mulher preta
Que da história foi apagada
Ecoa potente em meus versos
Grita forte, quer ser lembrada
Por isso uso o exemplo franco
De Marielles, Marias e alcanço
Inspiração para essa caminhada
Declamo hoje não por mim
Mas por Dandara dos Palmares
Que enfrentou o sistema escravista
Lutou pelo fim das barbáries
Resistiu até o último momento
E para não ceder ao tormento
Entregou-se ao abismo dos mares
Não é de hoje que preta com voz
Embrulha o estômago do Estado
E foi por ele que Teresa de Benguela
Teve seu ativismo silenciado
Mas para cada Benguela que cair
Mais Esperanças irão ressurgir
Para continuar com o seu legado
Através da minha literatura
Quero manter viva a memória
De poetisas como Zila Mamede
Que não se encontra nos livros de história
Mas está presente em minha poesia
E inspira minha trajetória
Faço dos versos um ato de luta
Uma luta diária por meus ancestrais
Por Auta de Souza, Maria Firmina
Mulheres de força, seres culturais
Enquanto meus dedos poderem escrever
Enquanto minha cabeça conseguir rimar
Trarei nos meus versos histórias de luta
E mulheres que o tempo não pode apagar
O que faz: Cordelista e estudante de Jornalismo
Idade: 18
Data de nascimento: 11/12/2001
Hobbies: Ler
Inspirações: O cordelista mossoroense Antônio Francisco